Todos sempre me disseram sobre como o Ademir matava a bola. Cresci imaginando, sem ver.
De quantas poesias de meio campo nos privaram os programas televisivos e a humana obsessão pelo gol?
Até que um dia eu vi, naquele estádio que construíram no lugar do meu, o Adãozinho.
Sim, o Adãozinho! Querendo aparecer num jogo festivo, deu um bico lá de trás.
Uma pancada toda torta. De quem não gosta da bola e de quem a bola não gosta nada. A bigorna atravessava a cancha como um helicóptero sem hélice e ia em direção a um senhor de aparência frágil.
Que sem noção esse Adãozinho!
A torcida fez silêncio, prezando pela integridade física do idoso, que recebia aquele presente de grego. Grego escrito em garrancho.
O fogo amigo dos infernos tinha como destino o Divino.
Toda a arquibancada queria gritar que ele não tinha obrigação de matar aquela bola.
Implorar para ele que não se colocasse diante daquele paralelepípedo irresponsável. Que para nós ele continuaria sendo sempre o maior. Afinal, era Ele.
Sempre ouvi sobre a matada do Da Guia.
Ouvi errado.
O que passou quando a parábola encontrou o ponto B foi o antônimo de qualquer violência. Onde “matar” nem dicionarizado está. Onde o John Lennon na cama passa vergonha. E o amor não é cantado pelos jabaculês radiofônicos. O amor é de mãe preta da periferia. É de avô se relendo nos olhos do neto. Neto se conhecendo no cheiro da avó.
Era filho de Domingos. Eram os profetas do Aleijadinho. “Estrada do Sol” com a letra da Dolores. Tinha mais de 70. Era o rio da minha terra que soterrou todos os seus rios e era bem mais bonito que o Tejo.
Foi de chaleirinha…