O vazio do futebol

Enfim, o futebol voltou. Não havia outro jeito, os contratos exigem e, segundo dizem, o show tem que continuar.

Mas há um vazio absoluto, provocado pela trágica pandemia que continua matando muito no Brasil. Sim, afinal é impossível que se tenha público nas partidas. Paciência.

De toda forma, é impossível não se sensibilizar com a desgraça que é uma arquibancada no completamente vazia numa partida de futebol. Sem a torcida, a televisão oferece um sentimento de solidão, de ausência, de lacuna evidente.

O cenário já é triste para os times da elite do futebol brasileiro. Imagine quem não está nela? Campeonatos que não vão se realizar, times que podem desaparecer, tristeza, desemprego, miséria. Quatro quintos ou mais dos jogadores brasileiros ganham pouco mais do que um salário mínimo, isso para quem recebe. E como vai ser daqui por diante?

É certo que prever a catástrofe provocada pela Covid19 era impossível mas, se pensarmos bem, o cotidiano dos jogos sem público na arquibancada já se desenhava de alguma forma, ora pela gentrificação dos estádios transformados em arenas, ora pelo desprezo às equipes que não figuram nas principais competições nacionais, ora pela própria espanholização do futebol através das cotas de TV, ora pelo combate hipócrita aos verdadeiros agentes da violência entre torcidas. Numa reflexão sincera, a TV sempre pretendeu fazer do futebol uma atração como um jornal diário ou uma novela, pouco se importando sobre a necessidade vital de formar público presente aos jogos.

Copiamos a péssima fórmula de Havelange: arenas gourmetizadas, com ingressos caros, privilegiando carros em vez dos velhos trens enchendo os estádios com seus tipos populares.

A pandemia foi apenas (mais) uma pá de cal nos degraus de concreto que antes ofereciam emoção, mas que passaram a exalar “experiências”. Por enquanto temos a justificativa para o deserto de espectadores. Mas o que será do futuro? A torcida vai sobreviver depois que a tragédia do novo Coronavírus for debelada?

Dia 16 de julho de 1950

Há exatos 70 anos e alguns minutos, o Rio vivenciava o maior velório de sua história. Muitos cariocas cometeram suicídio, inclusive no Maracanã, palco de Brasil 1 x 2 Uruguai. É um assunto tido como tabu.

Destroçados para sempre, salvo raras exceções, os jogadores brasileiros experimentaram a morte em vida. Alguns sofreram muito, outros até o fim de suas trajetórias.

O peso mais cruel coube a Barbosa, um dos grandes goleiros da história do futebol brasileiro, num exemplo típico de casuísmo presente no cotidiano brasileiro.

Incrivelmente, os uruguaios campeões não escaparam de destinos cruéis: abandonados à própria sorte pelos dirigentes, que se mandaram antes da decisão, comemoraram o título fazendo uma vaquinha para comprar sanduíches no hotel. Obdulio Varela, o líder do time, foi andando pelos bares do Flamengo e Zona Sul, bebeu como nunca, abraçou brasileiros chorosos e se penitenciou para sempre: ignorou holofotes, afastou-se do futebol e teve um resto de vida miserável, assim como vários de seus companheiros.

E foi da dolorosa derrota em 1950 que nasceu a maior potência da história do futebol. Dos exageros daquela tarde vieram as sementes que, vinte anos depois, floresceram na conquista da Taça Jules Rimet, depois de três títulos mundiais.

Há setenta anos, nasceu uma ferida que jamais cicatrizou – e é irônico que dela tenha vindo um caminho para monumentais vitórias.

Enquanto a Seleção de 1950 não tiver a devida reabilitação e reconhecimento, haverá uma lacuna, um hiato indevido.

A memória de Moacir Barbosa merece isso. As vidas que foram desperdiçadas naquele 16 de julho de 1950, porque inventaram que era matar ou morrer, merecem isso. Não é preciso uma Copa do Mundo para saber reconhecer os próprios heróis.

Aquele silêncio do Maracanã abarrotado ainda rasga o ventre dos que amam o futebol, mesmo os que sequer eram nascidos quando tudo aconteceu.

@pauloandel

Lançamento do livro “Da lama à grama”, de Kleber Monteiro, nesta quinta-feira

Na próxima quinta-feira (16), o escritor Kleber Monteiro lança o livro “Da lama à grama” no Rio de Janeiro. A obra é a descrição de todo o campeonato da terceira divisão do futebol carioca no ano de 2019. Para realizá-la, Kleber fez viagens quilométricas de modo a assistir todos os times da competição pelo menos uma vez, contando tudo sobre jogadores, treinadores, dirigentes e torcedores.

Além dos jogos, que por si somente formam um livro único, o autor captou toda a atmosfera que cercava as partidas, desde fatos engraçados e até jocosos como dramáticos e reflexivos, captando uma realidade muito diferente da vivida pelos grandes clubes brasileiros. “Da lama à grama” é, desde já, um registro histórico.

O livro foi produzido pela Vilarejo Metaeditora, com a participação direta do PANORAMA: produção de nosso fundador e cronista Zeh Augusto Catalano, mais revisão e prefácio do nosso cronista Paulo-Roberto Andel. E para ficar tudo em casa, o lançamento será no Sebo X, apoiador desta casa.

OBS: atendendo aos protocolos necessários, não é permitido acessar o prédio onde fica o Sebo X sem o uso de máscara. A presença no evento deve ser confirmada antes pelo Whatsapp (21) 99791-5589.

SERVIÇO

“Da lama à grama: uma viagem pela terceira divisão do futebol carioca”

Lançamento: 16/07/2020 (quinta)

Horário: agendado pelo Whatsapp (21) 99791-5589

previamente entre 13 e 17h.

Local: Sebo X – Praça Tiradentes, 9/sala 601 – sexto andar – Centro – RJ

Preço: R$ 50,00. Débito, crédito e dinheiro.

Produção: Vilarejo Metaeditora

Tamanho: 14 x 21 cm

Páginas: 186

Porque hoje tem Fla x Flu

O mundo anda complicado demais, o Brasil passa por um momento muito difícil e, sinceramente, não havia o menor clima para se retomar competições de futebol com 70 mil mortos pelo novo Coronavírus. Mas os bastidores decidiram e, logo no Rio de Janeiro, tão machucado por tudo, a bola voltou a rolar.

Pelo menos ficou o Fla x Flu. Para muitos o campeonato era favas contadas do Flamengo, mas o Fluminense foi matreiro e, por isso, venceu a Taça Rio nos pênaltis, garantindo a final do campeonato em dois jogos. Aliás, quem sabe dizer qual foi a última vez em que o maior clássico do futebol brasileiro foi disputado três vezes em sete dias? É o que terá acontecido quando for conhecido o novo campeão carioca.

Em vez das velhas multidões, o Maracanã vazio e sem festa. Em vez dos olhos grudados na tela da TV, celulares e notebooks.

O que não muda é a mística do confronto que já dura 108 anos, recém completados na semana passada. O pior sempre faz jogo duro com o melhor, o inesperado tem sempre lugar cativo na partida, a empáfia não rima com a vitória. Desde os jogos da Rua Guanabara até palcos de outros estados, o Fla x Flu mexe com os sentidos.

Qualquer prognóstico da decisão parece precipitado. Só no campo mesmo é que as coisas acontecem. Se o Flamengo vem de várias conquistas e conta com seu time vice campeão mundial, o Fluminense se reabilitou depois da volta do futebol. Fez três partidas ruins na Taça Rio mas encarou o eterno rival de igual para igual.

A cidade está triste e silenciosa. A fome e o abandono imperam nas ruas. Os bares estão vazios. O Rio está deitado num leito hospitalar. Mais uma vez os desafios serão imensos. Por ora, este domingo à tarde reserva ao menos uma hora e meia de emoção, distração e fantasia, porque o Fla x Flu é o jogo que nunca termina. Daqui a pouco tem mais um capítulo, ao menos para aliviar os corações sofridos dos brasileiros.

Os heróis de 1958, 62 anos depois

Houve um tempo em que o Brasil era figurante nas Copas do Mundo, mas tudo mudou com a espetacular Seleção de Didi, Nilton Santos, Garrincha, Pelé e outras feras.

Quase todos os heróis daquela conquista estão mortos, mas a história é eterna. Vivos, Pelé e Zagallo são legendas do nosso futebol.