Muito se falou sobre a pancadaria que as torcidas de Flamengo e Palmeiras protagonizaram em Brasília no fim de semana passado. Infelizmente, no entanto, não se está falando dos verdadeiros problemas que afligem o estádio e que, como já disse em textos anteriores no Panorama Vascaíno, podem sim levar a uma tragédia.
O estádio é um espetáculo. Dos melhores nos quais já pisei em toda a minha vida. Confortável, com uma visão perfeita de campo, tanto do anel superior quanto do inferior.
Seus problemas estão todos do lado de fora. E no policiamento despreparado.
Para quem não o conhece, esse é o estádio, visto de cima. A linha verde é o chamado Eixo Monumental, uma das duas vias mais importantes de Brasília, literalmente o “corpo” do avião, que é a cidade. Andando cerca de dois quilômetros para a direita, estão os ministérios, congresso, planalto. O estádio é explendidamente bem localizado. Seu acesso se dá por essa área asfaltada à direita, já que ele é cercado pelo ginásio Nilson Nelson e outros prédios menos conhecidos. No topo da foto, um pedaço do Autódromo, vizinho de fundos. Por essa via marcada em verde chega grande parte do público.
Então, os problemas:
A linha verde, agora, serve para mostrar o “muro” do estádio: na verdade, uma grade de tela rígida, de uns dois metros de altura, que durante a Copa do Mundo parecia ser uma estrutura temporária. O temporário virou definitivo. Acompanhe o trajeto irregular e inexplicável da tal grade. Dois ou três homens dispostos a derrubam.
A área interna à grade era onde ficavam, na Copa, bares oficiais e as lojinhas de Coca-Cola, Adidas e demais patrocinadores. Hoje em dia é apenas um espaço vazio, escuro e inútil. As catracas – que lêem os ingressos – para acesso ao estádio estão no próprio corpo do estádio, ou seja, a conferência do ingresso para acesso a este pátio interno depende do pessoal de recepção e que organiza as filas de entrada. Nos dois últimos jogos a que fui (Vila Nova x Vasco e Flamengo x Palmeiras) ninguém me pediu ingresso para estar nessa área interna. Ouvi relatos de conhecidos que usaram desse expediente para assistirem ao jogo do Vasco de graça.
Essa terceira imagem serve para mostrar a real dimensão do problema que é esse entorno. Pelo tamanho dos carros, na foto, dá pra se ter uma imensidão do pátio e do caos que se estabelece nesse estacionamento e seu entorno imediatamente após um jogo das proporções do de domingo passado. Repare que há uns míseros postes com uma única lâmpada cada, para iluminar essa monstruosidade de espaço.
A foto seguinte é minha, tirada às 18:10, na saída do jogo. Repare que estamos no crepúsculo, que o céu ainda não está totalmente escuro e que há dois postes iluminando toda a frente da foto. Um mais próximo e o outro mais distante. Eles ficam sobre estes calçamentos em meia-lua que dividem o pátio em setores. A iluminação forte, paralela à cabeça das pessoas, abaixo à direita é a iluminação do Eixo Monumental, a pista destacada em verde na 1a foto. O resultado prático disso é que todo esse pátio asfaltado mergulha numa perigosa penumbra, de você não conseguir ver direito o rosto de uma pessoa a uns dez passos de você. Policiamento? Duas tropas montadas (cavalo). E só.
Não há iluminação. Não há marcação de vagas. Não há policiamento a pé. Não há placas de sinalização para orientar ou dividir o pátio. Não há orientação para a saída. Cada um por si.
Cinco minutos após o fim do jogo, esse local é um caos, com todos que já estão em seus carros querendo sair na frente dos outros, e pessoas perdidas, andando em todas as direções, à procura de seus veículos e familiares.
Se o tumulto que aconteceu no estádio acontece durante essa saída, teremos uma carnificina.
Por último, deixei para falar do policiamento. O maior risco que o público presente no estádio domingo passado correu foi protagonizado pela Polícia Militar de Brasilia. Ao usarem gás de pimenta para tentar resolver o conflito no qual estavam metidos, os policiais transformaram um conflito localizado em um setor do hall do anel superior do estádio num caos generalizado em todo o Mané Garrincha. Embaixo, onde as pessoas calmamente esperavam o segundo tempo do jogo, as pessoas começaram a passar mal com a nuvem de gás de pimenta que – óbvio! – desceu do conflito. Mulheres, crianças, deficientes, pais desesperados para fugir do gás. Jogadores vomitando em campo.
Para quem nunca sentiu ao vivo, o gás não tem cheiro. Começa uma inexplicável ardência na garganta que te leva a tossir loucamente e que te dá a sensação de que sua garganta vai se fechar e você vai sufocar. Eu estava no estádio com casal de amigos (pai, mãe e dois pirralhos, de seis e dois anos de idade). O pai queria correr pro campo, como fizeram várias pessoas. Gente saiu carregada.
Não é possível que os responsáveis pelo policiamento não tenham a noção da (não) dissipação de um gás em um ambiente fechado. Passamos perigosamente perto de uma tragédia, que só não se consumou porque a quantidade de gás não foi suficiente para consolidar o pânico que se estabeleceu no anel inferior. Suponho que no anel superior tenha sido ainda pior. Fato é que o gás não pode ser usado ali.
Isso se repetiu nos dois últimos jogos no Mané Garrincha. No terceiro, as consequências podem vir a ser piores. Que os responsáveis tenham consciência. E que possamos ir assistir a um jogo de futebol em paz.
Fabíola ama futebol. Um amor herdado de seu pai tricolor, que a levava aos estádios já com apenas cinco anos de idade. Calhou de não seguir o time paterno e, apesar do enorme carinho pelo Fluminense, acompanha e investe sua torcida no Atlético Mineiro. É torcedora no âmago da palavra. Fica nervosa, chora, ri e comemora. Se emociona.
Morou e viajou por diversas cidades. Em cada uma, fez questão de conhecer e vivenciar seus estádios. Maracanã, Mineirão, Independência, Rei Pelé, Castelão, Santiago Bernabéu, Vicente Calderón, Camp Nou e foi até ao Stade de Marrakech acompanhar o seu Galo. Justamente no Mané Garrincha, em Brasília, ela presenciou o pior do futebol. Justamente na cidade onde mora e viveu a maior parte da vida, na cidade que ela escolheu para criar seus filhos.
Sua filha mais velha, já com dezesseis anos, escolheu seguir o avô e torcer pelo Fluminense. O mais novo, com cinco anos, ainda não despertou para o futebol e, apesar de jogar bola na escola, diz que não tem time, que não gosta muito. Os dois cresceram acompanhando a paixão da mãe e Fabíola quis trazê-los um pouco mais para esse universo. Uma chance para isso apareceu quando foi anunciado o confronto entre Flamengo e Palmeiras na cidade.
De ingressos comprados, os três partiram ainda cedo para o Mané Garrincha, para evitar qualquer problema. A fila já estava grande, porém não se encontrava policiais ou funcionários do estádio para dar qualquer informação. Logo surgiram filas entre filas e muitos “fura-filas”. Mas ainda assim, a entrada foi relativamente tranquila, afinal o jogo só começaria em duas horas. Ah sim, finalmente apareceram policiais e funcionários. Era o momento da revista.
A alegria de estar com os filhos dentro do estádio era tudo para Fabíola. Nem o perrengue na entrada ou água, pipoca e batatinhas superfaturadas estragariam aquele momento. A área escolhida foi a mais cara, justamente para evitar possíveis confusões.
O jogo foi bem disputado e o empate em um a um chegava ao intervalo. Foi então que o programa família se tornou pesadelo. Exatamente no lugar onde estavam, começaram a aparecer homens sem camisa e muito vermelhos, machucados. Esse pessoal passou ao lado deles, na arquibancada. Estavam na saída da passagem que levava para o anel onde ficam lanchonete e banheiros. Ponto onde todas as áreas se cruzam. Nenhum segurança, nenhum policial, apenas funcionários e torcedores. De repente, a gritaria.
Ditos representantes da Mancha Verde foram para cima dos flamenguistas em um local cheio de crianças e família comprando água e comida ou indo ao banheiro. Foi um Deus nos acuda com gente pulando para dentro da lanchonete e se escondendo nos banheiros. Lixeiras e extintores de incêndio viraram armas. Entre várias pessoas, Fabíola e seus filhos se tornaram reféns da situação, presos na arquibancada. Pela proximidade da confusão, sequer tinham para onde fugir.
Alheio à confusão, o jogo foi reiniciado enquanto as pessoas gritavam por polícia. Até que tudo o que se ouvia era o barulho das bombas de efeito moral. O spray de pimenta utilizado rapidamente chegou às arquibancadas e, pouco depois, também ao campo. Fabíola cobriu os rostos dos filhos com uma blusa de frio e tentou se proteger com a própria camisa. Em volta, cada um tentava se proteger de alguma forma. Ainda assim, todos sofreram. Tosse, olhos lacrimejando, dificuldade em respirar e dor de cabeça.
Sem ter o que fazer, Fabíola abraçou seus filhos e deu sua proteção de mãe até que tudo se acalmasse. Pela primeira vez sentiu medo em um estádio de futebol.
Quando finalmente, acabou o corre-corre e a polícia liberou a área da lanchonete, Fabíola decidiu levar seus filhos embora. Medo da situação se repetir, medo que um gol reacendesse a briga. Medo.
Deixando o Mané Garrincha, Fabíola se sentiu atravessando uma zona de guerra. Gol do Palmeiras? Colocou o menino de cinco anos no ombro e apertou o passo antes que outra confusão acontecesse. O sentimento ruim superou o medo. Agora ela sentia terror.
Já dentro do carro, voltando para casa, uma dose extra de tristeza. Seu filho pequeno, justamente quem ela tanto queria que tomasse gosto por futebol, pediu que ela nunca mais o levasse a um estádio. Pediu que nunca o fizesse assistir a um jogo de futebol.
Fabíola sabe que pode contornar essa situação. Não pode deixar o filho acreditar que o futebol se resume a selvageria. Quer passar a ele todo o sentimento que recebeu do pai pelo esporte. Mas ela tem consciência de que será uma luta difícil.
Ela ainda quer acreditar. O país do futebol não pode ser o país da impunidade. O Brasil sediou uma Copa e, em menos de dois meses, o Mané Garrincha receberá jogos pelas Olimpíadas, receberá a Seleção Brasileira. Vai ser assim também? Com ingressos para três jogos, ainda não sabe se correrá o risco de voltar lá.
Bandidos fantasiados de torcedores e polícia com total despreparo colocam em risco o futebol brasileiro. É assim há anos e é difícil de enxergar o fim disso. Só em Brasília, Capital Federal, é o terceiro caso recente.
O problema são as organizadas? O problema é a falta de preparo da polícia? É a falta de condições para o evento? A cada acontecimento como o do Mané Garrincha, além dos danos (pessoas e estruturas), o futebol morre um pouco.
Pensem como foi dolorido para a Fabíola passar por essa situação com seus filhos. Pensem como foi ouvir do seu mais novo que não o faça ver futebol novamente.
Neste domingo, o Palmeiras venceu o Flamengo por 2 a 1 no Estádio Nacional de Brasília, pelo Brasileirão 2016.
Mas a grande derrota aconteceu fora do gramado: por conta de uma confusão envolvendo torcedores do Palmeiras, a polícia local utilizou gás de pimenta e este se espalhou.
Numa das cenas mais lamentáveis, um pai teve que carregar rapidamente no colo seu filho cadeirante, também intoxicado.
A partida demorou mais de dez minutos além do intervalo normal entre os tempos, com muitas pessoas passando mal, inclusive jogadores.
Independentemente do que deveria ser feito ou não, o fato é que a cada dia que passa é mais dificil frequentar um estádio de futebol no Brasil, o que parece agradar quem vê na transmissão dos jogos um mero exercício de lucro.
Num programa especial da antiga TV Manchete, resenhando o ano de 1987 no futebol brasileiro, personagens como Nabi Abi Chedid, Márcio Braga, Rubens Hoffmeister, Octávio Pinto Guimarães em cenas curiosas, mais os comentários imperdíveis de João Saldanha e a apresentação de Paulo Stein.
Em destaque, um clássico dos tempos da homofobia e da porrada:
Em 03 de junho de 1996, O Rio de Janeiro vivia sob forte comoção, em virtude do falecimento de dezenas de idosos na Clínica Santa Genoveva, em Santa Teresa, num acontecimento que repercutiu nacionalmente.
Na ocasião, o Jornal do Brasil publicou uma longa matéria sobre a agonia de Heleno de Freitas em seus últimos anos de vida, tendo em vista que ele também viveu em uma casa de repouso e, no fim, num sanatório.
Abaixo, as tristes memórias dos momentos finais de um dos maiores craques da história do futebol brasileiro.
Nesta sexta-feira (03/06), a prorrogação do CINEFOOT 2016 traz dois filmes importantes no sentido de se debater a estrutura do futebol brasileiro dentro e forma de campo: “Os boias-frias do futebol”, de Luciano Pérez Fernández, e “Geraldinos”, de Pedro Asbeg e Renato Martins.
A exibição será no Centro Cultural da Justiça Federal, com entrada franca, sujeita à lotação da sala, às 19 horas.
Avenida Rio Branco, 241 – Centro – Rio de Janeiro – em frente ao Amarelinho da Cinelândia.
OS BOIAS-FRIAS DO FUTEBOL
Atrasos de salários; jogadores que não recebem, outros que pagam para jogar; promessas não cumpridas; jornadas duplas ou triplas para complementar a renda familiar; falta de estrutura; contratos curtos de trabalho; ausência de calendário anual. Essas são algumas das dificuldades e obstáculos da dura realidade do mercado de trabalho dos atletas da base da pirâmide do futebol brasileiro. “Os boias-frias do futebol” revela os sonhos e as incertezas de dois jogadores da Série C do Campeonato estadual do Rio, a divisão mais operária do futebol fluminense.
GERALDINOS
Conta a história da Geral do Maracanã, carinhosamente conhecida como “o espaço mais democrático do futebol carioca”, que foi extinta em 2005. O nome do filme é baseado no termo Geraldinos, criado pelo radialista Washington Rodrigues para referir-se aos torcedores que assistiam aos jogos na Geral do Maracanã.
No último dia 25 de maio, a televisão mostrou a artimanha do técnico do Palmeiras, Cuca, para se comunicar com seu irmão – e assistente – à beira do campo. Cuca estava suspenso e não podia ficar no banco de reservas. Então, foi criado um sistema de comunicação entre o técnico, que estava numa cabine, e Cuquinha que comandava o time. Óbvio, sabiam que isso não era permitido. Óbvio, imaginaram que ninguém perceberia. Óbvio, tentaram tirar partido da situação. Depois de ser denunciado pelo STJD, soltou: “vai ver a gente ganhou o jogo por causa dessa m… que nem funciona”.
É lamentável essa mentalidade. O problema não é o ponto eletrônico ser o responsável pela vitória do Palmeiras. O resultado não está no centro da questão. O que está é o fazer o errado. Tivesse ganhado de dez ou perdido de vinte, o erro seria o mesmo. Qual a necessidade de tentar ludibriar todos os envolvidos no espetáculo? Engraçado que esse mesmo Cuca, recentemente, negou-se a continuar negociando com o Fluminense porque o clube mantinha contatos também com Levir Culpi.
A cada partida de futebol, temos inúmeros exemplos dessa mentalidade, quando os jogadores tentam enganar o árbitro ao se jogar, ao tocar a bola para fora e sinalizar que não o fez, ao fazer caras, bocas e gestos em infrações que todo mundo viu, inclusive o autor. O “roubado é mais gostoso” do goleiro Felipe foi mais um dos milhares de capítulos do livro que narra o perfil do caráter de significativa parcela do mundo do futebol. Eurico Miranda, Rubens Lopes, Ricardo Teixeira, Marco Polo Del Nero, entre muitos outros, reforçam a ideia das atitudes tortas.
Recentemente, foi a vez de Dunga ter sua dignidade questionada por ninguém menos do que Zinedine Zidane. O técnico da Seleção justificou a não convocação do lateral esquerdo do Real Madrid, Marcelo, numa contusão. No entanto, de imediato, o francês rebateu a afirmação chamando Dunga de mentiroso. Aliás, birra é típico do ex-capitão do time campeão da Copa de 94. Movido por sentimentos revanchistas, afasta da amarelinha qualquer um que ouse comentar algo. Rever ações que prejudicam o futebol brasileiro não entra na pauta desse pessoal.
O interessante é que esses atores – jogadores, técnicos, dirigentes – quando se sentem prejudicados, reclamam por justiça, questionam o caráter alheio, alguns enchem os olhos de lágrimas. É a visão de que somente os outros têm que ser honestos. Os problemas estão sempre nos outros. Pior que tudo isso faz escola, basta ver jogos entre os “subs”.
Seguindo a louvável linha da campanha iniciada após o assustador caso de estupro contra a menina no Rio de Janeiro, devemos clamar também, e sem a hipocrisia reinante no futebol, “pelo fim da cultura da desonestidade!”.
Um documentário de 1965 que procura captar a vida do jogador de futebol, desde menino nos campos de pelada, até o fim da sua carreira, sempre efêmera.
Até então o cinema brasileiro ainda não tinha passado a visão real e cruel da trajetória do jogador. “Subterrâneos do futebol” pretende contrapor a ilusão da fama à incompatível condição para sobreviver depois dela, muitas vezes no ostracismo e até na decadência.
A direção é de Maurice Capovilla, com fotografia de Thomaz Farkas e Armando Barreto, mais a produção de Vladimir Herzog. Um timaço!
Aí está o velho e querido America numa manhã de sol tímido, debaixo do tom preto e branco da foto, tirada pelo escritor Nelson Borges nesta quinta.
Em 1979, essa fachada significava o clube mais moderno do Brasil, erguido sobre o saudoso campo da rua Campos Sales. De saudade em saudade, o Diabo passou a jogar no Andaraí, Wolney Braune. E lá também a força da grana imperou. O sangue mudou de cidade – e não mais se encontrou, por mais que Edson Passos mereça o apreço.
De certa forma, essa linda fachada abandonada e vandalizada é uma espécie de símbolo desses tempos que vivemos: o Rio de Janeiro largado, indiferente, violento por todos os lados, caixa de percussão de um Brasil perdido, estuprado, alheio à maioria.
O America não é apenas o simpático segundo time dos cariocas que gostam de futebol. Ele é um dos pilares do esporte no Brasil.
Dia desses, num evento, tive a oportinidade de ouvir um breve discurso de um de seus dirigentes, falando das maravilhas contemporâneas produzidas recentemente pelo clube. Algo como tratar os interlocutores como perfeitos idiotas.
O America não é isso. Não é nem poderia ser um time de três rebaixamentos no campeonato carioca em dez anos. Mas aconteceu e aí está.
A triste imagem da fachada da sede de Campos Sales é a história oficial, bem distante da conversa para boi dormir de quem podia impedir isso mas, estranhamente, não o fez.
O America de Belford Duarte, de Pompéia, de Alarcón e também dos gêmeos Zó e Kel, de Moreno, Bráulio, Flecha, País, Ernâni, o incansável Luisinho Lemos, Edu, Romário e um milhão de glórias nos gramados.
Um dia tudo será diferente.
Gostaria de estar vivo para assistir.
Na modestíssima parte que me cabe, a de uma formiguinha diante do mundo, eu tentei ajudar, mas a ganância e a prepotência de terceiros brecaram tudo.
Era uma noite chuvosa qualquer. Eu assistia distraidamente um jogo da segunda divisão paulista. O silêncio foi quebrado pela pergunta da minha mulher:
– O que é isso que a gente tá vendo?
– São Bento x XV de Piracicaba.
– E isso vale o que?
– Segunda divisão paulista.
Fui forçado a mudar de canal. No seguinte, uma luta de box. Nesse segundo, um lutador socou abaixo da linha de cintura do outro. Vaias. Parei pra ver. O homem se levantou enfurecido. Segundos depois, outro golpe. Mais vaias. O primeiro se contorce, demora, e levanta mais enfurecido ainda. Para surpresa minha e de todos, um terceiro golpe abaixo da linha de cintura do mesmo lutador faz o juiz encerrar a luta, desclassificando o agressor. O oponente, ainda no chão, não viu quando o seu corner inteiro pulava pra dentro do ringue e começava uma pancadaria generalizada. Umas quarenta pessoas dentro das quatro cordas se ensopapando com toda a vontade. Um espetáculo sensacional, inusitado e ao vivo.
O exemplo vem do boxe, mas o texto fala do futebol, por ser o único esporte em que times de nível muito inferior podem causar grandes dores de cabeça a um adversário superior. Não há emoção no confronto entre um poderoso e um fracote no vôlei, no basquete ou em qualquer outro esporte coletivo que não o futebol.
Minha mulher também parou pra ver o furdunço. Mas mesmo tendo sido capturada pela curiosidade, não cabe na cabeça dela – e da grande maioria das pessoas – assistir a um Vasco X CRB às sete e meia da noite de uma quarta-feira. É uma porcaria de um jogo com o CRB, um time lá de Alagoas. Um espetáculo desses não pode ter nada de interessante.
Uma noite, em 1984, eu assistia, pela tv, a Santos x Ferroviária de Araraquara, na Vila Belmiro. Tive a honra de assistir ao vivo a esta sequência impossível de defesas de Rodolfo Rodriguez, outro monstro uruguaio a agarrar por times do Brasil.
Lá se vão trinta e dois anos. E eu não esqueço.
Quem foi a São Januário na quarta-feira passada testemunhar a pelada entra Vasco x CRB tampouco esquecerá um obscuro jogo, no qual, perdendo o jogo e precisando do empate, o técnico Jorginho promoveu a façanha de substituir o centroavante do time – Thalles – por um beque, Rafael Vaz, para espanto das sociais e dos telespectadores. Ao entrar em campo, O beque foi pro ataque. E o beque marcou um golaço no último minuto do jogo.
Outro jogo para a história. Daqueles que, por uns poucos lances, o vascaíno (por que não o amante de futebol?) vai se lembrar por anos.
Então, sugiro que você não olhe torto praquela aparente pelada num campo horroroso nos confins do Brasil. Algo inesquecível pode estar ali, prestes a acontecer. O imponderável.
Toda vez que penso no Brasil, o país que poderia ter sido, o país que foi e o que é, me vem à mente a imagem de Juscelino Kubitschek reunido no Brasília Palace Hotel em 1958. Animada comitiva, vinda de um DC3 do Rio, cercava o presidente e ouvia de um rádio transistorizado com antena esticada no último, a final da Copa do Mundo entre Suécia e Brasil.
O presidente bossa nova parece incomodado na foto, de braço em riste como pedisse para pararem a algazarra, enquanto todos de braços erguidos comemoravam um dos gols do timaço de Pelé, Garrincha e companhia. É provável que ruídos de ondas curtas atrapalhassem a transmissão e a atenção do atento e desconfiado – como sói ao bom mineiro – JK.
Há algo perdido naquela foto. A começar pelo autor, até hoje desconhecido. Pode ter sido o tio do cafezinho.
A partir daquele ano o Brasil seria vanguarda diferenciada em diversos campos. No cinema novo, na música bossanovista, na literatura dos concretos paulistas, na arquitetura de Niemeyer, nas artes, teatro de arena e a partir daquele jogo, também nos esportes. Seria campeão de basquete, tênis, boxe e atletismo anos seguidos. Nelson Rodrigues versou que finalmente perdemos naquela tarde em Estocolmo (manhã no Brasil) o malfadado “complexo de vira-latas”.
Aquele país, em que pese a infraestrutura ainda de dar pena, por incrível, era cortado por trens de norte a sul. Gigante exportador de café e predominantemente agrícola, havia ainda muito mais Jecas Tatus que Haroldos de Campos, por óbvio, ao longo do extenso território. No meu delírio, é possível dizer que o Brasil não era nenhum Pelé. Era, vá lá, um Zito. Segurava a bronca lá atrás, e dava conta do recado e suporte ao primeiro mundo, este na linha de frente. Tudo com muita elegância, a bem da verdade. Quem viu Zito jogar, ou como eu apenas ouviu falar, sabe a que me refiro.
Como anos depois viria a observar Tom Zé, de forma extremamente charmosa, em muito pouco tempo o país deixou a condição mais baixa do universo civilizado, o de fornecer matéria prima, para o mais elevado: provedor de cultura. Era o país do futuro. Que coisa.
Penso sempre naquela foto. E junto com a lembrança da imagem vem a pergunta inevitável: onde foi que erramos? Algumas respostas surgem de imediato. Sem a ingenuidade da juventude já sabemos todos que, por exemplo, foi no período JK que o desmonte dos trilhos começou. O transporte por trens talvez seja o elemento mais estratégico da
infraestrutura de um país. Isso pra citar um exemplo, bastante pertinente quando vemos a influência das grandes empreiteiras do cimento no universo político da nação. Perdemos o trem, fomos de busão. Daí o atraso, os senhores nos desculpem.
Depois de alguns anos de confusão generalizada, todos sabemos o que aconteceu. A festa acabou. Veio a ressaca pesada do grande carnaval, em que heróis e vilões se revezaram no meio de uma passarela imaginária, agora emitindo seus rancores via planalto central. Anos de chumbo e tudo o mais.
Há algo mais perdido naquela foto. Um país que é apaixonado pela ficção novelística, a que muitos creditam o advento da televisão, em ledo engano. O brasileiro consumia vorazmente folhetins impressos desde o século 19, e as novelas de rádio paravam o país. “O Direito de Nascer” deu briga de família. Vizinhos se reuniam para ouvir a radionovela, vovó me contava. Livros e enciclopédias eram grandes fontes de renda, vendidas de porta em porta a uma classe média que crescia a olhos vistos, junto com as cidades. O Brasil das ondas de rádio está perdido naquela foto. Depois entregue aos raios catódicos, a paixão folhetinesca apenas continuou.
No hedonismo que se seguiu em décadas seguintes, Pelé se tornou o homem mais conhecido do mundo. Em processo inverso e misterioso, o país a que ele pertence foi sendo esquecido. Isolado por ditadura, quem sabe. Por acabrunhamento ou interesse que não nos ocorre.
Mas malandro é malandro e mané é mané. Olha nós aqui outra vez!
Voltamos no final do século. E dá pra dizer que reentramos muito bem, armados de guitarras elétricas e tambores de maracatu, reforçados por Romário, Ronaldo, Bebeto, Ronaldinho e Rivaldo. Deu pro gasto e ainda sobrou um tanto pra cachaça. Adentramos os aguardados anos 2000 triunfantes. Estamos aí.
Meu delírio termina aqui. Há outro processo turbulento nos ameaçando para o limbo de um período importante da História novamente. É por isso que não consigo deixar de pensar que há algo mais perdido naquela foto. Pode ser no gesto do presidente pedindo calma… calma.
Flavio Jacobsen é escritor e compositor. Autor de Uns Contos no Bolso (Kottrer Editorial, 2015). Artista de rock, canta e toca guitarra na banda Gruvox.
Imagens dos jogos Força e Saúde x São Clemente e Copaleme x Juventus, pelas semifinais do campeonato estadual de futebol de praia 2016, diretamente das areias de Copacabana no dia 14 de maio.
Em 12 de outubro de 1979, a revista Placar batia de frente com a corrupção no futebol, misturada à política nacional e outras mazelas que, pelo visto, não sofreram maiores modificações nas últimas décadas.
É interessante notar boa dose de perenidade nas canetas certeiras de Juca Kfouri e João Saldanha, tudo dosado com finas ironia e humor.
A sétima edição do CINEFOOT – Festival de Cinema de Futebol – começa nesta quinta-feira no Rio de Janeiro, com atrações especiais e entrada franca, depois passando por Caté, Recife, São Paulo, Belo Horizonte e Vitória.
Uma fantástica oportunidade de testemunhar o encontro de duas artes, o cinema e o futebol, mas por diversas perspectivas de reflexão: a crítica social, a análise das épocas, um mergulho no caminho do esporte que leva a entender sociedades, comportamentos e fatos.
Hoje começa o Campeonato Brasileiro, o Brasileirão, a competição esportiva mais importante do nosso país. Serão sete meses, 380 jogos, e no final, um campeão e quatro rebaixados à Série B.
Então, preparei uma pequena análise das equipes que disputarão o campeonato.
América-MG – O título mineiro mostrou que o time não é tão fraco assim; pode almejar ir além da briga pela permanência na elite do futebol brasileiro.
Atlético-MG – É um dos postulantes ao título deste ano. Manteve a boa base do ano passado e vem apresentando o melhor futebol do Brasil em 2016.
Atlético-PR – Venceu o título paranaense e tem um bom time. Caso consiga ser forte em casa, e beliscar algumas vitórias fora, poderá brigar por uma vaga na Libertadores; caso contrário deve ficar no meio da tabela.
Botafogo – Possui um bom time e só. Seu elenco não dispõe de bons reservas, o que pode ser perigoso em uma competição tão exigente. Deve ficar na parte de baixo da tabela e manter-se na primeira divisão deve ser o objetivo. O que vier além disso é lucro.
Chapecoense – No último ano, o atual campeão catarinense escapou do descenso nas últimas rodadas e, para não passar sufoco desta vez, a Chapecoense vai precisar melhorar seu desempenho fora de seu estádio, onde geralmente consegue dificultar a vida dos favoritos. Deve ficar no grupo intermediário do campeonato.
Corinthians – O atual campeão perdeu sua espinha dorsal; decepcionou no Paulista e na Libertadores, sendo eliminado precocemente em ambas. A confiança reside na capacidade de Tite conseguir reconstruir seu time e lutar pelo bicampeonato nacional.
Coritiba – No ano passado, só se livrou do rebaixamento na ultima rodada. E neste ano, o Coxa deve mais uma vez, passar sufoco no Brasileiro, lutando pela permanência na divisão de elite do futebol brasileiro.
Cruzeiro – Começou muito mal o ano de 2016, trocou de técnico e vai recomeçar o trabalho com o português Paulo Bento. Mas ainda está atrás de seus principais concorrentes, o que pode deixá-lo de fora da luta pelo título. Mas é um dos postulantes a uma vaga na Libertadores de 2017.
Figueirense – A luta contra o rebaixamento deve ser a tônica do Brasileiro do Figueirense, que na última temporada se livrou da Série B somente no fim do campeonato. Vencer em casa é fundamental para fugir da parte de baixo da tabela.
Flamengo – Tem potencial para chegar à Libertadores do ano que vem, mas até o momento não mostrou qualidade para se credenciar como candidato à vaga. Se Muricy conseguir encaixar o time, aí o Flamengo poderá subir na tabela.
Fluminense – Sua situação se assemelha à do rival Flamengo, mas o Tricolor já está em um patamar melhor, com seu time mais acertado, dando ao seu torcedor, a esperança de ver seu time na Libertadores em 2017.
Grêmio – Roger Machado vai ter que fazer seu time apresentar o bom futebol que levou o Grêmio à Libertadores desse ano, pois até o momento, o tricolor gaúcho não mostrou potencial para repetir a boa colocação de 2015.
Internacional – Hexacampeão gaúcho, o Colorado dessa vez não começa o Brasileiro como um dos favoritos ao campeonato. O Internacional possui uma equipe bem estruturada, bom técnico, mas ainda falta qualidade à equipe para se posicionar no nível dos concorrentes à taça. Deve brigar pela vaga na Libertadores.
Palmeiras – O período de férias forçadas que teve pode ser determinante para Cuca acelerar a evolução do time – e colocá-lo em condições de igualdade com as principais equipes na luta pelo caneco.
Ponte Preta – No ano passado, a Macaca ficou pelo meio da tabela. A missão da equipe campineira é melhorar a posição do último ano e passar o Brasileiro sem sustos, se mantendo na Série A.
Santa Cruz – Impulsionado pelos títulos do estadual e da Copa do Nordeste, o Santa chega ao Brasileiro pensando ir além da briga pela permanência na primeira divisão. Para isso, o time aposta suas fichas em Grafite. Caso o atacante consiga fazer bons jogos, o Santa Cruz tem grandes chances de terminar o ano na parte intermediária da tabela.
Santos – Sem dúvida nenhuma, o Peixe tem qualidade suficiente para concorrer a uma das vagas na Libertadores do próximo ano. Para ter condições de ir além, depende da capacidade do Dorival Júnior conseguir fazer a equipe ir a um degrau acima de onde está hoje.
São Paulo – Depois de um início de ano oscilando entre boas e más atuações, o time do Morumbi parece ter encontrado o seu melhor futebol, o que credencia a equipe a, pelo menos, estar na briga pelo G4, mas em condições de voltar a ser campeão depois de oito anos.
Sport – Depois do sexto lugar no ano passado, o Leão da Ilha perdeu seus principais jogadores e hoje está atrás de seu rival local, o Santa Cruz. Portanto, dificilmente, a equipe este ano conseguirá repetir a boa campanha do ano passado; deverá brigar no máximo pelo meio da tabela.
Vitória – O rubro-negro baiano volta à Série A com o objetivo de se manter pelo meio da tabela e não passar apertos para permanecer na elite em 2017. Se a situação da equipe permitir, o Vitória poderá sonhar em rugir mais alto nesse Brasileirão.
No programa SBT Repórter, apresentado por Roberto Cabrini em 13/06/2013, o perigoso universo do submundo do futebol.
Durante cinco meses, Cabrini investigou homens que se diziam empresários e agentes, mas que, na prática, em nome do lucro, montaram uma verdadeira fábrica de fraudes.
Hola, estoy aqui “de boa”, solamente mirando mi decano querido y esperando por Boca Juniors
Semana passada, o PANORAMA DO FUTEBOL estava passeando pela bela capital uruguaia, justamente no dia anterior ao jogo de ida de Nacional x Corinthians. E como não poderia ser diferente: passeio é trabalho também.
Fomos à busca do Gran Parque Central, estádio uruguaio, para fazer algumas fotos e conhecer mais de perto o Club Nacional de Football. Já que o GPS do “coche” não ajudou muito, quase desistimos pela segunda vez de visitar esse mito do futebol ao passarmos direto pela entrada do Clube, quase sem perceber. Mas, fizemos o possível e sem pestanejar, viramos a primeira a direita com o objetivo de retornar. Ahh GPS infernal! A tentativa de retorno se mostrou quase frustrada, não fôssemos parar em uma rua sem saída, onde havia pequenos cones nas cores do clube, símbolos do clube pintados nos muros junto aos grafites e uma pequena pista de skate onde moleques chutavam uma pelota, mostrando que ali, no subúrbio da capital, no bairro La Blanqueada, o futebol ainda respira. E nessa respiração, sentimos o cheiro do gol mais perto.
Buscando estacionar para visitar o clube, vislumbramos o acanhado estádio que se situa na rua logo atrás. Pronto! Missão dada, missão cumprida! E todo bom viajante, tem que contar com a sorte. As equipes de TV brasileiras estavam no estádio fazendo a cobertura do Corinthians na Libertadores e, com isso, os seguranças permitiram que fizéssemos algumas fotos no interior.
Logo na entrada, uma demonstração da responsabilidade que é defender um clube de massa. Os torcedores deixam suas mensagens de força, apoio e também cobrança, em um painel. E curiosamente o termo em espanhol para designar os torcedores se chama “hinchas”. Este termo tem origem em um torcedor do Nacional que inflava seus pulmões para encher balões de gás em todos os jogos.
No hall dos elevadores, a imagem do General Artigas e o motivo das cores do clube. Naquelas redondezas, em 1811, Artigas foi nomeado o chefe dos orientais que conduziriam a independência uruguaia. O local era o rancho de Juana de Suarez, conhecida como “La Paraguaya”, daí as cores do clube, que também guarda semelhança com as cores das bandeiras dos 33 orientais.
Hora de acessar as arquibancadas! Bom, para quem conhece La Bombonera, no Caminito, podemos dizer que a impressão é a mesma. Ao adentrar as arquibancadas, a sensação de caldeirão que temos pela TV nos foi confirmada. Um estádio marcado na história, que foi reconhecido pela FIFA como o local da primeira partida de Copas do Mundo, em 1930.
E para nossa grande surpresa, adivinhe quem permanece desde 2013, sentado, observando seu “clube de coração”, conforme reza a lenda? Carlos Gardel, o “Zorzal Criollo”, ele mesmo. Derivado da grande disputa por sua nacionalidade, Gardel também gera disputa pelo seu time de coração. E nessa disputa, a estátua-homenagem feita pelo Nacional, até o momento, mostrou-se mais ousada.
Orgulhando-se de ser o primeiro clube criollo da América Latina, o grande Nacional, ostenta também o tri da Libertadores da América e inúmeros títulos uruguaios, que lhe dão a alcunha de Rey de Copas. Mas o maior “título” para eles vem de mais uma polêmica e conturbada controvérsia com seus adversários. Quem é o Decano do futebol uruguaio? Para La Banda del Parque, não há dúvidas. Club Nacional de Football, fundado em 14 de maio de 1899.
Dentre os jogadores de grande destaque por lá, lembramos Recoba, Dario Pereira, Hugo de Leon, Lugano, Loco Abreu, Ruben Sosa, Rodolfo Rodriguez, e o, super-reconhecido por lá, goleiro Manga.
Seu maior ídolo foi Atilio Garcia, com cerca de 460 gols. No entanto, Abdon Porte ficou marcado na história por dar literalmente sua vida pelo time.
Por fim, fizemos um interessante registro de como a vizinhança está colada com o muro do estádio. Nele mora a certeza de que ao nascer, o pequeno uruguaio, já nasce com a pelota nos pés.
Essa coluna vai ao ar nesta sexta-feira (06/05), após o jogo de volta pelas oitavas de final da Libertadores, propositadamente para que possamos refletir que o amor pelo futebol está além das quatro linhas. E para que os clubes brasileiros aprendam que é impossível ganhar fácil de um time de expressão uruguaio, seja onde for o jogo. Não sabemos onde o Nacional poderá chegar nessa Libertadores. Mas na noite passada, a tradição e a mística da camisa foram muito bem contadas e o tango uruguaio foi dançado ao som de Gardel.
Um dos grandes fotógrafos do Brasil faleceu hoje: Orlando Abrunhosa.
Sobre ele, as imagens falam mais do que tudo.
Orlando Abrunhosa em entrevista a Mauro Ventura em O Globo: CLIQUE AQUI.
O documentário “Três no Tri”
Copa do México, 1970: Pelé faz o gol da virada contra a Tchecoslováquia, dando início à arrancada da seleção brasileira rumo ao tricampeonato. Orlando Abrunhosa imortalizou o feito na fotografia brasileira mais reproduzida mundo afora, mas esta não é a sua única façanha.
Direção e roteiro: Eduardo Souza Lima
Produção: Ailton Franco Jr.
Produção executiva: Anna Azevedo
Direção de produção: Daniela Santos
Fotografia e câmera: David Pacheco
Montagem: Eva Randolph
Som direto: Júlio Braga e Vampiro
Edição de som: Rodrigo Maia
Mixagem: Damião Lopes
Participações especiais: Evandro Teixeira e Walter Firmo
Prêmios:
Prêmio Edital RioFilme de Produção de Curta-metragem 2011
Troféu CINEfoot 2013 de Melhor Curta-Metragem
Mention d’Honneur da categoria Movies & Great Champions do 31º Milano International Ficts Fest
O verdadeiro torcedor não se dá a conhecer. Embora um conoisseur, prefere trabalhar – seu ofício é duro – em silêncio. Tem razão. Sua prática é feroz, exige disciplina e nem todos o compreenderiam.
O verdadeiro torcedor não pinta a cara ou qualquer outra parte de seu corpo, não veste a camisa de seleção alguma, não agita bandeiras, não ergue a voz em coro com outros. O verdadeiro torcedor é um animal pensante doméstico. Não vai aos jogos. Principalmente os da Copa do Mundo. Escolhe, no entanto, torneios importantes que propiciem amplo espaço na imprensa, televisão ou mesmo rádio.
O verdadeiro torcedor gasta seu dinheiro em jornais, publicações especializadas, cadernos em espiral e canetas esferográficas. E uma tesoura razoável. No seu quarto, um território proibido a estranhos, tem colado nas paredes tabelas coloridas e algumas fotos e recortes pregados com uma massinha azul que não deixa marca ou mancha. Na mesa de trabalho, ao lado do computador, o caderno de notas, a tesoura (Recortar é viver, este seu lema) e uma Bic, de preferência azul.
O verdadeiro torcedor passa entre 2 a 3 horas por dia folheando os jornais em busca de colunas relativas aos diversos jogos. Degusta análises, com ênfase naquelas que ousem previsões. Não são difíceis de encontrar: o peixe morre pela boca, o jornalista esportivo pelo texto. O verdadeiro torcedor passa pelo menos uma hora vendo e ouvindo, com atenção, as observações feitas pelos bem pagos comentaristas profissionais durante os intervalos e as versões compactas dos jogos da Copa. O verdadeiro torcedor ri fácil e, sério, toma notas.
O verdadeiro torcedor é um perfeccionista. O verdadeiro torcedor sabe, como os mais desbragadamente apaixonados, o nome e a ficha completa de jogadores mais populares como Cristiano Ronaldo, Messi, Robinho, Maicon, Eto’o, Casillas, Rooney e Dempsey, como também daqueles menos cotados, como Zigic, Özil, M’bohir, Yussuf e Park-Ji-Sung.
Até mesmo os técnicos não fogem a seus olhos dourados de atenção: Otto Rehhagel, Huh Jung-moo, Gerardo Mantino e Rajevac são magos feiticeiros de sua intimidade. O verdadeiro torcedor desconhece limites para o esporte das multidões em sua modalidade máxima, pois sabe de cor e salteado até mesmo o nome de todos os estádios sul-africanos, dos quais prefere citar, em voz baixa e a sós, como se recitando uma incantação, os de Koftus Versfeld, Peter Mokaba, Mbombela e o de Moses Mabhida.
O verdadeiro torcedor tem, por vezes, seus exageros, pois é humano, nada mais que humano. Saber uma linha do hino nacional da Argélia, sob qualquer ponto de vista, não deixa de ser levar a idiossincrasia a seus mais desvairados limites (É assim: Qassaman Binnazzilat Ilmahigat e quer dizer Juramos pelo raio que destrói).
O verdadeiro torcedor freme e goza de prazer é quando encontra, como foi o caso, um comentário-prognóstico de David Hytner, doGuardian, na mesma manhã em que, algumas horas depois, a Alemanha foi perder de 1 a 0 para a Sérvia:
Joachim Löw revitalizou sua equipe (a alemã, frise-se) com uma abordagem técnica audaz, saudável e multicultural. E, mais abaixo, A formação por ele escolhida a dedo abunda com a exuberância e o frescor da juventude. Assim prosseguiu o notável David Hytner, sem sequer esquecer do trema sobre o ode Löw, jabuzelando e vuvulanando por umas três colunas.
A Sérvia? Sob a batuta de Raddy Antic? A Sérvia definitivamente não estava à altura de conter as feras de Löw que, até então, já haviam desembestado ganhando de 4 (de quatro!) da – seria manhosa, David Hytner? – Austrália, orquestrada sob a batuta do – seria capcioso, David Hytner? – Pim Verbeek.
O verdadeiro torcedor, assim como quem não quer nada, quer tudo. O verdadeiro torcedor é pela zebra e o circo pegando fogo fora de campo. O verdadeiro torcedor pouco liga para milionários dando pontapés e estragando gramados.
O negócio do verdadeiro torcedor é ver os outros milionários, os da mídia, quebrando a cara. Momentaneamente, ao menos. O verdadeiro torcedor sabe que os outros torcedores, coitados, logo vão embora e de tudo se esquecer depois de cantarem seus estribilhos, soprarem nisso ou naquilo outro e voltar a esperar outros quatro anos..
O verdadeiro torcedor não carece de matéria. N’est-ce pas, cari amici italiani?
(Publicado originalmente na BBC Brasil em 21 de junho de 2010)
Um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos – e um torcedor fanático do Botafogo -, Ivan Lessa fez parte do grupo que colaborou e que, durante muito tempo, fez sucesso no jornal “O Pasquim”. Carioca, filho de Orígines Lessa e Elsie Lessa, escreve valendo-se de um humor cheio de ironias. Auto-asilado na Inglaterra, segundo ele por ter-se desencantado com o Brasil, trabalhava na BBC de Londres. Publicou em praticamente todos os grandes veículos da imprensa brasileira.
Ivan faleceu aos 77 anos, em Londres, onde vivia, em 09/06/2012.
Morreu ontem (3), no Rio de Janeiro, o jornalista Teixeira Heizer, de 83 anos, após sofrer uma parada cardíaca, um dia após o lançamento do seu mais recente livro A outra história de cada um. Jornalista esportivo, começou no rádio, na década de 1950, e trabalhou nos últimos anos como comentarista nas transmissões de futebol e nos debates do canal SporTV.
Foi fundador da Rede Globo e se orgulhava de ter o crachá funcional número 01, como primeiro contratado da emissora. Trabalhou em vários veículos ao longo da carreira, também na televisão, e passou pelas redações dos jornais Diário da Noite, Diário de Notícias, Última Hora, O Dia, Placar, Veja e por vários anos trabalhou na sucursal do Estado de São Paulo no Rio de Janeiro, além de ter sido gerente de Jornalismo da extinta Empresa Brasileira de Notícias (EBN) e da Radiobrás, nos anos 80.
Heizer foi ainda professor de Jornalismo da Faculdade de Comunicação Social da Universidade Gama Filho. Ele escreveu dois livros sobre futebol, sua grande paixão: O Jogo Bruto das Copas do Mundo e Maracanazo – Tragédias e Epopeias de um Estádio com Alma, lançado em junho de 2010, contando suas memórias sobre a final da Copa do Mundo de 1950, no Rio de Janeiro, quando a seleção brasileira foi derrotada pela uruguaia, no Maracanã, por 2 a 1.
Ao Memória Globo, Teixeira Heizer lembrou que o apreço pela língua portuguesa era uma de suas principais marcas: “Sempre que eu escrevia [no jornal], eu prestava atenção porque alguém ia ler o que eu fizesse. Então eu construía o melhor para oferecer ao leitor. Até hoje, bate no meu ouvido: Ele tem o gosto pela frase”.
Primeiros passos
O primeiro trabalho no jornalismo foi na redação do jornal Correio Fluminense, em 1953. Um ano depois, já fazia parte da equipe de repórteres da Continental, emissora de rádio carioca cujo slogan era ser “Cem por cento esportiva”. No início da década de 1960, começou a trabalhar como comentarista esportivo na Rádio Globo, ao lado de profissionais como Waldir Amaral, Luiz Mendes e Raul Brunini.
Pela Globo, Heizer participou da cobertura da Copa do Mundo do Chile (1962), quando a seleção brasileira de futebol comandada conquistou o segundo título mundial. No ano seguinte, o jornalista fez parte da equipe que cobriu uma excursão da seleção brasileira pela Europa. Essa cobertura deu à Rádio Globo o primeiro lugar de audiência entre as emissoras cariocas na época.
Teixeira Heizer fez parte da equipe de profissionais que participaram da inauguração da TV Globo, em 1965, e foi contratado com o crachá número 01 da empresa. Heizer foi o responsável também pela criação dos primeiros programas esportivos da emissora, como o Em Cima do Lance e Por Dentro da Jogada. Fazia parte também do TeleGlobo e chegou a apresentar o programa ao lado da atriz Nathalia Thimberg e do locutor Hilton Gomes. O telejornal foi o primeiro a ser exibido pela emissora.
O jornalista será enterrado nesta quarta-feira (4) no Cemitério de Itaipu, em Niterói, região metropolitana do Rio, em horário a ser ainda definido pela família.
Do jornalista Fernando Brito, do blog Tijolaço
Eu poderia escrever sobre a importância de Teixeira Heizer no jornalismo esportivo, um dos pioneiros e mais independentes e apaixonados, como éramos nos anos em que o futebol era motivo de paixão.
Poderia escrever sobre sua importância para uma geração de companheiros teimosos, remadores contra a maré, na qual se incluem Juca Kfouri e José Trajano?
Escrevo, porém, sobre algo muito pessoal.
Quando me mudei para Niterói, construindo uma casa do nada, sem economias,Teixeira Heizer soube disso.
Por artes do destino, uma indenização trabalhista, se não me engano do Estado de São Paulo, havia permitido que ele comprasse uma pequena escola, o São Marcos, que sua mulher e seu filho Marcos – grande músico, já morto, agora – dirigiam.
Escola boa, aliás, muito boa, que acabaria sendo vendida para outro grupo educacional.
Teixeira queria porque queria que meus filhos estudassem lá, sem pagar.
Óbvio que não aceitei, mas ele então fez um desconto que tornou viável erguer casa e escola para os meus guris, sem que eu perdesse a vergonha na cara.
Era um domingo qualquer de “Show do Esporte”, em 1985. A Band mostrava o campeonato italiano, e este era um jogo dos melhores. A Juventus, de Platini e Boniek, ia a Napoli encarar Maradona – que ainda não havia virado Deus – e seu time mediano que, anos mais tarde, conseguiria o tão esperado Scudetto.
Mas o que há de tão sensacional nesse jogo? A falta, batida por Maradona, que o vídeo acima mostra. No gol estava Stefano Tacconi, uma lenda da Juventus, um monstro de goleiro. Lembro bem do lance, que já não era uma marcação comum da arbitragem. Dois toques dentro da área, a barreira montada em cima da bola. Não há espaço pra nada. Esse colherada (com a bola em movimento) por cima da barreira é uma das coisas mais inexplicáveis que já vi num campo de futebol. Eu (e o mundo) jurávamos que a bola seria batida do outro lado, pela absoluta impossibilidade de se fazer qualquer outra coisa. No entanto… O gênio fez isso ai.
É um troço tão sensacional, tão inacreditável, que eu estou aqui falando de uma falta, de um único toque, trinta anos depois.
Nunca mais vi nada parecido.
A tradução do título do vídeo: “Tanto faz, faço o gol assim mesmo”. Resposta a um companheiro de time que reclamava da barreira próxima demais.
Depois querem comparar brasileiros contemporâneos a ele…
Em 20 de abril de 1984, a revista Placar publicava excelente matéria de Moacir Japiassu sobre a ascensão da empresa Traffic no mercado da publicidade esportiva, liderada pelos jovens Ciro José e J. Hawilla – este, no ramo desde 1973.
O futebol brasileiro parece imitar as ditaduras: desmandos, censura e às vezes até assassinatos.
O fato de ter sido um dos braços de sustentação da ditadura militar no Brasil – ainda que involuntariamente – contribui para que o futebol continue nutrindo resquícios daquele período?
Um terço dos presidentes de federações de futebol no Brasil está no poder há mais de 20 anos.
A falta de alternância nas posições de comando do esporte interfere diretamente em medidas autoritárias, como a recente “lei da mordaça”, no Rio de Janeiro?
Nos chamados “anos de chumbo”, a tirania jogou duro com atletas e torcedores que se rebelavam pelo futebol. De lá para cá, pouca coisa mudou.
As mãos que tapavam a boca dos jogadores de Flamengo e Fluminense num clássico em 2015, enfileirados no centro do gramado do Maracanã, tinham um alvo em comum. Três meses antes do protesto, a Federação de Futebol do Rio de Janeiro (Ferj) havia decretado a “lei da mordaça”. A entidade emplacou um artigo no regulamento do Campeonato Carioca proibindo atletas, treinadores e dirigentes de criticarem publicamente a competição.
Sintonia fina com o “padrão Fifa”, que havia imposto norma semelhante durante a Copa das Confederações em 2013 e na Copa do Mundo de 2014. “Vivemos um retrocesso”, disse à época Rodrigo Collodel, presidente da Frente Nacional dos Torcedores, movimento que cobra a democratização do futebol. “No tempo da ditadura, os estádios abrigavam as reivindicações que as pessoas não podiam fazer nas ruas. Agora estão se tornando ambientes higienizados e controlados por dirigentes.”
Repórter do diário Lance!, Bruno Cassucci sentiu na pele a ferocidade que torcedores habituaram-se a experimentar. Ele foi agredido por policiais militares quando cobria uma briga entre torcedores nas imediações da Vila Belmiro, em Santos, no fim do ano passado. As fotos que ele havia registrado da confusão foram apagadas de seu celular por um oficial. “Um PM (…) pegou uma bomba de efeito moral, puxou minha calça e a colocou dentro”, relatou. Ameaçado pelos policiais durante a abordagem, Cassucci contou que preferiu não fazer o reconhecimento dos agressores por medo de represálias.
Segundo relatório da Federação Nacional dos Jornalistas, pelo menos seis casos de violência envolvendo profissionais de comunicação em 2014 foram associados ao futebol. Todos eles seguem impunes ou mal resolvidos. A três dias do penúltimo Natal, o radialista esportivo Iran Machado foi executado com dez tiros na porta de casa em Itabaiana, interior de Sergipe. Apesar da suspeita de que alguma denúncia de Machado no rádio pudesse ter ocasionado o assassinato, e da prisão de Jefferson Chaves, o Bodão, principal acusado dos disparos, a polícia ainda não conseguiu esclarecer a motivação do crime. No mês anterior, o cinegrafista Jeferson Kickhofel registrava imagens de uma discussão na saída do gramado até ser abordado pelo diretor de futebol do Londrina, Alex Brasil. O dirigente tentou pegar a câmera de Kickhofel, que, em seguida, foi acometido por socos e chutes de outros membros da equipe.
Mentor da lei da mordaça, Rubens Lopes completa uma década na presidência da Federação do Rio de Janeiro em 2016. Reeleito por aclamação no ano passado, ele tem mandato até 2018. Seu antecessor, Eduardo Viana, que morreu em 2006, comandou a Ferj por quase duas décadas. No futebol brasileiro, 11 dos 27 presidentes das federações estaduais, que ajudam a eleger o comando da CBF, ocupam o cargo há mais de 20 anos. Quatro deles dão as cartas desde a época em que o país era governado pelo regime militar. Empossado na CBF em cerimônia fechada para a imprensa na manhã desta quinta-feira, Marco Polo Del Nero dirigiu a Federação Paulista por 12 anos. Tome Nabi Abi Chedid, Heleno Nunes e outros.
“A ditadura não inventou a cultura autoritária do Brasil, mas aprofundou-a e a expandiu para além da política. No futebol nacional, há a ‘cultura do mandonismo’. Dirigentes comportam-se como se estivessem administrando um negócio que lhes pertence, como uma fazenda”, afirma Adriano Codato, doutor em ciência política e professor da Universidade Federal do Paraná. Líder do Bom Senso F.C., que articula a inclusão da limitação de mandatos de dirigentes entre as contrapartidas da Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte em tramitação no Congresso, Paulo André defende que “a alternância de poder é a pedra fundamental para o desenvolvimento do nosso futebol”.
Cartolas e seus mandatos intermináveis à frente de clubes e federações. Desmandos e monopólio de poder da Confederação Brasileira de Futebol. Censura e repressão nos estádios.
Não é possível estabelecer uma relação de causa e efeito entre esses dois fenômenos. Os traços autoritários e, mais do que isso, arbitrários e despóticos presentes no futebol, seja na prática de juízes, seja na de dirigentes e técnicos, têm mais a ver com a cultura autoritária do país. Essa cultura a ditadura não inventou, mas a intensificou e expandiu para além da política. No futebol nacional, há a cultura do mandonismo: segundo o raciocínio das torcidas e de parte da crônica esportiva, o capitão deve mandar no time, o técnico no capitão (e, por extensão, em todo o time), o diretor de futebol no técnico e o presidente no diretor. Não é propriamente uma cadeia racional de comando, mas uma estrutura hierárquica, parodiando a estrutura militar (daí as metáforas “capitão”, “comandante”, etc.), que só se justifica em função dos caprichos daquele que pode mais nessa relação perversa. Com isso, quem se engana é a torcida, porque lhe contaram que ela é o patrão máximo do clube.
Esse é um efeito da cultura autoritária e da sua representação política no futebol, o mandão local. Pode ser o chefe de uma facção de torcida organizada, o dirigente sabe-tudo, o presidente do clube ou da Federação. Os dirigentes comportam-se como se estivessem administrando um negócio que lhes pertence, como uma fazenda. Isso ajuda a explicar comportamentos como os do “coronel” Eurico Miranda, do “coronel” Mario Celso Petraglia, do “coronel” Marin.
Manifestações de pessoas vestidas com camisas da seleção e bandeiras do Brasil, que pedem a volta da ditadura, se encaixam nesse contexto? No Brasil, há um fenômeno sintomático e contraditório em curso. Ele pode ser visto nas passeatas que exigem a destituição da presidente eleita em 2014. A contradição mais óbvia é protestar contra a corrupção fantasiado com a camisa da seleção da CBF.
Existe também um fenômeno que não se via desde os anos 1970: a identificação da seleção brasileira, das suas cores, da sua simbologia, com o Brasil. Como se o país se reduzisse a isso ou se essa fosse sua melhor expressão. Esse orgulho nacionalista surge, paradoxalmente, num momento em que não há muito do que se orgulhar em termos futebolísticos. Essa é a segunda contradição.
Por fim, não deixam de ser sintomáticas as manifestações autoritárias contra as regras do jogo e, consequentemente contra a democracia, desde o amaldiçoamento de “comunistas” até a representação da CBF como o máximo de brasilidade possível. A entidade pouco se importa com algo que não tenha a ver com seu lucro, que está longe de semear benefícios diretos aos clubes de futebol no país.
Fonte: Revista Placar, Jornal Lance e Bom Senso FC.
Engana-se quem pensa que a tão famosa seleção de Telê Santana era unanimidade.
Antes de ter esse programa de entrevistas no fim das noite, Jô Soares era um dos melhores humoristas do país. Ele comandou, por muitos anos, um programa humorístico chamado “Viva o gordo” – depois “Veja o gordo”, no SBT. Entre as dezenas de personagens, o “Zé da Galera”, este, do vídeo acima. Era um personagem fixo do programa. Ou seja, toda semana havia um quadro novo. O quadro consistia de um telefonema, de um orelhão, do cidadão comum para Telê Santana, técnico da seleção brasileira. Toda semana, o Zé reclamava da atuação da seleção, de algo relativo à escalação do time e, principalmente, da completa ausência de pontas entre os 22 convocados da seleção.
O resultado final da seleção de 1982 todos conhecemos.
Não me lembro (tinha onze anos na época e, como o programa era noturno, nem sempre o assistia) como terminou a personagem. Nas minhas buscas na internet, achei vários textos, todos apontando para este exato vídeo. E uma entrevista do autor da personagem, realizada durante a Copa seguinte, de 86, na qual o Brasil foi comandado pelo mesmo Telê.
Nessa época, a seleção era algo bem próximo do povo. Jogava no Brasil, com jogadores do Brasil. Havia até bairrismo, com a imprensa de São Paulo escovando os cariocas e vice-versa. Tudo isso acabou. Pelo menos no atual estado das coisas.
A teimosia de Telê é famosa. Quanto de influência teve nas derrotas de 82 e 86? Bom tema para uma pesquisa mais aprofundada. Volto a esse assunto em breve.
Carlos Henrique Raposo foi um jogador brasileiro que atuou por diversos clubes brasileiros e do exterior. Ganhou o apelido “Kaiser” devido à semelhança com o alemão Franz Beckenbauer.
Em 2011, o programa “Esporte Espetacular”, da Rede Globo, exibiu uma matéria que contava com detalhes como ele por mais de 20 anos conseguiu ludibriar diversos clubes brasileiros (Botafogo, Flamengo, Bangu, Fluminense, Vasco da Gama, America) e do exterior (Puebla do México, Independiente da Argentina – há controvérsias a respeito -, El Paso dos EUA e Gazélec Ajaccio da França), fazendo parte de seus elencos, mesmo sem praticamente ter disputado partidas oficiais. Entre seus supostos feitos notáveis, Kaiser alegou ter sido campeão Mundial Interclubes pelo Independiente em 1984, fato negado pela diretoria do clube argentino. Por este fato, Carlos ganhou a alcunha de “Forrest Gump” do Futebol Brasileiro. O rei do caô.
Após aposentar-se(?) da carreira profissional no futebol, Carlos tornou-se personal trainer.
Confira também o incrível programa “Provocações” com Antonio Abujamra entrevistando o atleta 342.
Popularizado a partir de 1981 com a chegada da MTV (Music Television), o videoclipe foi a grande mola propulsora do mercado da música mundial durante décadas, ainda com muita força nos tempos atuais. E algumas bandas famosas do rock e do pop nacional e internacional não deixaram de homenagear o futebol em suas produções artísticas, seja em imagens, versos ou melodias. Confira alguns exemplos.
1) “(Keep feeling) Fascination”, The Human League, 1983:
No fim de semana passado, dois pontos me chamaram a atenção nas disputas regionais do futebol brasileiro, em seus dois principais centros.
1
No clássico disputado no Rio de Janeiro, na cidade de Volta Redonda, o Botafogo venceu o Fluminense por 1 a 0, classificando-se para a final do Carioca 2016, diante de apenas 5.182 torcedores presentes, dos quais 3.562 foram pagantes.
Cerca de 31% do público foi beneficiado pelas leis de gratuidade – se elas não existissem, o resultado do comparecimento talvez fosse ainda mais catastrófico.
Trata-se do mais antigo clássico do futebol brasileiro.
Foram disponibilizados 14.933 ingressos para a decisão da vaga. Cerca de 35% dos ingressos foram utilizados, somando-se os pagos e as gratuidades. O Raulino de Oliveira teve sua capacidade ociosa em 65% ao receber o confronto.
Domingo, 19 horas, fora da capital, crise etc.
Em 2010, a população de Volta Redonda era estimada em 257.686 habitantes. Supondo que 10% dela tivesse interesse por futebol, um número muito modesto, algo como 26.000 pessoas.
É possível supor que o grosso do público presente à decisão no Clássico Vovô seja composto por torcedores cariocas que se deslocaram do Rio de Janeiro até Volta Redonda, em caravanas organizadas. Porque o público local está totalmente alheio à frequência no estádio. Basta ver os números e a frequência histórica no Raulino.
Em 2013, há três anos, na decisão da Taça Rio que também valia vaga para a final do campeonato, Fluminense e Botafogo levaram ao Estádio da Cidadania 12.485 torcedores pagantes e 15. 516 torcedores presentes.
Comparando-se a totalização dos presentes em 2016 contra 2013, queda de 67%.
Futebol virou minissérie de TV. E pouca gente atentou para a gravidade dessa situação.
2
Em São Paulo, o Santos bateu o Palmeiras nos pênaltis e se classificou para a decisão do Paulistão 2016.
Em jogo de torcida única, com a chancela do Estado na declaração de incompetência para combater a violência, o Peixe atuou diante de 13.690 torcedores pagantes.
Mais do que o dobro do público presente à disputa de Fluminense e Botafogo, mas muito pouco para um clássico.
Entende-se que há uma limitação em função dos lugares disponíveis na Vila Belmiro, sem dúvida, além do direito natural do Santos como mandante da partida, tendo em vista a classificação no Paulistão.
Os dois casos fazem pensar.
Quatro dos times mais expressivos do futebol brasileiro jogando para plateias modestas nas arquibancadas, ainda que por motivos diferentes.
O futebol perde sua magia e passa a ser um mero produto de grade de TV. A novela que, se perdermos um capítulo, não muda muito.
Em Santos, um caso normal: o Peixe disputará a final contra o Audax na Vila Belmiro.
No Rio de Janeiro a final será disputada no Maracanã entre Vasco e Botafogo, com TV aberta. Com muita sorte, os dois jogos somados terão 100 mil torcedores presentes.
Há quem diga que o futebol mudou, o jeito de acompanhá-lo mudou e é claro que tudo isso deve ser avaliado. Mas o esporte precisa de coração, de sentimento, de chama, e isso não será pavimentado no futuro com relações distantes, sem presença ao lado da equipe.
Os chamados times grandes aos poucos perdem seu principal ativo: o torcedor presente. E as crianças cada vez mais vestem as camisas do Barcelona, do PSG, do Real Madrid e de outros times europeus porque veem estes times durante a semana, à tarde, em horários adequados aos torcedores mirins.
Alguém vai dizer que Vasco e Flamengo tiveram lotação máxima na outra semifinal do Carioca 2016, disputada no calor equatorial às quatro da tarde em Manaus. É uma outra discussão. Outra demais.
A final do Campeonato Alagoano de 2016 acontece em dois jogos, disputados nos próximos dois domingos. CSA e CRB farão uma decisão toda especial, não apenas por se tratar de um “Clássico das Multidões”, mas por ser um clássico que completa 100 anos em 2016.
O primeiro confronto aconteceu em 1916, com vitória do CSA por 1 a 0 sobre o CRB. Desde então, as equipes se enfrentaram 504 vezes, com 190 vitórias e 616 gols do CRB, que tem grande vantagem sobre o rival com 152 vitórias e 623 gols. Além disso, aconteceram 162 empates.
O CRB é o atual campeão e tem 28 títulos estaduais, enquanto o CSA é o maior vencedor da competição com 38 títulos.
O CRB é o único clube alagoano a conquistar um título regional (Copa do Nordeste 1975). É também o único a ganhar um título interestadual disputado contra os times paraibanos, que concedeu acesso para segunda divisão do campeonato brasileiro. O CRB é o segundo clube mais velho do Estado, sendo pioneiro no Estado no tocante às participações nas series A (1972) e B (1971) do Campeonato Brasileiro, também sendo o primeiro a vencer um campeonato alagoano em 1927 e a ganhar títulos regionais. O CRB foi o primeiro clube de Alagoas a construir estadio particular, e o primeiro campeão no estádio Rei Pelé. Chegou a final da serie C em 2011 e foi vice campeão da Copa do Nordeste em 1994.
O CSA é o único time de Alagoas a disputar um torneio internacional, a conhecida Copa Conmebol de 1999, em sua ultima edição, organizada pela Confederacão Sulamericana de Futebol. O campeão foi o Talleres (Argentina), que na final venceu a própria equipe alagoana.
O maior confronto do futebol alagoano rendeu um documentário intitulado “Futebol na Terra da Rasteira” (2013), dirigido por Thalles Gomes.
Numa crônica escrita em 1921, o escritor alagoano Graciliano Ramos sentenciou: “O futebol não pega, tenham a certeza. Desenvolvam os músculos, rapazes, ganhem força, desempenem a coluna vertebral. A rasteira! Este, sim, é o esporte nacional por excelência. Dediquem-se à rasteira, rapazes!”
O documentário FUTEBOL NA TERRA DA RASTEIRA tenta entender como, contrariando todas as expectativas, o futebol pegou em terras caetés. Através do relato de ex-jogadores que marcaram a história da centenária rivalidade entre CRB e CSA, o filme traça um panorama geral da relação permeada de alegrias e tristezas entre o futebol e a cidade de Maceió.
Na contramão da febre full hd, o curta-metragem foi todo finalizado em VHS. Dirigido por Thalles Gomes e produzido pela Subvídeos Produções, o curta-metragem foi um dos vencedores do Premio Guilherme Rogato da Prefeitura de Maceió. Na escalação do documentário estão os ex-jogadores Silva Cão, Paranhos, Joãzinho Paulista, Catanha, Jorge Siri, Peu, Jerônimo, Felipão e muitos outros. Sem contar a narração de Márcio Canuto e a trilha sonora do Wado.
Colaboração: Subvídeos Produções e Minuto Esportes.
O CINEFOOT, único festival de cinema de futebol do Brasil e pioneiro na América Latina, anuncia a sua relação de convocados para as mostras competitivas da sua sétima edição no Rio de Janeiro. São 23 filmes na disputa pela Taça Cinefoot 2016.
O CINEFOOT será realizado de 19 a 24 de maio no Espaço Itaú de Cinema Praia de Botafogo, Ponto Cine e Cine Joia (Jacarepaguá e Caetés), o mais novo cinema a integrar o circuito.
De 31 de maio a 4 de junho, está programada a já tradicional “Prorrogação Cinefoot“ no CCJF – Centro Cultural Justiça Federal, Cine Teatro Eduardo Coutinho e Cinemaison.
A badalada classificação do time do Audax à final do Paulistão 2016 causa entusiasmo aos fãs de futebol, devido ao bom desempenho técnico do time. Em outras ocasiões, outros times de menor investimento já chegaram a momentos decisivos de campeonatos regionais e até nacionais, com pleno êxito. Relembre aqui alguns momentos.
Operário-MS x São Paulo – Semifinal do Campeonato Brasileiro de 1977 (1º jogo)
Palmeiras x Internacional de Limeira – Final do Campeonato Paulista de 1986 (2º jogo)
Bragantino x Novorizontino – Final do Campeonato Paulista de 1990 (2º jogo)
Grêmio x Criciúma – Final da Copa do Brasil de 1991 (1º jogo)
Botafogo x Juventude – Final da Copa do Brasil de 1999 (2º jogo)
Flamengo x Santo André – Final da Copa do Brasil de 2004 (2º jogo)
São Caetano x Santos – Final do Campeonato Paulista de 2004 (2º jogo)
Fluminense x Paulista – Final da Copa do Brasil de 2005 (2º jogo)
Botafogo x Madureira – Final do Campeonato Carioca de 2006 (2º jogo)
Santos x Ituano – Final do Campeonato Paulista de 2014 (2º jogo)
Mauro Shampoo, figura emblemática do não menos emblemático time do Íbis, foi meio-campista, camisa 10 e o maior ídolo do time pernambucano, que defendeu entre as décadas de 1980 e 1990, tendo marcado um gol, em paralelo à sua profissão de cabeleireiro.
Carismático e folclórico, Shampoo é o protagonista desse divertido curta-metragem, de Paulo Henrique Fontenele e Leonardo Cunha Lima.
No sábado passado, 16/04, o PANORAMA DO FUTEBOL registrou cenas de mais uma rodada do Campeonato Carioca de Futebol de Praia, na modalidade 11.
Imagens dos jogos Bairro Peixoto x São Clemente (aspirantes) e Juventus x Copaleme (aspirantes e amadores) – este, com destaque para a homenagem aos 60 anos do clássico, realizada antes da partida de fundo. E mais um trecho de “Craques da areia”, com o depoimento de Marcelo Bueno, tricampeão mundial pela Seleção Brasileira de Beach Soccer.
O PANORAMA apoia e defende a ampla estruturação do futebol de praia em investimentos e divulgação; um dos esportes mais tradicionais do Rio de Janeiro, posteriormente espalhado pelo Brasil e pelo mundo, merece mais atenção dos cariocas.
Rebaixado ontem pela terceira vez à série B do Campeonato Carioca em menos de dez anos, o America infelizmente deixa dúvidas quanto ao seu futuro.
Segundo time de considerável parcela dos torcedores cariocas, com uma bela história, aos poucos, o importante clube foi dando passos rumo ao ostracismo a partir dos anos 1980. Bem verdade que o alijamento à caneta do campeonato brasileiro de 1987 contou muito neste sentido, mas não foi o único fator. As sucessivas diásporas com a mudança dos campos, a falta de verba, as dívidas e o descaso ajudam a explicar o processo.
A decomposição foi avançando, a torcida fanática foi encolhendo de tamenho e um dos orgulhos da cidade foi ficando de lado.
Que o America pode voltar ao cenário local da primeira divisão estadual, é fato.
Resta saber se, um dia, ele poderá retomar sua posição de grande clube do futebol brasileiro e símbolo do Rio de Janeiro.
Num domingo tão deprimente para o país, a terceira queda do simpático Diabo parece infelizmente fazer sentido.
Fica a torcida para que a recuperação aconteça, por mais difícil que seja.
No sábado passado, 09/04, o PANORAMA DO FUTEBOL registrou imagens dos jogos entre o Força e Saúde e o São Clemente, nas categorias Aspirante e Amador, válidos pela segunda rodada do Campeonato Carioca de Futebol de Praia 2016.
Num cenário belíssimo, dos maiores cartões postais do mundo – a praia de Botafogo tendo o Pão de Açúcar e a Urca ao fundo.
Nos Aspirantes, empate em 1 a 1. Nos Amadores, o Força venceu por 2 a 0.
O futebol de praia é uma das grandes expressões do esporte litorâneo no Brasil, sendo praticado há décadas (desde os anos 1950) e tendo como berço a praia de Copacabana, tendo fornecido vários craques para os gramados, como o goleiro Renato (Atlético Mineiro, Seleção Brasileira de 1974, Flamengo, Fluminense e Bahia), o zagueiro Edinho (Fluminense e Seleção Brasileira 1978-1982-1986), o lateral Júnior (Flamengo e Seleção Brasileira 1982-1986), o meia Paulo Cézar Caju (Campeão mundial em 1970, Copa de 1974 e diversos grandes clubes), dentre muitos outros.
Precisa ser valorizado à altura tanto em termos midiáticos quanto de estrutura.
Em maio de 1985, a revista Placar noticiava o primeiro patrocínio individual do futebol brasileiro, conferido ao atleta Cezar Saccol, jogando no time do Internacional de Santa Maria, feito pela Coca-Cola na manga de sua camisa.
Operário, de Campo Grande, e Vasco, disputam uma partida importante no Estádio Pedro Pedrossian, vulgo Morenão, na capital do Mato Grosso do Sul. Estádio lotado. Só mais uma de milhares partidas dos intermináveis campeonatos nacionais dos anos 70 e 80.
Mas um fato marcou o jogo. O estádio teria sido sobrevoado por um OVNI, fato testemunhado por milhares de pessoas, dentro e fora do estádio. Entre os presentes, vários jogadores de seleção brasileira. No time do Operário, começando a carreira, um certo Cocada, que conta nos vídeos abaixo o que viu. No Vasco, as declarações são dadas incrivelmente por… Rondinelli, que pouca gente lembra, mas atuou pelo Vasco em 1982.
Eu me lembrava desse fato e fui fazer a pesquisa, que me levou a estes vídeos abaixo. Descobri o documentário “O que era aquilo” que parece ser sobre o jogo em questão e a aparição do OVNI. Na verdade, aparentemente, o jogo foi só um gancho. O documentário acaba sendo sobre a destruição do futebol do Comercial e do Operário, este último time de muito sucesso nos anos 70, chegando a disputar a semifinal do campeonato brasileiro de 1977, perdendo para o depois campeão São Paulo. No gol, Manga. A derrota por 3 a 0 na 1a perna da semifinal, em São Paulo, é até hoje contestada pelos torcedores do Operário. Uma mariola pra quem adivinhar o juiz…
O documentário tem uma hora de duração e pode ser visto pelo link abaixo. Recomendo. Sugiro especial atenção para a senhora torcedora apaixonada do Operário e para as desatrosas intervenções do Editor do Globo Esporte, em trechos mais para o final do filme.
Domingo de manhã, comecei a zapear os canais e então bati os olhos no futebol. O velho Guarani de guerra na briga da Segundona em São Paulo, numa decisão contra o Barretos – este, com seu uniforme de cores bolivianas que me remeteu ao Sampaio Correa.
Qualquer garoto em 1978 sabia a seguinte escalação: Neneca, Mauro, Gomes, Édson e Miranda; Zé Carlos, Renato e Zenon; Capitão, Careca e Bozó. Um timaço que bateu o Palmeiras naquele ano e se tornou o único campeão brasileiro do interior ao lado do Santos.
No ano de 1979, veio a Libertadores e os dois times alviverdes fizeram seus jogos da primeira fase contra os peruanos Alianza e Universitario de Lima. Partidas nas manhãs de domingo. Para mim, uma boa lembrança da juventude: volta e meia meu pai me dava dinheiro para comprar lasanha pronta num restaurante de Copacabana, a trattoria Torna, que ficava na rua Anita Garibaldi. Depois dos jogos, a deliciosa refeição tinha um sabor ainda mais acentuado, principalmente se depois a boa pedida fosse um jogo no Maracanã. O Bugre passou fácil pela primeira fase, com goleadas sobre o Palmeiras e o Universitario, vindo a cair nas semifinais (dois triangulares, onde os primeiros decidiam o título) e terminando em quarto lugar na maior competição de futebol da América.
O querido Guarani que depois seria semifinalista do Brasileiro em 1982 e vice-campeão em 1986. Pensem em nomes como Neto, Evair, Amoroso, Luizão e Edílson Capelinha: todos foram revelados no Brinco de Ouro da Princesa.
O tempo passou, o dinheiro acabou, as dívidas se acumularam, o estádio foi a leilão. Na Segundona também estavam – ou estão – a Portuguesa, o Marília, o Bragantino, o Juventus, próceres da gênese do futebol paulista.
O Barretos foi melhor e fez seus gols no segundo tempo. O resultado tirou o Guarani da fase final, onde serão decididas as vagas de acesso. Mais um ano de agonia, mais um domingo de tristeza, agravado por ser o dia seguinte ao aniversário de 105 anos do clube campineiro.
Penso naquela saborosa lasanha de 37 anos atrás. A mesada do meu pai. Zé Carlos, Renato e Zenon.
Outro dia mesmo, o Guarani era dos maiores; agora, suas chagas são carne viva.
O Brinco de Ouro da Princesa continua bonito, apesar de tudo. Mas tudo isso me remete aos sinais claros da decadência do nosso futebol.
O lugar do Bugre é em cima – ou, ao menos, deveria ser.
Tanto quanto carece de ídolos e craques em campo, o futebol precisa de personagens fora dele, sejam jornalistas ou técnicos. Com passagens em todos os clubes do Rio, Joel Santana é uma das poucas pessoas benquistas em todos os quatro grandes. E, como já se sabe, uma figuraça ímpar.
Morador de Copacabana, era fácil vê-lo semanalmente na Missa do Padre Zé Roberto, na Paróquia da Ressurreição, na Francisco Otaviano. Beque aposentado, seu quase metro e noventa se destacava uns 20 centímetros acima das velhinhas que o cercavam na Igreja. Sempre de óculos escuros. Figuraça.
Mas a história que conto não vem da Igreja do Posto Seis, mas da outra ponta da praia de Copacabana.
Também não é dessa entrevista eterna e clássica não.
Num fim de noite, em Copacabana, estava com minha mulher e uma amiga no Cervantes, boteco super tradicional especializado em sanduíches e chopp daqui do Rio. Lá pelas tantas, irrompe no recinto a figura. Sozinho, sentou-se de frente pra mim. O garçom veio, a conversa demorou um pouco além da conta. Joel apontava pra cima.
A única decoração do salão do cervantes era uma prateleira perto do teto, em toda a sua volta, quase uma sanca, onde jaziam em pé garrafas de vinho tinto barato. Sabe aquelas garrafas engorduradas, imundas, que não vêem um pano sequer há anos? Pois é.
O garçom se afastou e, minutos depois, voltou com uma escada. Eu tinha entendido certo. Joel havia pedido pra beber uma das garrafas da decoração da sala. Na época, não existiam essas mini adeguinhas. O garçom subiu e pegou uma por cima de uma mesa na qual não havia clientes. Na mesa, já preparado, um balde de gelo, saca-rolhas, taça e o indefectível pano de prato aguardavam o vinho. O garçom limpou a garrafa imunda com o pano, abriu-a e serviu um pouco do vinho na taça de Joel.
O vinho estava quase marrom. Âmbar, uma cor próxima de um doce de leite, rapadura. Aquilo estava cozido. Visivelmente estragado.
Joel cheirou, provou… e pra minha surpresa, gostou! O garçom completou a taça, deitou o vinho podre no balde de gelo e deixou Joel, solitário, degustando seu vinho.
Saímos de lá antes da garrafa acabar, infelizmente. Queria ter ficado para ver o que viria depois, mas minha mulher e a amiga não entenderam o momento sensacional que eu estava testemunhando. De qualquer maneira, já tinha a história pra contar.
Tomara que Joel volte logo à ativa. O futebol precisa de suas tiradas.
Como pode um estádio de Copa do Mundo, um dos três mais importantes do país, estar há 20 dias sem manutenção do gramado, sabendo que abrigaria o maior clássico do Rio de Janeiro?
Como pode um clássico da grandeza de Flamengo x Vasco ser realizado em uma quarta-feira à noite?
Como pode os dois melhores jogadores em campo serem estrangeiros?
Como pode Guerrero ser a estrela maior de uma nação?
Como pode Martin Silva ser reserva na seleção do Uruguai?
Como pode num jogo de tamanha tradição no cenário nacional faltar tanta inspiração e sobrar transpiração?
Ao menos na quarta, de volta à medíocre realidade do futebol brasileiro, sobrou transpiração. Porque, ainda sob os efeitos do clássico, continuamos a ver camisas solitárias, chuteiras sedentárias e cabeças milionárias. O único a enxergar diferente disso foi o nosso comandante. Mas se todos nós não estamos certos, ao menos nos resta entender o célebre Nelson Rodrigues com sua unanimidade burra.
Do Flamengo, ressalto novamente a transpiração. Pode ser que o ano tenha começado, pode ser pelo fim do cansaço, medo da torcida ou porque o adversário era o Vasco.
Ainda diria que o Rubro-Negro esteve mais de perto de vencer e pôr fim à incômoda série de insucessos diante do rival, mas esbarrou na ótima atuação do goleiro Martín Silva, que salvou o Cruz-Maltino algumas vezes na partida. Também para pôr fim à crise instalada e conseguir se manter na briga pela classificação, só resta ao Flamengo vencer o Botafogo no sábado. O gol já voltou, mas as vitórias… aguardem as cenas dos próximos capítulos…
O Vasco não jogou bem, tentou controlar o jogo e explorar os contra-ataques; foi punido pela sua postura em campo mas logo se redimiu, manteve a liderança e a invencibilidade no campeonato.
Talvez um dia fosse difícil jogar contra o Paraguai. Mas nunca achei que fosse tanto.
Até o fim dos anos 70, nunca havíamos perdido para eles lá. Porém dos anos 2000 para cá, nunca mais tivemos o sabor da vitória em solo guarani.
Desde 2009, não ganhamos deles onde quer que seja o local de jogo. Também não perdemos. Se você vê alguma vantagem nisso, precisa rever seus conceitos.
A Seleção Brasileira, margeada pelo futebol nativo, está claramente em uma péssima safra. E não é de hoje. Desde o apito final da Copa de 2002, uma era se encerrou. Se você não consegue ver isso, insisto, precisa rever seus conceitos.
De lá para cá, quem vê futebol todos os dias sabe que a desordem total ficou evidente.
Craques em final de carreira se arrastando em campo, recordes pessoais acima dos anseios da nação e muito mais. E o que essa bagunça gerou?
Vamos aos fatos.
Planejamento
O futebol brasileiro e consequentemente a Seleção não se entendem. Não há planos sérios para o futuro e os dirigentes contam com os jargões de sempre como “Ah, na hora H os craques resolvem”.
Craques? Caem eles do céu? Oba! Hoje fui na maternidade lá em Três Corações e tive uma grande notícia: -“Nasceu outro Pelé!”
Não, não nasceu outro Pelé. Edson só foi Pelé porque Gerson foi Gerson, Garrincha foi Garrincha e tantos outros foram… coletivo.
E o que temos para hoje? Vou citar aqui os nomes convocados e mais dois possíveis substitutos. Quero provar que, por mais divergências sadias que tenhamos, vamos acabar no lugar comum. Quer apostar?
Preste bem atenção na convocação para os dois últimos jogos e, em negrito, o complemento de possíveis substitutos:
GOLEIROS
Alisson (Internacional)
Marcelo Grohe (Grêmio)
Diego Alves (Valencia)
Jeferson (Botafogo), Victor (Atlético-MG), Fábio (Cruzeiro), Cassio (Corinthians), Cavalieri( Fluminense)
ZAGUEIROS
David Luiz (PSG)
Miranda (Inter de Milão)
Marquinhos (PSG)
Gil (Shandong Luneng)
Thiago Silva (PSG), Felipe (Corinthians), Alex (Milan), Luisão (Benfica)
LATERAIS
Danilo (Real Madrid)
Daniel Alves (Barcelona)
Filipe Luis (Atlético de Madrid)
Alex Sandro (Juventus)
Marcelo (Real Madrid), Marcos Rocha (Atlético MG)
VOLANTES
Luiz Gustavo (Wolfsburg)
Fernandinho (Manchester City)
Renato Augusto (Beijing Guoan)
Elias (Corinthians), Hernanes (Juventus), Ramires(Jiangsu)
MEIA-ATACANTES
Philippe Coutinho (Liverpool)
Oscar (Chelsea)
Lucas Lima (Santos)
Willian (Chelsea)
Kaká (Orlando City)
Douglas Costa (Bayern de Munique)
Nenê (Vasco), Lucas (PSG), Ganso (São Paulo)
ATACANTES
Neymar (Barcelona)
Hulk (Zenit)
Ricardo Oliveira (Santos)
Jonas (Benfica), Pato (Chelsea), Fred (Fluminense)
E aí? Discorda de algum desses nomes?
Desafio você leitor a tirar um nome mágico da cartola que vá revolucionar as quatro linhas.
Qualquer dos nomes citados, mais uns três ou quatro que possam surgir, refletem e reforçam a unanimidade seguinte : o único craque que temos chama-se Neymar.
Mas esses que estão aí, são tão ruins assim? Não mesmo.
São todos de bons para ótimos jogadores. Quase a totalidade joga nos grandes clubes do mundo e são titulares de suas equipes. Mas o que acontece?
Em suas equipes eles são parte da engrenagem, estruturada de modo a também funcionar sem eles.
Uma vez, antes da copa de 2014, Carlos Alberto Torres cravou: “-Essa seleção terá amadurecido e provavelmente estará pronta para 2018 e 2022”. O Capita não terá errado.
E estar pronta não significa apenas se classificar para a Copa. Para tal feito é necessário mais do que isso.
Se a técnica não nos permite alcançar algo mais, não é no grito e na base da cara feia que iremos separar os homens dos meninos.
Temos que planejar, organizar e vislumbrar algo mais moderno para que possamos extrair o melhor dos que aí estão.
Ao menos temos que tentar. Mas para que isso aconteça, é necessariamente urgente que se reconheça abertamente, a safra é ruim.
As seleções que se destacam hoje no mundo tem um coletivo muito acima da média, com um individual que colocam no bolso qualquer suposto “craque”brasileiro. E esse, definitivamente não é o caso de Uruguai e principalmente do Paraguai.
Voltando ao Paraguai de hoje, talvez se houvesse um Gamarra na zaga, ou um Chilavert no gol e o time vermelho, branco e azul poderia ter tido melhor sorte. Já que não havia, sorte nossa….ou….sorte de Dunga, que deverá sobreviver mais algum tempo sem nada de bom agregar. Tempo e vai se esvaindo pelas mãos ao passo que o “país do futebol” continua a merecer esse tão singela homenagem, mais pelo seu povo aguerrido e sempre com um fio de esperança do que pela prática do esporte Bretão.
E aí? Você precisa rever seus conceitos? Volte no tempo e reveja o futebol de 2002 até os dias de hoje.
Se não precisa rever, é porque já tomou uma boa dose de resiliência, e para o período atual, melhor remédio não há.
Resiliência é a capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças.
Domingo à tarde, Vasco e Botafogo, os dois líderes e melhores times do Campeonato Carioca, disputavam, em São Januário, um jogo que tinha tudo para ser bem interessante – como foi. Mas não para o torcedor. Oito mil testemunhas presenciaram o cotejo. As sociais vazias são mais um alerta de que as coisas vão mal, obrigado, no mundo do futebol. E este não é um fenômeno brasileiro. Há exceções – Inglaterra e Alemanha – mas é muito comum ver campos às moscas mundo afora em praças importantes como Itália e Espanha.
Mais que campos vazios, há um desinteresse crescente pelo esporte na TV também. Domingo, assisti sozinho o jogo no bar de um clube. Durante o segundo tempo, apenas dois cidadãos vieram ver o que passava na televisão. O clube estava cheio. Ninguém deu bola pro jogo.
Até 1994, a Formula 1 era uma das paxões do brasileiro. As pessoas não saíam de casa. Tinham de ver a corrida do Senna. Naquele fatídico primeiro de maio, essa paixão virou tristeza. Mas se engana quem pensa que foi a morte do ídolo que transformou a F1 nesse espetáculo insuportável de hoje. A derrocada começou com um super-carro da Ferrari, que pulverizou os demais, ganhando todas as corridas do ano. Somou-se a isso uma escolha catastrófica de regulamento dos carros, transformando as corridas numa enfadonha procissão. Lembro-me de Galvão Bueno vibrando com trocas de pneus. As únicas ultrapassagens se davam nos boxes.
Em suma, o que a Formula 1 tinha de melhor – equilíbrio, cracaços no volante -, desapareceu. Em vez de três ou quatro carros brigando por vitória, sete ou oito pilotos, um alemão Dick Vigarista desfilando sua arrogância e passeando sem ameaças.
O equilíbrio e a emoção desapareceram. Com isso, claro, o público despencou. Patrocínios também.
O exemplo está ai. O futebol segue a passos largos o mesmo caminho de desequilíbrio. É a famosa espanholização. Tomara que não seja tarde demais.
16-06-2006, DUITSLAND. JOHAN CRUIJFF. FOTO BAS CZERWINSKI[/caption]
Johan Cruyff e Rinus Michels, um dentro e outro fora de campo, formaram uma dupla que ajudou a revolucionar o futebol a partir dos anos 70. As ideias e a forma de jogar refletiram no que aconteceu a partir da união dos dois no Ajax, no Barcelona e, principalmente, na Laranja Mecânica da Copa de 1974.
Para muitos, a influência foi positiva, principalmente para os países vizinhos. Até então, percebia-se um forte investimento europeu no futebol-força para concorrer com a técnica latina, com destaque para os sul-americanos. O surgimento do futebol-total de Michels, que era a convergência das diversas características do futebol praticado na Europa, com a técnica de Cruyff, despertou o mundo para algo que parecia impossível: futebol com ciência e técnica, ou seja, preparo físico e tático com qualidade técnica. Hoje, podemos perceber equipes, seleções e jogadores que assimilaram e desfilam esses conceitos.
Disse anteriormente que muitos adquiriram essas influências e cresceram, no entanto, teve quem não compreendeu o que estava presenciando e fez da Copa de 1974 o divisor de águas. A derrota para a Holanda e, posteriormente, para a Polônia, que não tinha a qualidade da Holanda, mas jogava em alta velocidade, levou o Brasil a um entendimento equivocado. Sob a justificativa de que precisávamos de mais competitividade para não sermos engolidos novamente, era necessário desenvolver um jogador mais bem preparado fisicamente, mais educado taticamente e com mais preocupações defensivas. A partir daí, foi dada a largada para a nossa decadência técnica. Em nome de um “futebol consistente” descambamos para menos craques e mais volantes, menos dribles e mais bola aérea, menos toques e mais chutões, menos gols e mais faltas. E os novos paradigmas inundaram as categorias de base. Tudo ficou contaminado.
Ao contrário dos outros centros do futebol, a técnica passou a ser vista por aqui, digo, pelos treinadores, até como sinal de irresponsabilidade. Garrincha não ficaria cinco minutos numa peneira qualquer. Talvez, o auge desse declínio técnico, pelo menos para fins didáticos e midiáticos, tenha sido a Seleção de Lazaroni. Tanto é que, após a Copa de 90, decretou-se o estágio do nosso futebol de Era Dunga. O volante, que não era um craque, mas também não era nenhum cabeça-de-bagre, pagou o pato, afinal, na nossa sociedade maniqueísta, alguém tem que assumir a responsabilidade pelas tragédias.
Desde então, tivemos suspiros, por exemplo, a Seleção de Telê Santana. Os 7×1 representam bem o contraste que o Carrossel Holandês ajudou a criar: de um lado, um time com diversas características do legado que Michels e Cruyff deixaram e, do outro, o exemplo acabado do erro de interpretação desse mesmo legado.
Para onde vamos? Infelizmente, Dunga está mais preocupado em vencer suas quedas de braço com a lógica do que, efetivamente, iniciar uma nova era no futebol brasileiro.
Para os mais jovens, é importante dizer que a trajetória insossa de Dunga como treinador de futebol é distinta, ao menos em boa parte, de sua vida como jogador.
Volante de bons recursos técnicos, capaz de acertar passes longos, dotado de um chute forte e uma garra infinita em campo, não foi campeão do mundo à toa.
Contra si, teve o injusto linchamento midiático (para variar…) na Copa de 1990. A precoce eliminação diante da Argentina do genial Maradona levou a grande imprensa a culpar Dunga por tudo de ruim que aconteceu numa Seleção conturbadíssima. Um ano antes, depois de uma crise, o Brasil tinha ganho a Copa América depois de quatro décadas de espera. A expressão “Era Dunga” foi puro e cruel reducionismo, o que talvez ajude a explicar certa rispidez do treinador em entrevistas, alimentada por rancores do passado.
Já o profissional à beira das quatro linhas deixa a desejar. Sempre desejou. Remake da experiência realizada com Falcão depois daquela mesma Copa da Itália, Dunga chegou à condição de treinador da Seleção Brasileira sem qualquer experiência em clubes. Os dois casos foram inspirados em Franz Beckembauer, o cracaço vitorioso à frente da Alemanha campeã mundial em 1990. Um detalhe: o Kaiser levou anos a fio em cursos de preparação para o ofício de treinador, o que naturalmente não aconteceu com a dupla brasileira. Depois de muitos anos como comentarista, Falcão trabalhou no Bahia e tem feito uma boa jornada no Sport.
As empolgantes estatísticas que se firmaram com a inesperada conquista da Copa América de 2007, mais as vitórias nos amistosos que vão do nada a lugar nenhum deram-lhe um enganoso estofo triunfante. Na hora H, na África do Sul, o que se viu foi uma Seleção destrambelhada, convocada à base de caprichos pessoais e teimosias, que encerrou seu caminho diante de uma pavorosa partida contra a Holanda, na derrota de virada por 2 a 1. A imagem de Dunga com olhar atônito para seu banco de reservas durante aquele jogo é uma página eterna dos maus momentos do futebol brasileiro. Mas justiça seja feita: a arrogância sem limites do medíocre treinador foi também inflada pela eterna opressão da Rede Globo, contrariada em seus interesses comerciais – e qualquer semelhança com os tempos atuais será mera coincidência.
Daquele fracasso até 2014, foram quatro anos de limbo com uma apagada passagem pelo comando do Internacional e só. O que não deu certo em 2010 virou a promessa de dias melhores depois dos 7 a 1, numa CBF cheia de cartolas em cana ou à beira dela. Nada mudou. Dunga não evoluiu. Pouco trabalhou na função. Ao menos, reapareceu mais “humilde” em entrevistas coletivas. De resto, o que se vê é o contestável neymarbol e a insistência permanente na exclusão/rejeição de nomes como Thiago Silva e Marcelo, por exemplo, para a teimosia atroz na escalação de nomes como o de David Luiz – co-responsável por pelo menos 4 daqueles malditos 7 da Alemanha, no desastre do Mineirão.
A Seleção vive um momento complicado, reflexo de tudo que cerca o futebol brasileiro atual, muito visível ontem depois de ser completamente dominada pelo mediano escrete uruguaio. Sua grande história pode até empurrá-la a mais uma classificação em Mundiais, até mesmo numa desagradável repescagem. Mas hoje, pontualmente hoje, estamos em risco para 2018. E mesmo que ele seja superado, para o que todos torcemos muito, será difícil imaginar um Brasil hexacampeão, ainda mais demonstrando aquilo que foi sua maior marca do passado: um grande futebol.
O Dunga das quatro linhas é infinitamente superior ao da beira delas. Se o caso era trazer um treinador de força, líder incontestável, que tivesse a personalidade parecida com a do atual comandante, Leão teria sido um nome com mais estofo, currículo e resultados, mesmo tendo sido rifado da Seleção em 2001. Se a questão priorizasse o talento, Muricy e Tite seriam opções muito mais consistentes e relevantes.
O que não tem remédio, remediado está. Terça-feira tem mais.
Ontem à noite, eu estava com meus amigos Fagner Torres, Paulo Tibúrcio, Nelson Borges e Leo Prazeres na Casa Vieira Souto, coração do centro do Rio. Vimos os jogos do Fluminense e do Flamengo pela Primeira Liga. Teve de tudo: grandes risos, acepipes, a bela Gabrielle nos atendendo, tudo de bom. E muita conversa sobre política, arte e futebol.
Em dado momento, falamos das listas que os grandes jogadores costumam fazer com seus craques preferidos. Claro, discordamos muito. Num dado momento, vociferei pela defesa de Pelé, considerando inaceitável qualquer rol de craques da bola que não inclua seu nome no topo.
Em algum momento, lembramos da devastadora Holanda de 1974. O Carrossel Holandês. A Laranja Mecânica. Um monte de craques loucos (dentro e fora de campo) que atacavam, defendiam e trocavam de posição, a ponto de consagrarem a tática do impedimento – só eles fizeram isso com perfeição absoluta, o que requer talento, destreza e principalmente inteligência. Naqueles tempos, as camisas indicavam quem jogava onde: o 2 era lateral direito, o 11 era ponta esquerda, o 9 era centroavante. Na Holanda, não.
E no meio daquelas feras, o grande lider era Johan Cruyff. Uma das feras da minha infância.
Eu e Fagner vibrando com jogadores fantásticos que, um dia, deram um nó na nossa seleção tricampeã mundial. Os opacos diriam que a Holanda não ganhou nada. E precisava?
Poucas horas depois de uma grande mesa de bar da nossa turma, acabei de saber que Cruyff faleceu. É o caminho inevitável para a morte, percorrido diariamente nessa estranha Terra em que vivemos.
A Holanda dos anos 1970 era reflexo direto do time do Ajax, da genialidade de Rinus Michels, de gigantes como o goleiro Jongbloed (que jogava sem luvas), o zagueiro Rudi Krol, o fantástico Neeskens. Tome Rensenbrink, os irmãos Van Der Kherkof, Suurbier, Rep e mais uma tonelada de gente que abriu caminho para as novas gerações – Gullit, Van Basten, Rijkaard, Bergkamp e tantos outros.
Os garotos de hoje precisam ver a Holanda de Cruyff no YouTube. É o único jeito de entender como nasceu o Barcelona de hoje – onde o craque jogou e posteriormente foi treinador -, e o que foi um pouco do Brasil de 1958, 1962 e 1970. Ou ainda a espetacular Hungria de 1954 – também não campeã, também maravilhosa. Todos estes caminhos deságuam naqueles loucos geniais de um timaço que disputou duas finais de Copa do Mundo, não foi campeão e nem precisou para ser eternamente vencedor.
Cruyff em português significa craque, monstro, fabuloso, genial.
Pompéia foi um dos grandes goleiros do futebol brasileiro. Tinha o apelido de “Constellation”, um grande e elegante avião dos tempos em que encantou a milhares de torcedores num Maracanã que já não existe.
Marcou presença no time do America entre os anos de 1954 e 1965, levando a equipe rubra ao seu último título carioca conquistado no ano de 1960.
Repetindo a história de muitos dos ídolos do nosso futebol, ao término da carreira mergulhou numa vida de drama e miséria, morrendo em 1996.
A seguir, texto de autoria de Antonio Edmilson Rodrigues, torcedor do America, livre docente em História, professor da UERJ e da PUC-RJ, pesquisador de História do Rio de Janeiro, escritor de temas vinculados à história urbana, coordenador do projeto Conversa de Botequim e autor de “João do Rio, a cidade e o poeta”, originalmente publicado na revista Carta Capital em 2013.
“Sou torcedor do America F.C. do Rio de Janeiro desde pequeno e isso quer dizer muita coisa para quem começa 2013 com 64 anos. Posso dizer que sou americano de coração, embora isso pareça anacronismo para as gerações de hoje, que olham para os times do Rio e só veem Flamengo, Fluminense, Botafogo e Vasco. Mesmos alguns antigos torcedores do mequinha deixaram de lado as tradições do pavilhão rubro, abdicaram de sua história e bandearam-se para um dos grandes do Rio.
Minha atenção para o America veio de meu pai. Nos domingos, lá em Vila Isabel, meu pai e meu tio disputavam, quase a tapa, eu e meu irmão. Eu recebi, de meu pai, o uniforme do América, comprado na Superball e meu irmão, de meu tio, o do Vasco. No quintal brincávamos de América e Vasco, o clássico da paz, assim denominado por ter selado a pacificação no futebol carioca em 1937.
Mais tarde, já com oito anos, levado por meu pai, via os jogos do America no estádio da Rua Campos Sales. Sentia-me importante sentado na arquibancada junto com aquele mar de camisas vermelhas. Olhava com aflição e atenção os jogos. Notava a elegância de Amaro, a velocidade de Nilo, a classe de João Carlos. E o que falar da emoção dos gols de cabeça de Quarentinha, da calma de Djalma Dias ao desfazer, dentro da área, as jogadas dos adversários?
Mas quem mais me impressionava era o goleiro. Diferente do restante do time, que usava a camisa vermelha e o calção branco, Pompéia se vestia de negro ou de cinza e trazia no peito o escudo do mequinha. Era esguio, alto, de uma flexibilidade ímpar. Sua elasticidade chamava a atenção. Eu não tirava os olhos dele, entusiasmado com os seus voos, as suas defesas mirabolantes que levaram o narrador esportivo Waldir Amaral a apelidá-lo de Constellation. Outros apelidos se seguiram: Ponte Aérea, Caravelle, Fortaleza Voadora. Todos cabiam como uma luva naquele homem simples, nascido em Itajubá, Minas Gerais.
Esse extraordinário goleiro iniciou carreira no circo, onde desenvolveu sua capacidade de impulsão, experiência que deu a ele a condição de ser um goleiro acrobático. Suas defesas mexiam com a plateia e mereceram de Nelson Rodrigues uma crônica em um America e Bangu:
“Foi, então, que surgiu Pompéia, como uma bastilha inexpugnável. Pompéia! Eis o que o América tem e os outros clubes, não: − um Pompéia. Que bela e emocionante figura! É o goleiro mais plástico, mais elástico, mais acrobático do mundo. Nada tem de simples: − ele complica tudo. Em primeiro lugar, não sabe defender sem um salto ou, mais do que isso, sem um vôo. Pompéia voa, amigos. Pompéia voa! E enfeita, dramatiza, dinamiza tanto suas intervenções que o público tem a sensação de que todas as suas defesas foram geniais. (…) Ele é o espetáculo.”
O apelido Pompéia vem da sua infância. Desatento aos estudos, gostava mesmo era de desenhar e o fazia bem, colocando no papel os personagens Popeye e Olívia Palito. Os colegas que viam os desenhos passaram a chamá-lo de Pompéia, pela dificuldade de pronunciar o nome do marinheiro. Pompéia nasceu José Valentim da Silva, em 27 de setembro de 1934, dia de São Cosme e Damião.
Iniciou sua carreira esportiva como centroavante no clube Itajubá, time composto de funcionários de uma fábrica de material bélico que participava do campeonato da Segunda Divisão mineira. Mais tarde, se transferiu para outro clube da cidade, o São Paulo, ainda como centroavante. Em um jogo em Três Pontas, o goleiro do São Paulo adoeceu e Pompéia foi escalado no gol. Saiu-se tão bem que chamou a atenção de todos, foi a grande sensação do jogo. Mais tarde, numa partida contra o Bonsucesso do Rio, o goleiro titular do São Paulo entusiasmou a todos, inclusive ao juiz da partida, também olheiro dos times do Rio, que convidou-o para treinar no Bonsucesso e jogar na Cidade Maravilhosa.
Atraído pelo convite, o goleiro não pestanejou e decidiu ir para o Rio. Apresentou-se em Teixeira de Castro e assinou seu primeiro contrato profissional em abril de 1953. No ano seguinte, transferiu-se para o América, onde permaneceu por 11 anos. Seu aprendizado da profissão foi feito com a ajuda do seu primeiro técnico. Alfinete, técnico do Bonsucesso, levava-o para assistir aos jogos do Vasco e do Fluminense, para ver Barbosa e Castilho atuarem. Mas não copiou o estilo de nenhum deles. Construiu um perfil próprio, no qual a estética das defesas se sobrepunha às dificuldades dos chutes. Em qualquer bola desenhava uma cena entre o belo e o rocambolesco, lançando-se sobre a bola de maneira espetacular. Para uns, era presepeiro, para outros, excelente goleiro.
Quando estava no seu dia, tomava conta do espetáculo e não tinha para ninguém, fazia das tardes de domingo o seu momento de fama e os comentários das resenhas do dia seguinte eram elogiosos. Com a estética do goleiro criada por ele, deixou como herança uma jogada, a ponte aérea. O nome vinha da novidade da época que era a ponte aérea entre Rio e São Paulo. Inventada por ele, hoje se tornou em jogada comum dos goleiros. Essa é apenas uma das contribuições de Pompéia. Porém, mais importante do que isso é a construção de uma nova forma de agarrar no futebol, trazendo para as partidas momentos de comédia de arte ou de tragédia cômica, subvertendo a forma tradicional de comportamento dos goleiros e alegrando a plateia, que ria e sofria com seus voos.
Essa marca particular de Pompéia levou-o à consagração como goleiro titular do America Futebol Clube (campeão carioca de 1960), atuando também como titular, em 1957, pela seleção carioca.
Pompéia chegou à seleção brasileira, quando a CBD montou um combinado para defender o Brasil em jogos contra seleções sul-americanas.
Diversas vezes ficava patente o racismo, quando associava-se sua elasticidade a dos macacos.
Em seu primeiro jogo pelo America já despertou entusiasmo. O América jogava um torneio quadrangular em Lima, no Peru, do qual também participa o Santos de São Paulo e, no jogo final entre os dois clubes, Pompéia defendeu um pênalti batido por ninguém menos que Pepe, que assustava com a potência de seu chute todos os goleiros. Com essa apresentação de gala passou a dividir o gol do mequinha com Ari em diversas jornadas, mas sendo o titular em 16 das 22 partidas disputadas pelo America no campeonato de 1960.
Seu nome era dito, cantado, anunciado nas bancas da cidade nas segundas e sua estética de goleiro ganhou fama. Vários Pompéias surgiram no Brasil e seus voos levaram-no longe. Jogou no Porto de Portugal e em vários clubes da Venezuela.E foi na Venezuela que terminou sua carreira de goleiro esteta.
Em 1969, num jogo entre o seu clube, o Desportivo Português, e o Real Madrid, depois de agarrar um chute difícil, que no rebote a bola foi novamente chutada contra a sua cabeça, perdeu uma de suas vistas, deixando a outra também prejudicada. O chute foi dado por ninguém menos que Di Stefano. Com isso, teve que abandonar o futebol.
Com a impossibilidade de continuar a atuar, Pompéia perdeu a alegria. Seu colega Amaro ainda tentou levá-lo para o Bonsucesso como preparador de goleiros, mas nada mais deu certo na vida do grande Constellation. Na rua da amargura, sozinho e perdido, voltou-se para a bebida e morreu em maio de 1996, em um quarto de um manicômio, olhando para uma bola.
Amargou na vida e na morte a sina dos goleiros, ditada na célebre máxima de autoria desconhecida: “o goleiro é tão maldito que onde ele joga não nasce nem grama”.
Já faz muito tempo, acho que durante a guerra, os jogadores do Posto 4 FC, campeoníssimo da praia, dirigido pelo “Trenier” mais famoso da Costa do Atlântico, Neném Pé de Prancha, tinham resolvido dar uma festa de fim de ano, na garagem da casa de um tio do Renato Estelita. O Lá Vai Bola FC aderiu ao baile e compraram três barris de chope.
Eu não topei e disse na esquina do Café do Baltazar: “Não vou. Na festa do ano passado, na garagem do Pé de Chumbo, quebraram tudo e até hoje o clube não pagou a cristaleira da avó dele que estava guardada lá. Não vou mesmo. Chega de encrenca.”
Meu irmão Aristides, o Hélio Caveira-de-Burro e o Orlando Cuíca me acompanharam na idéia de não ir ao baile e fomos tomar um chope, sossegados, num bar vazio, na esquina da Avenida Atlântica com Rua Constante Ramos. A noite estava boa e o papo também. Mais tarde, passou por ali o Jaime Botina e disse: “Caí fora do baile. Tem gente demais e muito nego bêbado. Vai dar galho.” E eu emendei: “Não disse?”
Lá pelas duas horas da manhã, parou um táxi daqueles grandes e saltou o doutor A. Coruja, esfregando os óculos, nervoso. O doutor Coruja era um impetuoso lateral direito. Só dava bico na bola de borracha e Neném Prancha decretou: “Só joga se cortar as unhas. Uma bola está custando cinco pratas.” Seu controle de bola não era dos melhores, mas quebrava o galho na lateral direita. O galho ou o ponta-esquerda adversário.
Mas chegou e foi falando incisivo: “Se vocês são machos e meus amigos, têm de ir lá comigo. Fui desacatado mas eram muitos.” E foi logo dando ordens: “Entrem aqui no táxi e vamos lá.”
Lá aonde?” disse o Hélio. Coruja explicou: “E na Rua Joaquim Silva. A mulher me desacatou, ofendeu minha mãe e não pude reagir porque ela estava com três caras na mesa. Vocês têm de ir comigo ou não são meus amigos.” Repetiu isto umas cinco vezes e completou: “Como é, poetas? Vamos ou não vamos? Vocês agora deram para medrar?”
Eu cochichei para o Cuíca: “O Coruja está de porre. Não vou me meter nisto.” O Cuíca respondeu: “Ele vai chatear a gente o ano inteiro por causa disso. O Coruja quando bebe é assim. Fica remoendo os troços. Olha, ele veio de lá até aqui e gastou meia hora. Para voltar, outra meia hora. Os caras já não estão mais lá, a pensão já deve estar fechada e a mulher dormindo com alguém.” E virando-se para o doutor Coruja: “Tá bem, nós vamos, mas vem tomar um chopinho com a gente.” Coruja topou e mandou o português do táxi esperar.
Tomamos o chope bem devagarinho e fomos, ainda devagar, para a Rua Joaquim Silva. O táxi “disse” que não esperava mais e foi embora. Subimos a escada de madeira, comprida e estreitinha, e demos numa sala de uns três metros por quatro, se tanto. Quatro mesinhas, só duas ocupadas por fregueses, e, nas outras, umas três mulheres com cara de sono. O diabo é que numa das mesas estava a tal mulher papeando com os três caras. Doutor Coruja partiu direto e foi dizendo: “Repete agora, sua vaca.”
Os homens levantaram, o que estava mais perto levou um soco do doutor e o pau comeu solto. O lugar era apertado e eu me lembrei da cristaleira da avó do Renato. Um dos caras era uma parada, brigava bem. O garçom não parecia homem mas era e as mulheres fizeram uma gritaria dos diabos. As mesas e as cadeiras foram para o vinagre, um dos caras se mandou escada abaixo, quando alguém apagou a luz. Escutei a voz de Hélio Caveira-de-Burro, que era muito experiente: “Vamos dar o fora.”
Saímos rápido e ainda levei com uns detritos atirados pelas mulheres da janela. Um guarda apitou e saímos pelas ruas da Lapa. Uns se mandaram pela Conde Laje e outros pela Glória. Eu fui parar no Passeio Público, arrumei um táxi e voltei para o ponto de saída. Quando cheguei, Orlando Cuíca já estava e disse: “O guarda começou a dar tiro e quase me pega. Tive sorte.”
Depois chegaram Hélio e meu irmão, que vieram noutro táxi. Hélio falou: “O grande era uma parada. Mas peguei ele bem com a perna da cadeira. Senão a gente não ganhava.” Meu irmão estava com a camisa rasgada e disse que foi a mulher que se atracou nele. “Não bati mas tive de dar uma ‘banda’ nela. Juntou pé com cabeça. Depois que Hélio dominou o grandalhão, foi barbada. Dei uma no de terno marrom que ele se mandou pela escada.” E eu disse: “Ficou tudo quebrado e a mulher que o Coruja bateu não levantou, mas eu não vi sangue.”
E ficamos relaxando um pouco quando chegou um táxi e o doutor Coruja saltou esfregando os óculos com um lanho no rosto. Hélio perguntou: “Como é doutor, se machucou?” “Nada, um arranhãozinho à toa.” E prosseguiu: “Puxa, agora estou satisfeito. Há mais de três meses que eu estava para ir a esta forra.”
“O quê?” — berramos em coro — “O negócio foi há três meses!?” E Coruja explicou, calmamente: “Foi sim e eu não bati nela porque estava acompanhada.” Então meu irmão perguntou: “Quer dizer que os caras que apanharam não eram os mesmos?” Coruja respondeu: “Claro que não, meus poetas, mas o que tem isto demais?”
Nesta altura, o sol já estava aparecendo lá na Ponta do Boi, iluminando o primeiro dia do ano e desejando boas entradas para a excelentíssima senhora mãe do doutor A. Coruja.
JOÃO SALDANHA era gaúcho e nasceu em 1917 na cidade de Alegrete. Jornalista combativo, treinador, apaixonado pelo futebol, conseguiu unir o Brasil — então politicamente dividido — em 1969, por ocasião das eliminatórias para aquela que seria a Copa do tricampeonato no México. De temperamento difícil, extremamente corajoso, fez muitos inimigos na vida. Mas todos admiravam aquele homem (ainda que muitas vezes não o perdoando pelas aventuras que dizia — e acreditava — ter vivido) que assistiu a todas as Copas do Mundo de futebol; que, como jornalista, cobriu a guerra da Coréia; que desembarcou na Normandia com Montgomery e que fez a grande marcha com Mao Tse-Tung. Faleceu no dia 12 de julho de 1990, durante a Copa do Mundo. O texto acima consta do livro “Nelson Rodrigues e João Saldanha – a crônica e o futebol”, compilado por Ivan Candido Proença, – Rio de Janeiro – Educom – 1976, págln96-98, e extraído do livro “As cem melhores crônicas brasileiras”, Editora Objetiva – Rio de Janeiro – 2007 – pág. 206, organização e introdução de Joaquim Ferreira dos Santos.
SOBRE NENÉM PRANCHA
Antonio Franco de Oliveira (Resende-RJ, 16 de junho de 1906 — Rio de Janeiro-RJ, 17 de janeiro de 1976), mais conhecido como Neném Prancha, foi um roupeiro, massagista, olheiro e técnico de futebol brasileiro. Ganhou a alcunha de “O Filósofo do Futebol” de Armando Nogueira, por suas frases engraçadas.
Neném iniciou sua carreira no futebol como jogador, no pequeno time Carioca. Não obtendo sucesso, abriu uma escolinha de futebol para crianças nas areias de Copacabana. Ao mesmo tempo, trabalhava como roupeiro, massagista e olheiro do time do coração, o Botafogo. Entre os jogadores que descobriu, estão Heleno de Freitas, e o ex-jogador e hoje comentarista Junior.
Por ser especialista no trato com os jogadores, principalmente os mais jovens, foi técnico das divisões de base do Botafogo.
Um dos principais objetivos deste PANORAMA DO FUTEBOL é ser uma memória não seletiva do mundo do futebol. Em nossas pesquisas para os livros que estamos escrevendo – projetos a serem lançados em 2016 – ficou claro para nós que alguns eventos fundamentais do nosso futebol, dos anos 1970, 80 e 90, foram simplesmente esquecidos das matérias televisivas ou dos sites na internet. Com isso, é quase certo que pessoas na casa dos seus 20, 25 anos, simplesmente desconheçam por completo tais fatos. Isso ajuda, e muito, na criação de mitos e na assimilação de inverdades.
Tempos atrás, numa discussão sobre o meu Vasco da Gama, lembrei um “ilustre” vascaíno do seu esquecimento do título brasileiro da segunda divisão de 2009, quando este listava os feitos do Vasco de 2000 pra cá. A resposta foi surpreendente: Isso é pra ser esquecido – Como a visita e vitória na 2a divisão fossem algo vergonhoso, a ser omitido da história do clube.
Esse raciocínio se estende às derrotas e fracassos, principalmente na literatura. Os livros se concentram nos grandes craques, grandes títulos, grandes vitórias. Com isso, personagens fantásticos são esquecidos. Grandes histórias são perdidas no tempo, exatamente porque elas não têm como pano de fundo uma grande vitória, um título. E se as editoras operam com a teoria de que “Livro sobre futebol não vende”, que dirá um livro que traga em sua alma uma derrota épica.
Imaginem a quantidade de livros ufanistas teríamos se Neymar Jr e companhia tivessem ganho a Copa? Talvez até alguns mais corajosos se aventurassem a lançar algum se o Brasil tivesse sido derrotado nos pênaltis ou se, por exemplo, a bola do último minuto de Pinilla, do Chile, ao invés de beijar a trave, fosse pra estopa.
Mas não foi isso que aconteceu. Ocorreu a hecatombe que todos viram, o apocalipse do Mineirão, os minutos mais vergonhosos da história do futebol brasileiro. Ali, naqueles minutos, certamente vários projetos foram postos de lado, apagados, esquecidos, pois ninguém daria mais um centavo por aquilo. Neymar não iria mais erguer a taça e os brasileiros só queriam apagar da memória aquela vergonha.
Quantos livros você viu lançados sobre a Copa de 2014? Pois é…
Só que a gente não pensa assim. “2014, o Espírito da Copa” foi escrito por Paulo Roberto Andel, João Garcez, por mim e por mais dezessete pessoas que, no calor dos acontecimentos, relataram aquilo que viveram na mais espetacular das Copas. Os textos, de até três páginas, são publicados na ordem cronológica dos fatos, e acompanham desde as manifestações anteriores à Copa até a coroação da grande campeã. Todos, sem exceção, foram escritos durante o evento, e são datados. São textos com resenhas de jogos, comportamento das torcidas e dos “gringos” dentro e fora dos estádios, crônicas sobre personagens, por autores no Rio, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Salvador. Várias visões e textos completamente distintos daqueles dias sensacionais.
Muitas páginas são dedicadas aos famosos 7 x 1. Principalmente a capa do livro. A foto que a ilustra foi feita minutos depois da “tragédia”, pelo Paulo Andel. Ao sair de casa, no Centro do Rio, eternizou a cena. Dois meninos, vestindo a camisa dez amarelinha, jogavam uma animada pelada, acompanhados pelo olhar vago do cidadão das ruas que, sentado ao fundo, assistia a tudo inerte. Apesar da maior derrota da história do futebol brasileiro, a vida continuava. O amor à bola seguia incólume.
Na contracapa, o projeto original previa o número 14 da camisa da seleção, representando o ano do certame. Depois daquele dia, decidimos trocar pelo 7, o número que vai assombrar o futebol brasileiro por longa data.
Nosso objetivo foi imprimir um retrato vivo do que foi a Copa. Acredito que tenhamos conseguido.
Caso tenha interesse em adquirir um exemplar, ele custa R$ 40,00 e pode ser comprado diretamente com um dos autores. Por favor, contacte Paulo-Roberto Andel – pauloandel@gmail.com
Que os campeonatos estaduais estão rumo à extinção, já sabemos.
Mas nem sempre foi assim.
Até os anos 1980, os estaduais eram competições valorizadas pelos grandes clubes e seus torcedores. Não eram tratadas com o menosprezo que só aumenta ano após ano.
Os motivos para esta perda de espaço e interesse dos estaduais são muitos, abordados diariamente em inúmeros espaços da imprensa esportiva brasileira. Contudo, há um enfoque pouco abordado, que é o valor desportivo; ou seja, com o passar dos anos, os estaduais foram perdendo o seu valor frente às outras competições que surgiram ao longo dos últimos 25 ou 30 anos. Os defensores das competições locais podem dizer que, nesse período, dentre as disputas que surgiram, quase nenhuma resistiu, enquanto os estaduais continuam aí.
Para que se tenha ideia do que estou falando, vou exemplificar. Em 1987, o Campeonato Carioca foi disputado por 14 clubes entre os meses de fevereiro e julho. Vasco, Flamengo e Bangu, que chegaram à fase final da competição fizeram 31 jogos ao todo. Enquanto isso, o Campeonato Brasileiro (Copa União) foi disputado por 16 clubes no período de setembro a dezembro, e o Flamengo, por ter chegado à final, fez 19 jogos. Quer dizer, naquele ano, o time rubro-negro fez 50 jogos nas duas competições oficiais disputadas.
Em 2015, dentro de um cenário hipotético, já que nenhum clube do Rio de Janeiro esteve na Copa Libertadores do mesmo anos, um clube carioca poderia disputar até 83 jogos, um aumento de 66% em relação a 1987 – e, nesse contexto, o estadual seria a competição menos importante, uma vez que esta agremiação disputaria também a Copa do Brasil, o Campeonato Brasileiro, a Copa Libertadores e o Mundial de Clubes da FIFA.
Nesse contexto, com o calendário dos clubes mais apertado, o Estadual acaba ficando em segundo plano e, por ser a competição menos importante da temporada, os grandes clubes deixam de escalar seus jogadores para que eles possam render o máximo nos jogos das outras frentes paralelas.
E onde está o valor desportivo nisso tudo?
Atualmente, os estaduais não possuem nenhum valor desportivo para os grandes clubes, pois não dependem do seu resultado para se classificar para outra competição, o que não acontece nas outras competições, que são classificatórias para outras, até chegar ao topo, que é o Mundial de Clubes da FIFA.
Para que os estaduais recuperem uma parte de seu valor, seja para clubes, torcedores e mídia esportiva, eles deveriam ser classificatórios para a Copa do Brasil. Mas, para isso, esta competição precisaria sofrer um enxugamento e ter, no máximo, 46 clubes, todos classificados com base no resultado do campeonato estadual do ano anterior. Cada estado teria um ou dois representantes e a CBF arbitraria o critério para apontar os estados que classificariam uma ou duas equipes para a Copa do Brasil.
É evidente que apenas uma medida isolada não resolve o problema dos estaduais, mas pode ajudar a reerguer essas competições que muito ajudaram na formação do outrora melhor futebol do mundo.
O Fla-Flu de ontem no Pacaembu não foi nenhum jogão e, de certa forma, revela certo clima insosso na temporada 2016 do nosso futebol. Chegamos ao fim de março e conta-se nos dedos o rol de partidas empolgantes que foram vistas pelos gramados Brasil afora.
No entanto, alguns fatores positivos chamaram atenção.
Primeiro, o interesse do público. Talvez, apenas talvez, se esta partida tivesse sido disputada no Maracanã, talvez não conseguisse atrair 30 mil torcedores ao estádio – uma lástima quando falamos de um clássico, mas a triste realidade local: TV, desinteresse por parte do público, preços caros et cetera. Há quem aponte a televisão como a principal causa do afastamento dos torcedores do estádio e é justo refletir sobre isso, mas não creio que se trate do único motivo. Antes, 100 mil presentes era uma estatística até simplória; hoje, no máximo 95 mil e em Camp Nou. As modernas arenas brasileiras foram encolhidas em seus tamanhos originais, tendo o grosso de seu público – as classes populares – “devidamente” apartado para biroscas e afins. Mas o que não tem remédio, remediado está.
Segundo, o charme inquestionável do Pacaembu. Pensando nas arenas gourmetizadas, assépticas, frias até, o velho estádio tem realmente cara de estádio. Reparem que nem de longe sou contra modernidades; o que quero dizer é que, se precisavam trazer os campos de futebol para o futuro, não precisavam alijar o passado nem os principais focos de atração para uma partida. O Pacaembu tem história, tradição, imponência e ao lado de outras casas como São Januário e o Mundão do Arruda, ainda mantém certa aragem do que foram as nossas melhores épocas no futebol brasileiro.
Jogar em São Paulo passou a ser uma boa oportunidade para Flamengo e Fluminense. Mas não custa lembrar que isso só veio a acontecer porque ambos não se prepararam devidamente para o fechamento dos estádios no Rio de Janeiro, primeiro por ocasião da Copa de 2014 e, agora, com os Jogos Olímpicos. O que pode ser vendido como estratégia foi, na verdade, improvisação. Boa, mas improvisação.
Reitero: o Pacaembu é lindo demais, mas um Fla-Flu merecia público de Morumbi lotado. De toda forma, isso já é outra história.
Thomas Jorge Farkas, nascido Farkas Tamás György (Budapeste, 17 de outubro de 1924 — São Paulo, 25 de março de 2011), foi um dos pioneiros da moderna fotografia do Brasil.
Húngaro de nascimento, Farkas veio para o Brasil quando criança, em 1930. Seu pai, Desidério Farkas (Farkas Dezső), foi sócio-fundador da Fotoptica, empresa que também viria a dirigir. Iniciou sua carreira de fotógrafo na década de 1940 e foi um dos mais expressivos membros do Foto Cine Clube Bandeirante. Em sua obra destaca-se o registro da construção e inauguração de Brasília. Criou em 1979 a Galeria Fotoptica em São Paulo, destinada exclusivamente à exposição de fotografias.
Engenheiro de formação, foi professor de Fotografia, Fotojornalismo e Jornalismo Cinematográfico da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Foi também produtor de documentários, dentre os quais “Brasil Verdade”, “Jânio a 24 Quadros” e “Coronel Delmiro Gouveia”.
Morreu em São Paulo, aos 86 anos de idade.
Do lado de fora do Estádio do Pacaembu. São Paulo, SP. 1941. Foto: Thomaz Farkas/Acervo IMS[/caption]
Os movimentos que cercam a questão da televisão no futebol brasileiro causam preocupação nos atores econômicos envolvidos.
Outrora deitada em berço esplêndido da estabilidade contratual, a Rede Globo em poucos meses se viu num ambiente de concorrência, contestação e repulsa como jamais se viu antes. Tendo o grupo Warner nas costas por meio do Esporte Interativo, a chamada Vênus Platinada já perdeu times expressivos como Santos, Coritiba, Atlético-PR e Bahia para o Brasileiro de 2019.
Cansados dos desmandos que envolvem horários esdrúxulos, da gourmetização do futebol, das coberturas tendenciosas e desproporcionais, afora outros problemas, torcedores organizados têm manifestado suas críticas à detentora dos direitos de transmissão, a ponto de um árbitro precisar paralisar uma partida para que faixas críticas fossem retiradas das arquibancadas.
Outro ponto de desconfiança está nos imbróglios envolvendo a cúpula de CBF, o grupo Traffic e as ligações na FIFA, já com a suspensão de figuras importantes e o julgamento de alguns chairmen do mundo da bola, casos do ex-presidente da Confederação José Maria Marín e do empresário Jota Ávila. Del Nero segue autoexilado no Brasil, temendo a Interpol caso pise em terras estrangeiras.
Diante de tantos elementos negativos, às vezes enrustidos por alguns poucos jogos de grande apelo e grande celebração midiática, vendendo um produto de aparência duvidosa e conteúdo contestável, é possível entender o esvaziamento atual do futebol brasileiro, enquanto o mercado econômico do esporte preferido dos brasileiros caminha para a inviabilidade econômica – mais de 80% dos jogadores no Brasil ganham até dois salários mínimos mensais, conforme estatísticas de 2015. Clubes pequenos esmagados e em processo de fechamento, os grandes administrando dívidas multimilionárias, empresários fazendo a festa financeira e os melhores jogadores bem distantes dos gramados brasileiros. Jogos sem público enquanto a TV não se preocupa: ela lucra com os torcedores em casa à frente do PPV ou nos bares em geral. Torcida para quê?
Em contrapartida, as federações são dirigidas por grupos feudais, sem remuneração mas administradores de ótimos lucros. Da Confederação, é desnecessário dizer. Os meios de comunicação de massa aplaudem o modelo atual, interessados que estão na manutenção do status quo.
Quando o futebol deixou de ser um grande lazer em firma de espetáculo para se tornar um mero negócio econômico, as suas raízes foram enfraquecidas. Trocou-se o público dos estádios pela massa dos espectadores em frente à uma novela monótona às quartas-feiras e domingos – terças, quintas, sextas e sábados também.
Qualquer análise que relacione o avançar deste sistema nos últimos anos com o fracasso contemporâneo do futebol brasileiro, seja nas competições continentais interclubes ou nas de seleções, não o faz por mera coincidência.
Atrasos de salários; jogadores que não recebem, outros que pagam para jogar; promessas não cumpridas; jornadas duplas ou triplas para complementar a renda familiar; falta de estrutura; contratos curtos de trabalho; ausência de calendário anual.
Essas são algumas das dificuldades e obstáculos da dura realidade do mercado de trabalho dos atletas da base da pirâmide do futebol brasileiro.
“Os boias-frias do futebol” revela os sonhos e as incertezas de dois jogadores da Série C do Campeonato estadual do Rio, a divisão mais operária do futebol fluminense.
Caros amigos, o PANORAMA DO FUTEBOL pretende ser um espaço de resgate das discussões sobre o que cerca boa parte do futebol que não se vê na televisão.
Para isso, utilizaremos texto, imagem vídeo e som, na tentativa de agregar torcedores em geral que estejam dispostos a uma reflexão mais profunda sobre este esporte que encanta e inebria, mas também caminha com frustrações, falhas e anonimato.
Esteja em casa, feito um estádio de antigamente. Ou outro desses que a TV nem sempre se lembra de mostrar.