Me dá um Barão? (por Paulo-Roberto Andel)

Eu era garoto, tinha uns dez anos. Certamente minha vida foi melhor do que a de 90% das outras crianças, mas esteve longe de ser fácil.

Estávamos muito pobres, meus pais batalhavam demais.

Surgiu o Barão, em meio à inflação. Era um sonho. Eu quero um Barão. Você me empresta um Barão? A nota de 1.000 cruzeiros estrelada pelo Barão do Rio Branco.

Foi uma das cédulas mais queridas pela população, embora a maioria não tivesse nada.

O Barão me traz à tona um tempo distante, longe de ser fácil mas que me dá saudade. Não é saudosismo, mas saudade. É que essa coisa dos sete aos catorze anos passa com velocidade astronômica, a gente não aproveita direito e, quando vê, tudo voa longe.

No tempo do Barão, meu grande sonho era o lanche no Bob’s da Domingos Ferreira. Às vezes meu pai me levava lá. Minha mãe preferia o da Avenida Copacabana, ao lado do Externato Santo Antônio. Tudo se foi.

Ou ganhar um time de botão cristal Gulliver. O do Fluminense era lindo, verde vivo, com o escudinho envolto por um círculo amarelo. Wendell, Miranda, Moisés, Edinho e Carlinhos; Pintinho, Cléber e Rubens Galaxe; Doval e Zezé. Faltou alguém.

Ou ganhar uma linda bola de couro com 32 gomos e me sentir um craque feito aqueles que apareciam no “Gol: o grande momento do futebol”, programa da Band apresentado por Alexandre Santos, só com gols, gols e gols maravilhosos. Tinha Ademir da Guia, Leivinha, Ailton Lira, Edu Bala, Sócrates, Palhinha, Serginho e também as feras do Rio: Luisinho, Tita, Nunes, Cláudio Adão, Roberto, Zico, Luisinho das Arábias.

Sonhar com os times de vidrilha da loja de brinquedos Dom Pixote, que ficava na Santa Clara, bem em frente às Massas Suprema com seus inigualáveis pasteizinhos.

Outro sonho de garoto: ir à Kayat Sports da Figueiredo Magalhães (que não sei ao certo se era do Seu Carlson Gracie ou não) e comprar o escudo tricolor bordado, lindo, mais um número 5 verde, do Edinho, daqueles de grudar na camisa passando ferro. Com o escudo e o número, era só comprar uma camiseta Hering branca e fazer a camisa de futebol mais bonita do mundo. O problema era que dinheiro não era nada fácil e conseguir um Barão…

A gente jogava bola na vila, quase todo dia. Na praia também, até o início da noite. Quando escurecia, não dava pra ver mais nada. Ver a praia de Copacabana hoje toda iluminada é engraçado: os mais jovens nem sabem que a iluminação só começou em fins dos anos 1980, talvez 1988 se não me engano.

Morria de medo de tirar uma nota vermelha. Podia perder a bolsa de estudos. Não podia errar.

Sempre que dava, via desenhos animados com minha mãe. Flintstones, Pepe Legal, Papa Léguas, Corrida Maluca. Até hoje vejo no YouTube. Só falta a mãe do lado.

[A dor de ser órfão é tão grande que não há como descrever, apenas sentir

Às vezes a gente jogava botão no Shopping dos Antiquários, debaixo da escada rolante. Só fiquei chateado um dia, quando os amigos não queriam que eu participasse do campeonato porque “ganhava tudo”. Eu podia até ganhar, mas minha grande alegria era jogar. Até hoje me sinto bem só de mexer nos botões em casa.

Quando tinha grana em casa, minha mãe fazia Strogonoff e bife à rolê. Nos tempos de maré baixa, carne moída com arroz, ou asinhas de frango. Pouco importava: com ela e meu pai em casa, eu acreditava até em felicidade plena.

@pauloandel

O futebol por vários (da Redação)

EDUARDO GALEANO
“Futebol ao sol e à sombra”, 1995

A história do futebol é uma triste viagem do prazer ao dever. Ao mesmo tempo em que o esporte se tornou indústria, foi desterrando a beleza que nasce da alegria de jogar só pelo prazer de jogar. Neste mundo do fim de século, o futebol profissional condena o que é inútil, e é inútil o que não é rentável. Ninguém ganha nada com essa loucura que faz com que o homem seja menino por um momento, jogando como o menino que brinca com o balão de gás e como o gato brinca com o novelo de lã: bailarino que dança com uma bola leve como o balão que sobe ao ar e o novelo que roda, jogando sem saber que joga, sem motivo, sem relógio e sem juiz.

O jogo se transformou em espetáculo, com poucos protagonistas e muitos espectadores, futebol para olhar, e o espetáculo se transformou num dos negócios mais lucrativos do mundo, que não é organizado para ser jogado, mas para impedir que se jogue. A tecnocracia do esporte profissional foi impondo um futebol de pura velocidade e muita força, que renuncia à alegria, atrofia a fantasia e proíbe a ousadia.

Por sorte ainda aparece nos campos, embora muito de vez em quando, algum atrevido que sai do roteiro e comete o disparate de driblar o adversário do time inteirinho, além do juiz e do público das arquibancadas, pelo puro prazer do corpo que se lança na proibida aventura da liberdade.

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MARCELO FROMER E NANDO REIS
“Repetimos idênticos erros de 74,78 e 90”
(Especial para a Folha, 11/06/1994)

Esta estúpida obsessão pelo futebol rígido e obtuso, calcado na máxima do coletivismo europeu de hoje.

Desde que perdemos a Copa da Inglaterra, quando a dona da casa foi brutal e descaradamente favorecida pela arbitragem, algo só comparável ao escândalo protagonizado pela Argentina de Videla e o Peru de Quiroga, criou-se a ilusão de que devíamos nos dobrar diante da “eficiência” do futebol do Velho Mundo.

Que grande bobagem. O futebol não é nada mais do que uma das expressões culturais de uma nação. Nós aqui gostamos mesmo é de feijão.

Estamos patinando nos mesmos erros que nos levaram aos fracassos de 1974, 78 e 90 que não se comparam às inconsoláveis frustrações de 82 e 86.

E o que afinal de contas estão pretendendo esses dois técnicos? Enjaular a explosão do futebol desses craques exibindo videoteipes da seleção alemã?

O próximo passo seria copiar o modelo da Inglaterra e ficar de fora do Mundial.
Talvez a única coisa que ainda tenhamos de original seja o nosso futebol. Mas até quando?

O que tentamos colocar através de tantos artigos nesta coluna é que não concordamos com essa fixação que o Teimoso e o Velho Zaga mantêm pelo futebol “competitivo” e “vencedor” dos europeus.

Talvez essas sejam as últimas linhas que ainda riscamos vociferando contra a alienação das nossas características.

Afinal o Pelé não era branco e nunca jogou na Bundesliga.

Estamos entrando no túnel de acesso de mais uma Copa do Mundo e não há outro modo de agir que não seja com a paixão.

Mas antes de encerrarmos a nossa contagem, aguardaremos ainda mais uma semana na expectativa de que a grande teimosia dê espaço a um pouco de razão.

E por isso então sugerimos ligeiras mudanças na escalação: no lugar do batedor de petecas Taffarel, Zetti.

A providencial lombalgia de Branco se encarregou de endireitar a espinha dorsal da nossa defesa através da categoria de Leonardo.

Vamos deixar que o Dunga do banco possa assistir Mazinho descongestionar o meio-campo com toques rápidos e eficientes.

E já que jogaremos com quatro homens no meio-campo por que não trocar a burocracia do bom Zinho pela saúde e pela onipresença do Cafu?

Se o esquema é esse e a foto oficial já foi tirada, bem que poderíamos entra em campo contra a Rússia com a seguinte escalação: Zetti, Jorginho, Ricardo Rocha, Ricardo Gomes e Leonardo; Mauro Silva, Mazinho, Cafu e Raí; Bebeto e Romário.

E antes que ele assuma o cargo que virá depois da Copa, cabe a seguinte pergunta: se o Teimoso tá levando US$ 500 mil por ano, com quanto é que fica o Velho Zaga?

Com o Teimoso faltam 11 dias para começarmos a perder mais uma Copa.

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IVAN LESSA
“FIFA fofa”
BBC Brasil, 01/06/2011

Como vivo dizendo, no meu tempo era diferente. Feito dizem todos com pouco tempo pela frente e não se lembram direito de nada. Corrupção e suborno eram coisa de pobre. Ou seja, jogadores e juízes. Futebol dava pouco dinheiro e o bem-bom mesmo ficava para o que chamávamos na época de “cartolas”. Os jogadores, coitados, ganhavam uma miséria. Muitos clubes (sim, é você mesmo, “seu” Fluminense) não deixavam sequer que eles botasem os pés na social em qualquer evento festivo. Só entravam para renovação ou transação de passe. E feliz do jogador que tivesse voz ativa na transa, ou, para ser franco, tramóias.

Já o que se passava em campo era bom para valer. Mesmo. Jogava-se futebol. E como. Graças ao YouTube e outros sítios dá para conferir. Não é (só) papo de velho. Sim, claro, tinha corrupção e suborno comendo solto. Bastava comprar o juiz, o que não era difícil, o goleiro ou o artilheiro do time adversário. Saía a preço de banana e havia desconto para o pacote. Depois, como tudo mais, o futebol passou a dar uma nota. Hoje bilhões correm soltos pelas pontas sem marcação. Os “cartolas”, se globalizaram, viraram notícia tão ou mais importante que o gol de Pelé no apagar das luzes da contenda, para pedir emprestado um pouco da locução esportiva, que, como tudo ligado ao balípodo (esse não pegou), virou refrescante fonte de renda.

Já vi menino na rua discutindo os méritos de João Havelange e Sepp Blatter. Antes o pau saía do verbal para o físico quando o assunto eram os atributos artísticos de cobras como Lemerson e Celimar, para ficar em dois exemplos felizmente inexistentes. Das gerais e das arquibancadas, de uma social ou outra, até mesmo das tribunas de imprensa, quando o suborno de sua excelência o juiz era gritante, vinha o berreiro, quase que em uníssono, “Filho da…”. Mais bonito que cantar hino ou desfaldar bandeira do time.

Chegando a nossos dias, e peço dispensa deles por motivo de saúde, futebol é o esporte-beleza, ou the beautiful game, como dizem os ingleses e até os americanos, que, vez por outra, a ele dedicam umas páginas em seus semanários dito sérios. Tão esporte e tão beleza que quem anda frequentando mais páginas nos jornais e na televisão são os dirigentes, para não ter que botar cartola na cabeça de quem não merece sequer boné dos New York Yankees. Como tudo que vale a pena merece patrocínio, e alto, o futebol está na farta lista de distribuição de grifes de seleção titularíssima, feito a Coca-Cola, a Adidas, a Nike, Visa e – salve, salve Primavera Árabe! – o grupo Emirados.

Eles estão preocupados com esse ventilador que anda soprando e espalhando coisa mal-cheirosa: acusações e alegações, se diferença houver entre um e outro, sobre o órgão que cuida dos interesses do – segurem outro chavão – esporte das multidões. O órgão atende pelo nome de Fifa. Trata-se de uma gostosura de organização que cuida dos interesses dos donos do futebol. Ou seja, nada a ver com quem o pratica ou acompanha. Boca riquíssima, papa fina, um verdadeiro banquete segundo acusadores e alegadores. Tudo porque correu a notícia, ou boato canalha, de que a Fifa “vendeu” a realização da Copa de 2022 no Catar. (Dá-lhe, Primavera Árabe!). Para não falar (mas vamos falar, tá bom?) das acusações de próprios Fifeiros graúdos sobre licitações em flagrante impedimento para o local da realização das Copas de 2018 e 2022. Por uma vez, nenhuma acusação ou sequer menção do Brasil em 2014.

Em compensação, é voz geral, arquibancada e cadeira numerada de que países caribenhos andaram pegando, ou tentando pegar, nossos mui conhecidos “incentivos fiscais”. Mal o Barça estraçalhou o poderoso, ou o mais rico time de futebol do mundo, o Manchester United, e já não se fala da magia do argentino Messi. Esse já era, segundo o populacho que compra tablóide sensacionalista. Bom mesmo, celebridade quentérrima, é o suiço Sepp Blatter, de 75 anos, atual dirigente da Fifa, com seus 107 anos de existência e guardiã zelosa dos 208 países a ela afiliados.

Sepp Blatter, nesta quarta-feira, concorre, sem adversário que tenha posto a cabeça para fora, a mais um mandato nesse pastel auto- premiado que é a fofa Fifa. As associações inglesa e escocesa de futebol andaram ameaçando boicote, adiamento devido ao mau tempo reinante, qualquer coisa, mas Sepp desarmou os atacantes todos com a bela jogada de lançar no meio de campo o velho esquema de “crise, que crise?” vai tudo bem, muito bem, pombas! Ou palavras nesse sentido. Não é que colou? Tudo bem estava e tudo bem continuará. Sepp e patrocinadores marcaram o gol da vitória. Vitória por desistência e abandono da possibilidade da contenda.

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MATINAS SUZUKI JR.
Folha de São Paulo, 01/06/1994

Meus amigos, meus inimigos, disse aqui outro dia que há uma safra de livros sobre futebol saindo dos fornos.

Ano de Copa, época de renascimento do interesse pelo futebol aqui no Brasil, graças à qualidade dos jogadores e dos técnicos etc.

Tempos de renovadas paixões pelo futebol. De olhar textos cheirando a estantes, de procurar velhas anotações, de rever teipes e jogos, de dar novos sentidos para os erros e acertos do passado.

Taí uma coisa que talvez seja muito difícil para o Datafolha medir, mas em ano de Copa (e de bom futebol) deve aumentar muito o percentual de devaneios – as “impossibilidades” do poeta – nas cabecinhas brasileiras.

(Se fosse possível mensurar cientificamente o quanto a força deste imaginário pesa para a formação da índole da população de algum lugar, talvez pudéssemos estabelecer uma relação que cobrasse mais responsabilidades sociais e culturais de quem dirige o futebol no Brasil).

Mas, como eu dizia acima, vivemos momentos de esperanças, de expectativas e também de memórias sentimentais – e literárias – do futebol.

O cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, por exemplo, tem umas belas anotações que comparam o “calcio” (o futebol, em italiano), com a literatura.

O texto chama-se “Uma Linguagem de Poetas e Prosadores”.

Foi escrito na época do caloroso debate acadêmico sobre a ciência dos signos, a semiótica. Pasolini usava o futebol como demonstração da poesia e a poética como demonstração do futebol.

Para este cineasta de final trágico — é um daqueles extraordinários artistas que deixam não só a sua obra para depois, mas também a vida vivida — o jogo é também um sistema de signos.

Pasolini dizia que existe o futebol-prosa e o futebol-poesia. Ele dava exemplos de alguns jogadores italianos da sua época (que vou tentar adaptar para melhor compreensão do leitor brasileiro).

Mauro Silva, por exemplo, seria um “prosador realista”; Palhinha, por outro lado, seria um poeta, mas um poeta, ainda assim, realista. Já a constelação poética dos Romários e Deners seria outra: a do poeta “maudit”, extravagante.

Pier Paolo Pasolini supunha ainda que existe uma “zona do agrião” nesta classificação: César Sampaio, por exemplo, que joga um futebol em prosa, mas uma prosa poética, com instantes de clara iluminação da poesia.

(Se fôssemos rigorosos na nossa adaptação, teríamos ainda que criar algumas tipologias como a do jogador-concreto, racionalista, geométrico, essencialista, e aí não há dúvidas: Ademir da Guia).

O cineasta-poeta também dizia que ele não fazia distinção de valor entre as duas formas de se jogar futebol: era apenas uma distinção técnica.

Só haveria um momento exclusivamente, puramente, castamente poético – onde a prosa ficaria de fora: o momento sublime e absoluto do gol.

“Cada gol é sempre uma invenção, é sempre uma subversão do código: cada gol é inelutabilidade, fulguração estupor, irreversibilidade. Próprio como a palavra poética”, escreveu ele.

Pasolini também dizia que a classificação literária valeria para as diferentes escolas de futebol. O futebol europeu seria prosa. O futebol brasileiro, poesia.

“Se o drible e o gol são o momento individualista-poético do gol, isto quer dizer que o futebol brasileiro – ao contrário do italiano, que seria uma prosa estetizante – é um futebol de poesia”, anotou.

Onde está aquele garoto da foto? (por Paulo-Roberto Andel)

Graças à internet, qualquer torcedor pode se divertir e até mesmo com uma quantidade incomensurável de fotos e pôsteres de times de futebol, em todo o mundo. Não é diferente no Brasil, nem no Rio.

Imagine o Maracanã. Quanta gente já jogou ali? São nomes, nomes e nomes. Muitos foram conhecidos e consagrados, outros nem tanto, alguns simplesmente não foram. E quem jogou no maior estádio do mundo num único dia ou noite? Times do interior, times de outros estados, times de menor investimento. Cada um a seu modo, eles viveram a experiência fantástica de subir as escadas dos velhos e maravilhosos túneis do mesmo jeito que Pelé e Garrincha.

Volta e meia me deparo com uma foto de time no Maraca, vejo os jogadores e, se for dos anos 1970 em diante, tenho familiaridade porque tenho sido um torcedor. É um mergulho maravilhoso ao recordar nomes e rostos de jogadores que vi quando criança, ou li nos jornais e na fabulosa Revista Placar. Para a humanidade, 40 anos não são nada, mas para a vida individual é muita coisa, são muitas lembranças. Onde foi parar fulano? E beltrano que morreu? Sicrano mudou para o interior?

Há um tipo de foto que me comove ainda mais: a dos times de juniores, à época chamados de juvenis. Em cada uma delas, você encontra ao menos um jogador conhecido e até mesmo um craque consagrado, ali registrado como um menino desconhecido. Agora, em sua maioria, as imagens mostram jovens que, tão perto do sonho da bola, simplesmente desapareceram e sequer defenderam suas equipes profissionalmente. Nomes desconhecidos, rostos sem identificação. O que foi feito de cada um deles? Muitos jogaram para mais de cem mil torcedores em preliminares dos clássicos, mas não chegaram ao topo da carreira. Outros eram grandes promessas que ficaram pelo caminho. O que será que aconteceu?

Em tempos difíceis, onde o futebol brasileiro está sendo posto à prova pelo escândalo que envolve jogadores e apostas, o que será que pensa aquele senhor maduro que, há quarenta anos, vivia o sonho juvenil do futebol no Maracanã que jamais se tornou uma realidade profissional?

Onde está aquele garoto da foto, além das vagas lembranças da nossa meninice?

Ainda sobre o Fla x Flu (por Paulo-Roberto Andel)

Racionalizando todo o processo, aí está uma parada bem difícil para o Tricolor. Em qualquer decisão, a diferença de dois gols é significativa. Contudo, só até a bola rolar; depois disso, o favoritismo precisa ser comprovado em campo. E se os fatos atuais comprometem a esperança, como a possível escalação do Flu, a história está recheada de superações tricolores que beiram o inacreditável – mesmo!

Por exemplo, fazer três gols no São Paulo tricampeão mundial em 2008 era uma tremenda façanha. Aconteceu. Muita gente não lembra que, para chegar às semifinais do Campeonato Brasileiro de 1991, o Fluminense precisava ganhar os último cinco jogos, perdendo zero pontos – e conseguiu. Nem tão longe assim, lembram do drama de 2010 no Brasileirão? Faturamos no último jogo, na luta. E lá longe, pra gente ganhar de 3 a 0 com o camisa 10 deles perdendo pênalti, em 1979, foi um suor que nunca mais esqueci. Quem se lembra do golaço do Cristóvão? E do Fla x Flu da Lagoa em 1941?

Do outro lado, está o grande rival, que tem vantagem considerável e que não perde um título por três gols de diferença há quase 60 anos.

É fácil? Claro que não. É difícil paca? Sim. É impossível? Não. Eles têm a vantagem que a gente tinha ano passado e confirmou.

Mesmo depois de ter visto a apoteose de Assis, sempre preferi o lado mais sóbrio da coisa, só que futebol vai além disso, muito além, felizmente. Tem magia, crença, passado. Todos os cadáveres vitoriosos querem entrar em campo para decidir. Todos os admiráveis mortos querem torcer feito nunca nas arquibancadas e na geral, também mortas, mas todo mundo vai lá. Um clássico decisivo nunca se resume à obviedade do momento, ainda que ela tenha naturalmente muito peso e não se possa desprezar a ciência.

Falando sobre sobriedade: eu tinha 26 anos, muitos títulos e uma seca monumental no colo quando veio a decisão de 1995. Lembro daquele dia com detalhes. O tempo, a chuva, meu ceticismo. Mas aí fizemos um primeiro tempo devastador e poderíamos ter feito 5 a 0, mas só fizemos dois gols. Na segunda etapa, o Maracanã viveu a tarde mais gloriosa de sua história e o rival, acuado o tempo inteiro, acertou uma bola no travessão, fez dois gols, incendiou sua torcida e tudo, absolutamente TUDO dizia que ia virar a partida, até porque tinha um homem a mais em campo.

Quando eles empataram, boa parte do Maracanã tricolor foi embora. Àquela altura, já era demais esperar pelo desfecho que acabaria acontecendo. Eu, anônimo, formiguinha na multidão, poderia ter ido embora também mas simplesmente não me movimentei. Não acreditava nem desacreditava; na verdade eu estava em choque pelo empate, porque havíamos jogado muito melhor e pusemos tudo a perder em cinco ou sete minutos. E lá fiquei, meio que por osmose.

Foi a decisão mais acertada de toda a minha vida. Aconteceu o apoteótico gol de barriga e, sinceramente, aquilo só se vive uma vez. Fui um dos poucos tricolores a ver tudo aquilo de perto – muitos outros que já tinham saído, voltaram a tempo e viveram experiências ímpares nas rampas do Maracanã. Eu vi gente chorando, vi um senhor de joelhos agradecendo a Deus, vi gente abraçada rolando pelas arquibancadas enlameadas. Anos mais tarde, escrevi três livros sobre aquele dia e aquele campeonato, mas considero que ainda falta alguma coisa.

Por isso tudo, perdi o direito de não acreditar. Mesmo quando tudo parece perdido – longe de ser o caso deste domingo -, eu desejo acreditar. Mesmo quando perebas inacreditáveis estão em campo, eu consigo acreditar. Mesmo quando o time é mais fraco – que também não é o caso de agora -, mesmo quando a política é uma farsa. Em mais de 120 anos, o Fluminense resistiu a um milhão de jogadores, treinadores, dirigentes e até torcedores ruins, feito esses que querem c@g@r regra sobre o que o outro deve sentir ou achar. A camisa já ganhou títulos que fizeram Deus coçar o queixo com as pontas dos dedos da mão.

Por favor, me entendam, não é fuga da realidade – nenhuma! – mas o breve sentimento de quem já viu muita coisa mesmo.

Já se passaram quase trinta anos daquele gol de barriga. O mundo mudou, o Maracanã também. Tudo mudou. Escalação é coisa muito séria para uma decisão e acho que Fernando Diniz deveria pensar nisso. Não se ganha um título só com as glórias e superações do passado, de jeito nenhum. Com o rival que temos, precisamos entrar com voo rasante em campo. Não há outra saída, mesmo com a possível escalação extraterrestre.

Agora, se abrir a cortina do passado é bom presságio, importante dizer: não são nem nove da manhã, está chovendo paca e o Fluminense não vive só de 1995. Tem 1973 também, debaixo de uma chuvarada, recentemente relembrada em livro.

Para muitos, agora é rezar. Eu vou com o patrono Chico Buarque: “minha cabeça rolando no Maracanã”.

Estão rolando os dados. Vamos ver no que dá. De toda forma, entendo que você não acredite por mais de uma razão. Entendo e respeito. Eu é que perdi o direito de não acreditar, compreende?

@pauloandel

CRB, Operário, as letrinhas e o goleiro Quebrangulo (por Paulo-Roberto Andel)

Dez para as quatro da manhã. Acordo e percebo que não desliguei a TV. A grama não deixa dúvidas: tem futebol no bom e velho videotape. A maravilhosa Copa do Brasil, o campeonato que mais gosto de ver. Muita coisa no futebol piorou com o tempo, mas se tem algo bom hoje em dia é poder ver todos os times, seja pela TV ou internet.

De cara, reconheço o CRB e levo algum tempinho para identificar o Operário de Mato Grosso do Sul. O jogo está corrido, parece disputado. Aí é que olho para o alto esquerdo da tela e descubro que o alvirrubro alagoano está disparando uma goleada: CRB 5 a 0. Casa cheia.

O comentarista acaba falando do grande rival nas Alagoas, o CSA, que está de fora da fase final do certame local. Alagoas, a terra do time das letrinhas: CRB, CSA, CSE, ASA. Como era bom ler o Tabelão da revista Placar com as súmulas dos jogos e até os escudinhos para os jogos de botão.

Falando em CSE, vem um nome inesquecível da minha juventude: o goleiro Quebrangulo, que chegou a ganhar prêmio no Fantástico por sua atuação, e que infelizmente morreu afogado. Além dos campos, houve também uma situação heróica de Quebrangulo salvando pessoas, não me lembro ao certo se foi na ocasião da morte ou antes. Bom, em sua cidade local existe o garboso Estádio Goleiro Quebrangulo.

O CRB, alvirrubro, joga com números pretos na camisa listrada. De onde será que vem o preto? Antigamente o Atlético Mineiro jogava com números vermelhos em sua camisa alvinegra. Noutras ocasiões, trocava o vermelho pelo amarelo. E falando em Atlético, minha cabeça voa para o Paranaense, que agora é Athletico e tem um escudo diferente do de todo mundo. Antes, era redondinho e antes do antes era igualzinho ao do Flamengo. Aliás, a camisa do Athletico também era igual à do Fla, com as listras horizontais, que depois viraram verticais.

E o Operário? Sempre será lembrado pela brilhante campanha do Brasileiro de 1977, quando chegou às semifinais e tinha no gol o veterano Manga (que depois jogaria pelo Grêmio, deixando seus fãs colorados ensandecidas), além de Roberto César, que depois faria história no Cruzeiro.

Acaba o VT do CRB, entra Ituano versus Ceará. Num estalar de dedos, vem o momento mais nobre do futebol: a disputa de vagas em cobranças de pênaltis. Tirando quando é com meu time, é bom demais. Impossível não ter emoção e, em muitos casos, vêm as surpresas. O futebol é cinema em sua essência mas, numa disputa de pênaltis, ele é teatro puríssimo. Ribalta, drama e emoção. Deu Ituano, o pessoal comemorou paca.

Atlético Goianiense e Volta Redonda. Eu digo que é bem estranho ver o querido Voltaço todo de branco, apenas com os detalhes aurinegros na beirinha da manga. Tudo bem. Essa eu já sabia: deu de novo no fascinante ballet da morte nos pênaltis. E deu Volta Redonda. Junto com o Nova Iguaçu, pela primeira vez duas equipes do segundo escalão econômico do Rio chegam à terceira fase da Copa do Brasil. Muito legal. Ano passado a Portuguesa fez bonito.

Pego um copo de refresco de pêssego, tomo os remédios para pressão, deito e só então me dou conta de que desabei de sono após Vasco e ABC. Numa noite ingrata para os vascaínos, o time potiguar – e também das letrinhas – aprontou e tirou o Cruz-maltino da Copa do Brasil em pleno São Januário, também no drama dos pênaltis. Meu amigo Catalano xingou o time, alguns jogadores e o árbitro, por motivo justo. Certas coisas não mudam nunca.

Hora de mais um cochilo antes do trabalho. Cinco e vinte da manhã. A bola ainda pega fogo no VT de Volta versus Goianiense. Pouco importa o jogo ou os atletas individualmente em si: fato é que a Copa do Brasil é instigante demais, maneira demais. Daqui a pouco o Catalano vai acordar e xingar tudo de novo, mas já estaremos ligadíssimos no Carioca e loucos para nos encontrarmos na final Vasco e Fluminense. Assim seja.

Onde quer que esteja, que Quebrangulo esteja em paz.

@p.r.andel

Dia de Seleção (por Paulo-Roberto Andel)

Quinta, dez pras duas. Lanchei, suei, chorei, tomei banho, jantei bem e fiquei pensando. Marina parou de responder o WhatsApp, deve ter adormecido. Ela trabalha amanhã, ficarei sozinho. Nos últimos tempos, o que eu mais faço é ficar sozinho. As pessoas estão nos smartphones, geralmente muito ocupadas.

Desde aquele dia de muitos anos atrás, com o mar de papel picado que vi na rua em 1978, Brasil 0 x 0 Argentina, lá se foi uma vida. Quarenta e quatro anos.

Vários amigos daquele tempo estão longe ou infelizmente mortos. Meus pais se foram. Tanta, tanta gente. Tem saudade, melancolia e tristeza também.

Nunca é só um jogo, mas jogos e jogos e jogos que vão se acumulando. O garoto Ardiles é um respeitável setentão. Beckenbauer também. Sepp Maier.

Leão, Nelinho, Amaral, Edinho. Jorge Mendonça e Toninho foram embora. Coutinho, Telê, Valdir Peres, o espetacular Sócrates.

Minha vida é longe de ser tranquila, mas nela o futebol é uma presença permanente. É muito bom. Sem o futebol, tudo ia ser muito mais difícil.

A gente vai contando o tempo em Copas. O Sarriá já ficou longe, o México também. A divertida Copa da Itália no Edifício Pampeiro – o Brasil massacrou a Argentina, acertou três bolas na trave e foi eliminado. A Holanda foi eliminada no mesmo dia. Eu era calouro da UERJ.

Sei muito bem que a Copa no Qatar foi um erro, que merece todas as críticas, que não podemos tolerar uma série de coisas. A gente sabe. O mundo tem que melhorar. E as pessoas que se consideram “mais politizadas” precisam aprender que há muita gente politizada apaixonada por futebol, e que sabe melhor do que ninguém onde estão os baixos mundos do esporte. Ninguém é evoluído politicamente por desprezar uma paixão que mobiliza bilhões de pessoas.

São duas da manhã. Eu sinto saudades da Copa da Argentina, não pela ditadura horrenda daquele país, mas por causa de Tarantini, Fillol e Mário Kempes, da fantástica Holanda e do Brasil. Eu tenho saudades de Lato e Trésor. Saudades de colar os escudinhos nos botões, de jogar amistosos com Fred e Floriano, o Luís Fernando também.

O Brasil vai entrar em campo e rememorar os grandes heróis dos anos 1930 e da Copa de 1950 – seleção que sofreu e sofreu muito, sem justiça. Voltar no tempo em que nem Copa havia, como no Sul-americano de 1919 nas Laranjeiras. São muitas histórias numa só.

Daqui a algumas horas eu não vou apenas ligar a TV e ver a estreia do Brasil na Copa do Mundo diante da Sérvia. Não. Mais do que isso, o que vou fazer é pedir ao tempo uma esmola, uma migalha, um golinho dos melhores anos da minha vida. Tempo, esse marcador implacável que sempre vence. Quando somos crianças, o mundo é nosso.

Em 1978 eu tinha uma coleção de tampinhas de Coca-Cola com as carinhas dos jogadores. Ainda não tinha uma mesa de botão. Minha mãe me deu dinheiro para comprar uma cartolina verde, acho que dois cruzeiros. Fiz as linhas do gramado com caneta Bic azul e régua. Na falta de um transferidor, eu fiz as meias-luas e o círculo central com a base de um castiçal que até hoje está aqui em casa. Era um campo pobre, simples, mas bem bonito e desenhado. Posso vê-lo agora com o papel picado sendo jogado pelas janelas de Copacabana.

Agora deu para entender o que eu estou procurando às duas e meia da manhã?

@pauloandel

Está chegando a Copa (por Paulo-Roberto Andel)

Parecia tão longe que ainda demoraria muito, mas o tempo é implacável e aí está a Copa do Mundo, diante de todos os corações. Começará em menos de quinze dias e trará de volta um turbilhão de emoções para todos que amam o futebol.

Eu olho para trás e penso nas Copas que vivi. Uma Copa do Mundo sempre tem muitas Copas do Mundo nas costas, uma bagagem especial.

Nós sonhamos em reviver nossos melhores momentos sempre. Agora mesmo me divido: a criança vendo a chuva de papel picado na rua em 1978, o menino vendo os golaços do Brasil 1982.

E os grandes jogos? E os craques? Quem serão os verdadeiros protagonistas do Mundial do Catar?

Será que vamos ter outra “Mano de Dios”?

Quem vai ser o novo Gordon Banks, voando baixo para fazer o impossível?

Sonhos de um futebol mágico e eterno, tal como o de Garrincha no Chile, acertando o possível e o impossível. Quem sonhará?

Ou aqueles malucos geniais e maravilhosos da Holanda, trocando passes e trocando de posição, deixando os adversários embasbacados a todo instante? Ou ainda mais longe, do super timaço da Hungria em 1954?

A Copa é eterna. Ela abre a cortina. Falei aqui de lances que vi na TV muito depois de terem acontecido, bem como outros que sequer vi ao vivo, só ouvi falar. Tudo fica muito vivo, pulsante.

Estão abertas as vagas para o grande espetáculo do futebol na Terra. Estamos à espera de grandes lances definitivos, de jogos para se sentir o coração na boca. Uma coisa é certa: durante um mês, todos os corações do mundo vão perseguir o sonho do futebol. Bares cheios, churrascos, tevês cercadas por olhos atentos. Seleções clássicas e humildes. Jogos simples e apoteóticos. O sonho, o drama, a paixão.

Se não der pra rever o fantástico Pelé atormentando os goleiros Viktor e Mazurkiewicz, que seja o Ronaldinho fuzilando Oliver Kahn. Cercado de jovens, o já veterano Neymar terá sua oportunidade derradeira. Thiago Silva, decano de quatro Copas, também.

O sonho brasileiro da Copa é igualzinho àquela tarde já distante de 1994, quando Jorginho fez um cruzamento perfeito e Romário, sempre ele, subiu três metros de altura para cabecear de forma indefensável, deixando o goleiro sueco Ravelli sem pai nem mãe. A seguir, Romário abre os braços, seguro da vitória imortal, e a gente faz um país, daqueles que casam a voz de Marina Lima com os versos de Antônio Cícero.

Está chegando a Copa!

@pauloandel

Bic, cartolina e futebol (por Paulo-Roberto Andel)

Saí do trabalho, passei pelas ruas tristes que só tinham algum alento por que os flamengos estão nas calçadas – eles já comemoram! -, e resolvi passar na pequena papelaria da rua dos Inválidos para comprar uma caneta Bic.

Volta e meia faço isso. Minhas canetas somem. E também porque papelaria é um dos melhores lugares do mundo: olhe para a cartolina, a cola e logo você estará de volta ao melhor de todos os mundos – a infância.

A Bic traz de volta meu pai, que tinha uma letra bem bonita, trabalhada, e estava sempre anotando coisas, de lista de compras a tarefas do dia. Traz a mim mesmo, sonhando em passar no vestibular e estudar na UERJ – fui pra lá por amor, eu a queria desde garoto. Às vezes no corredor do estádio, olhava para o pavilhão e dizia “Um dia eu vou estudar ali”. Acabei indo.

Há 44 anos, eu comprava uma cartolina para desenhar meu estádio de futebol de botão. Ainda não tinha um Estrelão. Meu time do Fluminense tinha Wendell ou Renato, Miranda, Edinho, Rubens Galaxe, Doval, Rivellino, Paulo Emílio, Sebastião Araújo. Botões Gulliver lindos, verdes, com o escudinho do Flu pintado em fundo amarelo.

Daqui a pouco vai ter decisão no Maracanã, o mundo todo vai olhar para lá. Em condições normais eu estaria na velha arquibancada de concreto, mas quem comanda o meu time não deixou, se é que me entendem. Vida que segue.

Saio da papelaria, penso na escola que foi derrubada, nos professores todos mortos, nos colegas que nunca mais vi. Há uma longa caminhada daqueles dias até aqui. Muito longa, tão longa que o Maracanã teria 150 mil pessoas mas vai se consolar com 60 mil – e o povão, aquele povão que eu encarei de frente em Fla-Flus inesquecíveis, agora se esconde em casa ou espia a TV em biroscas para acompanhar seu time. É tudo muito diferente dos tempos dos botões verdes.

Nessa terra tão triste e devastada, que convida ao suicídio, o futebol é importante demais. Quanta gente tem no futebol sua única distração e alegria? Pode ser TV ou rádio, pode ser pelo celular, todo mundo está acompanhando o jogo.

Agora é jantar uma macarronada, deixar de lado o desespero das eleições, não pensar nas dívidas asfixiantes, descansar um pouco e ver o jogo. Claro. Adoro futebol e sempre tenho lado. Não confio em gente que não tem lado em futebol, que só não é pior do que o Zé Ovo dizendo “Não acompanho nada que não tenha o meu time” – não passa num detector de mentiras, coitado.

Nem sei se está tendo confusão no Maracanã agora, e é possível que sim, mas do nada me bateu saudade daquele estádio com cento e tantas mil pessoas, onde eu era um garotinho encantado com as bandeiras, o pó de arroz, o placar de maravilhosas lâmpadas e um monte de craques em campo. Aquilo era extremamente mágico e, se escrevi milhares de páginas sobre futebol, foi por causa da infância inesquecível.

Vou jantar. Que seja uma rara noite de paz nessa terra. Que seja uma noite de diversão para muita gente, sem ódio, sem a cólera doentia que alguns insistem em mostrar nessas ocasiões.

O anfitrião tem a faca, o queijo e o resto na mão para ser campeão no Maracanã – e, por isso mesmo, como ensina a história dos visitantes no campo imortal, tá bem arriscado da Fiel urrar num delírio. Eu vou de 13! Secar é uma das coisas mais divertidas do futebol.

Vai, Corinthians!

@pauloandel

SAF pode virar tendência no futebol brasileiro (por Robertinho Silva)

Depois de Botafogo, Cruzeiro e Vasco terem aderido o modelo da SAF, foi a vez do Bahia. O Tricolor da boa terra fechou recentemente uma parceria com o Grupo City, que tem como carro chefe o Manchester City da Inglaterra.

Outro que também sinalizou com a possibilidade de aderir o modelo da SAF, é o Atlético Mineiro. Porém, diferente da situação de outros clubes que passavam por turbulência financeira e falta de resultados esportivos, o Galo mineiro busca no clube empresa apenas uma parceria para se manter no topo. Apesar de a dívida do clube ultrapassar 1.2 Bi, o clube tem totais condições de equacionar.

O órgão colegiado composto pelos 4Rs (Rubens e Rafael Menin, Renato Salvador e Ricardo Guimarães) trabalha para manter, no mínimo 40% das ações, pois assim, o Atlético (associação) ainda seguirá como dono único de seus patrimônios (clubes sociais, Arena MRV e Cidade do Galo) podendo até negociar fatias no futuro. Os mineiros chegaram a ter conversas com o Grupo City, com Fenway Sports Group e com presidente do PSG, que possui ligações com o governo do Catar, mas as tratativas não avançaram.

Nas grandes Ligas da Europa, é comum os clubes serem administrados por empresas ou fundos de investimento. No futebol espanhol, boa parte dos clubes formados por associações civis estavam em situação calamitosa, pois tinham dívidas com o governo significativas e refinanciamentos estatais desses débitos fracassados. A “Espanholização”, que tem como pilar a MP984 praticamente assassinou a indústria do futebol pelos gramados espanhóis, pois 75% dos direitos de transmissão eram concentrados na dupla Real e Barça.

Foi neste cenário que o Governo Espanhol resolveu intervir. Em 2015, foi aprovada a Lei que regulava as vendas dos direitos de transmissão do futebol. A intervenção estatal classificada como “urgente” definiu a venda centralizada dos direitos de transmissão semelhante ao modelo Premier League. Em paralelo a isso, os clubes foram obrigados a virar empresa, pois assim, permitiriam a compra de ações. Isso fez com que os clubes se tornassem uma máquina de arrecadação, diminuindo as disparidades, e tornando o mercado estável e competitivo.

O Mallorca por exemplo, é administrado pelo americano Robert Sarver, dono também do Phoenix Suns da NBA. O Ex armador da equipe, o canadense Steve Nash é um dos acionistas do Mallorca. Barcelona, Real Madrid, Osasuna e Athletic Bilbao ficaram fora da obrigatoriedade de virar empresa, pois possuem modelos associativos bem consolidados, no qual a participação no capital do clube fica nas mãos dos sócios, e não de uma só pessoa ou grupos de investimentos.

Na Inglaterra, o final da década de 80 e início de 90 foi marcado por trocas nas propriedades de clubes. Ao contrário do Brasil, os times já tinham donos, mas eram empresários locais. Quem chegou ao país foram milionários de outros países, especialmente dos EUA, onde já estava consolidada uma indústria lucrativa de outros esportes. A formação da Premier League foi impulsionada por um grupo de cinco clubes —Everton, Manchester United, Liverpool, Arsenal e Tottenham. Atraídos por eles, os clubes de primeira divisão romperam com a Football League, que controlava todos os campeonatos, para criar uma liga independente que centralizaria todos os direitos de TV, patrocínio etc.

O fato de empresários que visavam o lucro serem donos nos principais clubes foi essencial na busca por um novo modelo. Seu objetivo, como em qualquer indústria, era maximizar as receitas de sua empresa. Para isso, precisavam reformar como o futebol se organizava e como passaria a ser comercializado. Logo de cara, fizeram uma concorrência que aumentou significativamente as receitas de televisão. Não havia mais espaço para a politicagem.

No Campeonato Mexicano a MP 984 também deixou marcas profundas. Muitos clubes chegaram a decretar falência. O rebaixamento teve que ser suspenso por 6 temporadas. Foi neste cenário que muitas das equipes resolveram adotar o sistema de franquias, tão comum nos esportes americanos. De toda a elite do futebol local, apenas o Pumas não tem um dono e é constituído por uma associação civil.

A forte presença de empresas privadas fazem o campeonato ter mais de 180 jogadores estrangeiros, cerca do triplo do Campeonato Brasileiro. Atletas sul-americanos são a maioria. “Os mexicanos pagam em dólar e a mudança do câmbio nos países sul-americanos aumentou a atratividade”, explicou o empresário Marcelo Robalinho, que atua no mercado de transferências há mais de 20 anos. Do ponto de vista esportivo, a presença de estrangeiros também eleva o nível da competição. “Aqui, a maioria (dos jogadores) é convocado para as seleções de seus países. O futebol jogado aqui é muito rápido. Eu, particularmente, evoluí muito nesse quesito de jogar mais rápido. O Campeonato Brasileiro é um pouco mais lento. Aqui é mais rápido, jogam bastante com jogadores abertos, rápidos”, afirmou ao Estadão o volante Rafael Carioca, titular do Tigres.

No futebol italiano, a SAF do Milan comandada pelo grupo americano Elliot Management é o melhor case de sucesso. Os rossoneros se encontravam em uma dívida milionária de 200 milhões de euros quando o chinês Li Yonghong comprou o clube do então antigo dono Sílvio Berlusconi. Para piorar, ainda teve uma debandada dos investidores do clube.

Diante da pressão de salvar a instituição da falência, o fundo americano precisou fazer uma escolha; ou seguia os anseios da torcida por ver o Milan de volta as glórias ou equilibrava as contas. O clube rossonero optou por equilibrar as contas, o que mostra que não é só o dinheiro que irá resolver o problema dos clubes, mas sim, um conjunto de ações que levarão a eficiência. Um clube precisará gastar menos e arrecadar mais.

No futebol existem atalhos, mas são mais caros. Por isso eu digo que scouting é o principal caminho. Em mercados mais maduros, onde tem liga, como por exemplo a Premier League, a correlação entre salários e investimentos total, compensação, atletas, bônus, valores de transferência e resultados esportivos é altíssimo. Ou seja, a correlação é muito alta e isso torna o jogo muito competitivo e muito caro para brigar entre as três ou quatro posições. Por isso, o único jeito de mudar o jogo é através de scouting.”, afirmou o CEO Jorge Braga, fazendo uma referência ao sucesso desportivo do clube italiano.

Segundo Braga, o scouting não deve servir apenas para fazer contratações, mas principalmente conseguir um resultado esportivo desproporcional ao investimento que é feito dentro da folha salarial de atletas.

“É especialmente para desenvolvimento de performance e aumento de valor. Ter bons olhos e bons números para contratação é bom, mas o que ganha jogo é poder evoluir a performance individual e pontual e naturalmente expandir o valor dos direitos econômicos e dos jogadores. Isso faz muito a diferença”, completou.

A profissionalização do futebol, como aconteceu com o Milan, vai demandar uma enorme mudança cultural dos brasileiros. Encontrar o equilíbrio entre o fluxo de caixa e a paixão do torcedor não é uma tarefa simples. Os apaixonados não têm paciência para se comprometer com o médio e o longo prazo. Haverá a necessidade, de parte dos clubes, de muita habilidade para comunicar aos associados a estratégia e a sua viabilidade. Transparência e maturidade dos dirigentes, aqui, farão a diferença; ao mesmo tempo que contratos bem firmados com as SAFs, resultantes de negociações feitas à luz do sol”, projetou.

Acredito que as SAFs no Brasil terão dois papéis importantes; um é a questão da formação da Liga, fazer o futebol ter uma visão mais empresarial. O outro, é a profissionalização das gestões dos clubes, que em maioria ainda são perdulárias e amadoras. Os clubes nas mãos de investidores terão propensão a uma maior qualidade de administração.

A grande questão é como cada clube vai gerir os gastos, como farão pra ter equilíbrio entre a parte comercial e o sucesso esportivo.

Tivemos casos de clubes que aderiram ao modelo da SAF e decretaram falência. O Málaga da Espanha foi adquirido por um xeique que pouco tempo depois desistiu do negócio. O time foi rebaixado para segunda divisão e acumulou dívidas.

O Parma da Itália, que por muito tempo foi gerido e bancado pela Parmalat, decretou falência e por conta das dívidas deixadas precisou ser refundado com um novo nome e na última divisão do Futebol italiano.

Muita gente fala em Profissionalização da Gestão, mas será que estão dispostos a pagar o preço? Os cases de sucesso mostram que a consistência vence a conveniência.

Um jogo nunca é um jogo só (por Paulo-Roberto Andel)

Sábado passado, cheguei ao Maracanã com meu amigo Marcelo e fomos para a arquibancada hoje chamada de setor Norte, nem sempre aberta.

Quando me sentei na cadeira, olhei para a frente e me deparei com a massa de gente do Fluminense, por todos os lados. Tudo bem, o Maracanã de agora não é o de antigamente, mas o que importa é que, nas circunstâncias atuais, o que sobrou do velho estádio estava lotado.

Às vezes eu espio as arquibancadas e vejo o que já não existe: a velha arquitetura com cadeiras na parte de baixo e a inesquecível geral. Tudo se mistura. Não é loucura, mas a memória que transborda e que parece tão viva fisicamente, por maior que seja a ilusão.

Cadeiras abaixo, o pai brinca com seu pequeno filho que ainda descobrirá o mundo do futebol, das lágrimas e alegrias às vezes simultaneamente. Outro dia mesmo era eu quem brincava com meu pai, mas acreditem: quarenta anos passam rápido demais. Por um instante, sei que ser órfão é um tiro no peito, não importando a idade, mas a maturidade me regenera em instantes.

Eu estou num jogo e venho para ver a despedida de um ídolo do meu clube, para ver o ballet da vida que a minha torcida vai proporcionar, mas ao mesmo tempo reencontrar meu passado. São muitos e muitos anos, são vitórias inesquecíveis com derrotas idem. A perfeição não existe; a vida, sim.

Perto de mim, garotinhos esbugalham seus olhos antes do jogo porque esperam o último ato de Fred, o maior ídolo de todos eles. Eu era um garotinho quando Rivellino foi embora, depois Wendell, depois Edinho e Cláudio Adão, sei o que é aquilo. Minha única vantagem é ser testemunha de que tudo passa, que a máquina do tempo não para e que os ídolos precisam passar para que venham novas sementes a germinar o futebol.

[Afonsinho, um dos maiores jogadores de seu tempo, encerrou a carreira no Fluminense em 1981. Ainda jogava muito. Ganhou várias notas 10 dos jornais em seus três meses de Laranjeiras. Isso já passou de quarenta anos.

No novo Maracanã, a torcida tricolor poucas vezes encheu o estádio. As campanhas não ajudaram, nem a escassez de títulos, mas alguma coisa mudou. O futebol é outro, o povão está alijado do estádio, as pessoas estão empobrecidas e há muito sofrimento.

O sábado foi mais do que agradecer a Fred ou testemunhar o fim de sua carreira. Para pessoas como eu, que já viram e viveram muita coisa, que estão mais próximas do fim do que do começo, a arquibancada repleta de três cores foi o reencontro com minhas raízes, com o que vivi ali por muitos e muitos anos.

Apesar de todas as dificuldades e dos tempos modernos, o futebol ainda faz com que sessenta mil tricolores compareçam ao Maracanã. Dá a certeza de que ainda estamos muito vivos, tal como em tantas e tantas ocasiões que agora parecem tão distantes.

Meu momento culminante foi com a entrada do time em campo. Os tanques de fumaça criaram uma espessa nuvem branca que aos poucos subiu, cobrindo tudo. A gente sabe que não era, mas parecia demais o velho e bom pó de arroz que cativou milhões de tricolores para sempre. Olhei para baixo e vi a multidão alucinada na geral imaginária. Olhei para o lado e vi meu pai balbuciar alguma coisa enquanto apertava minha mão. Na impossibilidade daquela fantasia, o Marcelo presente também ao lado trouxe o conforto que a gente precisa quando se sente só no meio da multidão.

O Fluminense venceu, Fred se despediu, teve celebração e homenagem, a torcida saiu feliz. Os garotinhos de 2022 já procuram pela próxima partida. Ainda tensos com a saída do ídolo, eles esperam pelos novos jogadores que possam arrebatar os corações em três cores. A fumaça dos tanques não é o pó de arroz, mas aquele momento mágico nos fez sentir como se estivéssemos nas nuvens.

Um jogo nunca é um jogo só. São muitos e muitos jogos. Os corações mais atentos sabem que, num Maracanã lotado, o passado e o presente andam de mãos dadas.

Brasil 2 x 3 Itália, 40 anos depois (por Paulo-Roberto Andel)

Tudo ainda está muito vivo em minha memória. Eu tinha treze anos e o mundo pela frente. Desde 1981 o mundo se curvava ao talento da Seleção Brasileira, lotada de craques e com atuações inesquecíveis.

Acordei cedo e fiquei na expectativa do jogo. Pela primeira vez eu não iria ver uma partida da Copa em casa. Meu amigo Ivan, também meu vizinho de prédio, me convidou para ver em sua casa. Éramos nós dois mais a irmã dele, a prima e a mãe.

Começou tenso, porque a Itália logo marcou um gol numa cabeçada de Paolo Rossi, mas o Brasil também deu o troco com um jogadaço de Sócrates, o Doutor, a fera cerebral do Brasil com seus toques geniais de primeira e de calcanhar. Gritamos no empate mas estávamos tensos. Por outro lado, o Brasil tinha acabado de dar um baile na poderosa Argentina, o que aumentava nossa confiança.

Houve um branco, a Itália se aproveitou e fez 2 a 1. Paolo Rossi outra vez. Ficamos em silêncio, mas havia muito tempo ainda. Tínhamos a melhor seleção do mundo, precisávamos ter calma e confiança.

No intervalo comemos biscoito e tomamos Coca-Cola. A cada mordida e gole, dava para sentir certa apreensão. O Brasil não perdia um jogo há um ano e meio, era o favorito, brigava de igual para igual. A gente ia empatar o jogo.

Atacávamos, mas o gol não saía. Eles respondiam, tínhamos medo. Acompanhamos tudo em silêncio frente à pequena televisão. E foi aí que Falcão puxou a bola na frente da área e marcou um golaço! Explodimos. Nosso silêncio desabou em meio à comemoração. Os fogos explodiram na vizinhança. Copacabana inteira não gritou pelo gol, mas deu um urro que misturava alívio, dor e esperança.

Rimos e nos abraçamos. O Brasil se encaminhava para as semifinais da Copa da Espanha.

O problema é que o roteiro seria totalmente diferente das nossas expectativas. Veio um escanteio. Uma bola de longe chutada torta e – como assim? – acabou em gol. Gol. O terceiro gol. Gol da Itália. Paolo Rossi de novo, logo ele que tinha o nome parecido com o meu, me dando um castigo daqueles.

Da saída do meio de campo até o último apito de Abraham Klein, a gente só fez ruídos para respirar. Sabíamos o que nos esperava. A janela oferecia um silêncio de cinco mil cemitérios numa segunda-feira à noite. Ficamos tão congelados que nem pulamos quando Zoff fez grande defesa em cabeçada de Oscar, nem quando a Itália marcou o quarto gol, que acabou anulado.

Quando o jogo acabou, tive a reação que uma criança teria num dia de feriado: chamei o Ivan para irmos jogar bola na Lagoa. Ele topou. Combinamos de nos encontrar na rua em dez minutos. Então me despedi da prima, da irmã e da mãe, todas muito silenciosas, e fui rapidamente em casa, onde o silêncio de meus pais era também profundo. E depois de tantos silêncios, entendi que a mais profunda das tristezas nem sempre vem com sons.

Pensando na casa do meu amigo e na minha, aí chorei sozinho no elevador Atlas branco para dez passageiros. Os oito andares pareciam quinhentos. Me recompus, estava sozinho, ninguém me notou na portaria. Logo encontrei o Ivan e fomos chamar mais amigos para o futebol na casa de cada um – os telefones eram raros. Sozinho, pensei: perdemos 1982 mas vamos ganhar 1986. Sonho de menino.

Juntamos uma turma e fomos para a Lagoa a pé. A rua estava deserta. Não havia carros nem ônibus. Não havia pedestres. Nas portarias, não se via os porteiros. Éramos um grupo de garotos atravessando uma Copacabana fantasma, como se tivesse sido abandonada por seu povo. Descemos a Tonelero, atravessamos o túnel, seguimos pela Pompeu Loureiro e tudo era o silêncio de desolação, mas a gente carregava para sempre o amor pelo futebol.

Quarenta anos depois, eu continuo perseguindo o futebol. Demorou, mas vi o Brasil ganhar duas Copas do Mundo. Vi milhares de jogos e dezenas de milhares de jogadores. O futebol ainda é muito importante na minha vida, é uma presença diária. Mas o que penso daquela tarde de quarenta anos atrás é que, de algum jeito, aquilo mudou o jogo que tanto amo e a mim mesmo para sempre.

O futebol ensina muitas coisas. Não se pode vencer todas. Nem sempre o melhor vence. Nem sempre o melhor é tão melhor. Às vezes, o pior é muito melhor do que podemos imaginar. A Itália naquele dia foi melhor e depois se tornou uma merecida campeã. O Brasil perdeu, mas o sonho daquela seleção que encantou o mundo por um ano e meio foi tão forte que, hoje, quarenta anos depois, seu desenho de beleza e poesia ainda está entre nós. O Brasil de 1982, a Holanda de 1974 e a Hungria de 1954 são provas vivas de que há seleções condenadas à eternidade mesmo sem título.

Assim, volto ao velho elevador Atlas e me sinto livre para o choro, o mesmo dos meus treze anos.

@pauloandel

A sinergia vascaína (por Robertinho Silva)

Os torcedores do Vasco têm dado show nas arquibancadas. A sinergia entre time e torcida tem sido o ponto alto da campanha do time de São Januário. Para se ter uma noção, na temporada passada o Gigante da Colina somou 49 pontos em 38 jogos, enquanto que nessa temporada, o clube soma 30 pontos em apenas 14 jogos, é vice-líder e a sete pontos do quinto colocado.

A torcida parece ter compreendido o momento do clube e demonstra apoio incondicional onde quer que o Vasco jogue. Dentro de campo, um time de operários, que amam a disputa e não fogem da luta. As atuações não são brilhantes, mas são eficazes, o que falta de inspiração, sobra de transpiração.

Após a última vitória sobre o Operário por 3 a 0, o meia Nenê falou dessa sinergia entre clube e torcida; “A gente parece que é um só. Eles enxergam nossa vontade de ganhar o jogo. A gente está vendo que eles estão dando a vida por nós apoiando o tempo inteiro. Realmente muito feliz com essa vitória de hoje. Eram três pontos muito importantes para a gente seguir o nosso caminho e seguir a passos largos para o nosso objetivo.’’

A torcida do Vasco também deu show em São Januário com a faixa “Respeito, Igualdade e Diversidade” em homenagem a causa LGBTQI+.

Embora tenha conseguido o placar de 3 a 0 sobre o Operário, o Vasco passou por momentos de aflição na partida. O time paranaense criou chances perigosas, obrigando o goleiro Thiago Rodrigues a fazer boas defesas. Neste momento, foi que o torcedor cantou a plenos pulmões e jogou junto com o time. Os vascaínos fizeram arte sem instrumentos se valendo apenas da batida do coração.

O Gigante da Colina vem fazendo o que dele se espera, ainda mais se tratando de uma das maiores disputas de todos os tempos na Série B. O nível técnico da competição não tem sido dos melhores, mas tem sobrado emoção, garra, disputas acirradíssimas.

A boa fase vascaína tem alguns ingredientes que acho que valem a pena salientar. O primeiro deles, é a mudança de perfil do elenco em relação ao ano passado. Em 2021, havia um grande número de jogadores que tinham status no futebol, boas passagens por outros clubes. Mesmo que eles não estivessem no auge de suas performances, existia uma ideia que tudo sairia ao natural e o Vasco conseguiria o acesso. Neste ano, muitos jogadores nunca tiveram oportunidades em clubes grandes, muitos estão em busca de um destaque em cenário nacional.

O segundo ingrediente é o fato de alguns jogadores deste atual elenco serem torcedores vascaínos desde a infância, casos do zagueiro Anderson Conceição, do volante Yuri Lara e do lateral Weverton.

O último ponto de destaque para mim, é o fato de a maioria desses jogadores do Vasco terem experiência de já terem jogado a Série B. Incorporaram com facilidade a postura que a competição exige.

Acredito que todos esses fatores, podem ajudar o Vasco a conseguir o acesso.
O Gigante da Colina está no caminho certo. No embalo da torcida, tem tudo pra conseguir esse acesso.

Foto: Daniel Ramalho/CRVG

Dinizismo assina supremacia tricolor (por Robertinho Silva)

Os números estatísticos da partida entre Fluminense e Botafogo comprovam a superioridade tricolor. A equipe comandada por Fernando Diniz teve mais posse, finalizou mais vezes sem se preocupar com os riscos que a postura ofensiva poderia oferecer. O Botafogo recheado de desfalques adotou uma postura mais defensiva, postura também adotada por outros clubes (América Mineiro, Juventude e Flamengo) sem muito sucesso. Isso porquê o Time de Guerreiros conseguiu encontrar espaços na defesa do time do português Luís Castro, que adotou um 5-4-1.

O Time de Guerreiros fez uma partida muito próxima da perfeição. Preencheu bem os espaços, jogou com intensidade, marcou no campo de ataque, fez um jogo vertical e de muita aproximação entre os setores. Um verdadeiro nó tático. O herói deste domingo foi o zagueiro Manoel.

Na humilde opinião deste que vos escreve, o Botafogo tentou jogar mais recuado, preencher os espaços entre as linhas, e apostava em uma transição rápida para surpreender o adversário. A ideia inicial até era boa, mas na prática, esbarrou nos expressivos méritos do Fluminense, que executou muito bem a ocupação de espaço, na pressão ofensiva e na recomposição defensiva.

O Fluminense assumiu os riscos dessa postura mais agressiva, diante de um oponente que saiu fortalecido de uma situação muito mais controversa na rodada passada diante do Internacional. O “Dinizismo” é 8 ou 80. Com certeza em algum momento fez o coração do torcedor acelerar e quase ter um infarto naquelas saídas de bola perigosíssimas. Porém, já fez o torcedor abrir um largo sorriso quando a jogada foi bem executada, vide a jogada que resultou em gol contra o Palmeiras no Allianz Parque.

As ressalvas que alguns da crônica esportiva especializada tinham com relação a Diniz, muito era por conta dos resultados. As boas ideias do técnico, nunca foram condizentes com os resultados. Em 2019, o treinador deixou o Fluminense perto da zona do rebaixamento no Brasileiro. O torcedor tricolor se cansou de ver, um time com 90% de posse, 30 finalizações, e a derrota no final.

Acredito que o que mudou foi que agora o treinador consegue ser ofensivo e ter um pouco mais de equilíbrio e consistência. O Fluminense joga em um 4-2-3-1, com saída de bola bem construída, tendo como ponto alto a aproximação entre os jogadores. Um jogo posicional, físico e de muita obediência tática. As melhores chances do Tricolor carioca surgiram nos momentos em que todo o time se aproximou do setor onde estava a bola e deu opção de passe para quem estava com ela.

O Botafogo teve raras oportunidades de contragolpe no jogo. O lado esquerdo tricolor ainda tem uma certa fragilidade, visto Caio Paulista ter muita vocação ofensiva, atua quase como um ponta, e por ali acaba surgindo espaços pro adversário. Não foi por acaso que a chance mais clara de gol do escrete de Luís Castro surgiu justamente de uma bola longa no lado direito de ataque. Fato é que o Glorioso tinha superioridade numérica no ataque, mas não conseguiu usar esse ponto a seu favor.

As entradas de John Kennedy e Matheus Martins nas vagas de German Cano e Ganso deram mais mobilidade ao Fluminense. O gol saiu aos 36 minutos do segundo tempo pelo zagueiro Manoel, que recebeu passe de Caio Paulista após lançamento primoroso do volante André

A sensação que o Tricolor sai de campo é que o resultado poderia ter sido maior, dado o volume de jogo que teve. Diniz tem participação efetiva no excelente rendimento do meia Nonato, e na grande atuação de Jhon Árias. Como se afinaram no meio de campo Ganso e Gustavo Nonato na meia cancha. Vale destacar também a atuação de Luiz Henrique. A despedida do camisa 11 do Fluminense teve mais uma vitória e mais uma boa apresentação da jovem promessa no Brasileirão. Diniz recuperou o sorriso desse garoto, e o jovem sairá pela porta da frente, deixando saudade nos corações tricolores.

Foto: Vitor Silva/BFR

Inter x Bota: uma virada memorável (por Robertinho Silva)

Foto: Vitor Silva/BFR

Com um a menos desde o início da primeira etapa, o Botafogo venceu de virada o Internacional no Estádio Beira-Rio na semana passada.

A gelada noite de Porto Alegre presenciou uma partida histórica entre Inter e Botafogo. Peleia daquelas que entram para a galeria de “Jogos para Sempre” do nosso esporte bretão. O Inter começou marcando pressão, dificultando o adversário na saída de bola. No primeiro lance contundente do jogo, logo aos 4 minutos, Edenilson tentou a jogada por dentro e a bola sobrou para Alan Patrick. O meia chutou em direção ao zagueiro Philipe Sampaio. A bola bateu na barriga e depois resvalou no braço. Pela regra, não seria pênalti. Mas, depois de consultar o VAR, o árbitro Sávio Pereira Sampaio assinalou pênalti equivocadamente e alegou que a bola tocou no braço do jogador.

Além disso, ele também expulsou o atleta Philipe Sampaio, e fez com que os cariocas ficassem com menos um desde os 4 minutos do primeiro tempo. A ação causou revolta justíssima por parte dos jogadores do Glorioso, que reclamaram bastante, e o técnico Luís Castro também acabou expulso.

Na cobrança da penalidade, o volante Edenílson abriu o placar para os gaúchos. Com um a mais em campo, o Inter foi empilhando chances. Em uma delas, Fabrício Bustos tabelou com Alan Patrick e estufou as redes de Gatito: Inter 2 a 0.

Estando o Inter com vantagem no placar, jogando em casa, tendo um jogador a mais em campo e empilhando chances, tudo indicava que a partida seria mais um mero protocolo, uma formalidade. Mas, há coisas que só acontecem com o Botafogo. Mesmo sem Luís Castro a beira do gramado, o clube de General Severiano se recusou a ser mero espectador da partida.

Por incrível que pareça dizer, o Botafogo teve uma excelente postura justamente após ter um jogador a menos em campo. A adversidade, a situação dramática, fez com que o time jogasse de forma mais compacta; os atletas estavam mais bem agrupados, defendendo em linha, mas com uma excelente e rápida transição quando tinham a bola em seus domínios. O Glorioso fez com excelência o que lhe cabia naquelas circunstâncias.

Vinícius Lopes descontou e renovou as esperanças do Alvinegro carioca, superando qualquer prognóstico desfavorável. O gol mudou a dinâmica do jogo. Mano Menezes colocou 5 homens em linha no campo de ataque, mas mesmo com a superioridade numérica o Inter não conseguiu mostrar consistência defensiva. O Botafogo sempre tinha algum jogador aberto pela ponta como uma flecha ou uma bola alçada na área, como a que resultou no gol de empate de Erison.

Ainda com metade do segundo tempo pela frente, o Alvinegro se vestia com as roupas daqueles heróis urbanos que contrariam as estatísticas, que não se abatem perante a injustiça. Gabriel Mercado fez um gol para o Inter em uma cabeçada catedrática, e comemorou como se não houvesse amanhã. Mas o gol foi anulado corretamente. O Glorioso foi rebelde, passou a noite recusando o papel que lhe ofereceram logo após o apito inicial, e assim como toda saga de heroísmo, o capítulo final foi apoteótico.

No último e derradeiro lance, aos 55 minutos do segundo tempo, um contragolpe certeiro e mortífero. Matheus Nacimento tentou o passe para Jeffinho, Kayke como um maratonista ganhou na velocidade da defesa colorada, e em dividida com Vitão, a bola sobrou para Hugo sacramentar a vitória épica, no Beira-Rio. Depois do gol, ocorreu uma confusão entre os jogadores com pancadaria generalizada, mas que foi contida. Na briga, Lucas Piazon foi agredido pelo atacante David e saiu com o ombro imobilizado.

Muito mais que três pontos, vitória da justiça. Partida épica, memorável, eternizada na história dos Campeonatos Brasileiros, com a marca da Estrela Solitária.

Algumas breves palavras sobre futebol

Para mim e muita gente, futebol tem muitos significados. Um deles é a esperança de, a cada quarta e domingo, voltar a ter onze anos de idade, rever um Maracanã que já não existe e, no campo, espiar uma hora e meia do melhor futebol do mundo. Doces ilusões que, às vezes, se materializam.

Foi o caso desta quarta. Fluminense e Atlético fizeram um jogaço, daqueles que não se parecem com o futebol de hoje, nem deste século. Golaços, grandes lances, disputas, lambanças, garra e talento.

Antes da partida, eu caminhava para casa com certa tristeza por problemas que aqui não cabem, meus, dos outros, da minha cidade e do meu país. Tão triste que desisti de ir para o Maraca e resolvi ver o jogo em casa, sozinho. Esperava um clássico normal, rigoroso, até careta como os atuais, mas aí é futebol, amigos: a surpresa aparece a cada esquina.

Eu, meu copo de refrigerante gelado, a tela da TV praticamente como se fosse dentro do campo, os amigos no WhatsApp sofrendo com suas TVs e também na arena. E tome gols, tome lances bonitos e jogadas que remetiam ao velho UUUUUUHHHHH de muito tempo atrás.

Quando o Fluminense joga, meu mundo para e tudo se mistura. É assim há quase cinquenta anos. Eu me lembro do dia em que conheci Félix no álbum de figurinhas do meu pai. Eu me lembro do time de botão do Flu que ele me deu em 1975 em plena Estrada de Botafogo no terreiro de Dona Nininha e Seu Arlindo – que tinha um Aero Wyllis com banco vermelho. E também me lembro de Paulo Cezar Lima, craque campeão do mundo e colunista deste Museu da Pelada, cobrando três escanteios mortíferos contra o Flu em 1980 – todos fora da marca de cal.

[Então, bate uma saudade imensa dos meus pais e do meu irmão. Eu choro

Outro dia o Edinho fez 67 anos. Eu estava lá quando ele bateu o pênalti numa quarta-feira de chuva, fez o gol e ganhamos por 4 a 0. Fez 40 anos. Na volta, eu e meu amigo Floriano Romano, hoje artista consagrado, esperamos o ônibus por um tempão. Dois garotos de treze anos.

O jogo é quente, Luiz Henrique arrebenta, André corre por toda parte, o Atlético dá suas pancadas, Hulk fica nervoso sem trocar de cor e o Turco faz besteira. Cano faz um gol de barriga e todos os tricolores choram por um instante, lembrando aquele gol de barriga inesquecível em 1995. O primeiro tempo terminou 3 a 2 pro Flu, o segundo fechou em 5 a 3. Luiz Henrique é o melhor em campo, um garoto simples que sorri feliz e já está a caminho da Europa. Para muitos, foi o melhor jogo do Brasileirão. Para outros, o melhor de 2022.

Em duas horas, eu me esqueci da tristeza, dos problemas, das dívidas, das ameaças, das falsidades que encontramos a todo instante, da empáfia oca e só pensei no futebol. Na bolinha que sobe no tiro de meta, se perde no figurino da arquibancada e logo quica na grama. Nos uniformes em campo. Sonhei que meu pai estava ao meu lado, que minha mãe me dava um beijo, que meu irmão sorria. Sonhei com a Marina. Sonhei com a nuvem espessa de pó de arroz que me fez perseguir o Fluminense para sempre.

Acaba o jogo e a insônia vem forte. A emoção da vitória se junta a fotos, memes e gozações porque o rival Flamengo perdeu. Os gols são reprisados no telejornal, nas resenhas e, perto de uma hora da manhã, duas cerejas do bolo: Leo Batista aparece na televisão e fala de coisas belas. Depois, o VT de Flu e Galo. O Leo é voz obrigatória para qualquer torcedor que tem 50 anos ou mais – ele nos dá a falsa e maravilhosa sensação de eternidade. O VT é para ter aquele gostinho inesquecível das reprises da TVE aos domingos à meia-noite, e isso remete a Luiz Orlando, Achilles Chirol e outras feras.

A doce ilusão me oferece uma madrugada de 1980 ou 1983. A realidade é 2022, onde nem toda quarta-feira irá me sorrir com um grande jogo de verdade, mas para quem chegou aos 53 anos como eu, os versos de um gênio – tricolor – como Belchior são contestados: por duas horas de futebol, sonhar é melhor que viver. Quando a anestesia da paixão para, a gente espera o próximo jogo e o próximo sonho. Deve ser assim com meu amigo Edgard, que me contou de como seu pai estaria feliz com o 5 a 3.

Duas e quinze da manhã. Meu pai me puxa pela mão enquanto andamos pelo corredor lotado, até que chegamos à rampa da UERJ e descemos saboreando cada passo de uma tarde qualquer de futebol. Um dia eu ainda vou estudar lá, podem acreditar. E vou jogar campeonatos lá com meu time de botão.

Agora, como se dorme olhando para o teto e trocando os problemas pelas imagens do gol de barriga? É o Renato, é o Cano, é o sentido da vida.

[Esta coluna é dedicada a Edgard Freitas Cardoso, à memória de seu pai e da família Andel

@pauloandel

Rincón, garra e talento

Magrinho, ele era homem de frente. Um senhor jogador de futebol. Com o tempo, foi ficando mais forte e passou para a armação. Veterano, virou volante. As mudanças de posição não lhe tiraram o brilho e a eficiência.

Os quarentões se lembram da sova que a Colômbia aplicou na Argentina dentro de casa, fato raríssimo e inesquecível. Era o time de Higuita, de Valderrama mas principalmente de Rincón. Um jogadoraço que não poupou garra e disposição aliados a um talento raro, que acertou muito mas também falhou, claro. Esperava-se mais da Seleção Colombiana? É claro, mas não se pode desprezar o brilho daquele time.

Já campeão no Palmeiras mas sem êxito no Real Madrid – melhor dizendo, sua contratação não pode ser deixada de lado, pois foi uma vitória – Rincón desembarcou no Corinthians e no time alvinegro escreveu o tope de sua carreira: bicampeão brasileiro e campeão mundial de clubes no maravilhoso Maracanã de antigamente. Dividiu as glórias com uma turma da pesada: Marcelinho, Ricardinho, Edílson, Vampeta, alguns destes campeões no do mundo pelo no Brasil em 2002. Rincón era o líder, o capitão. Dividia como se fosse um zagueirão, tinha o pulmão de um jovem da base e atacava como a fera que foi. Não deixou pedra sobre pedra.

Tinha personalidade forte mas a alternava com momentos de extrema simpatia. Para alguns de seus companheiros de TV, já na condição de comentarista, Rincón foi um lorde. Em suma, um craque de muitos ângulos e facetas.

Seu nome está na galeria de grandes jogadores estrangeiros que, jogando por aqui, remetem ao que foi o nosso melhor futebol. Rincón senta praça na cavalaria de Sorín, Pedro Rocha, Forlán, Darío Pereyra, Conca, Petkovic e outros gringos que tinham aquele verde & amarelo nos pés.

Muito antes do justo e razoável, Rincón foi embora. Um segundo de equívoco e a vida escorre. Diante do inevitável, fica a celebração de seu sorriso invencível ao erguer a taça de campeão do mundo pelo Corinthians. Os que o viram em ação nos gramados sabem como ninguém: ele juntou garra e talento como poucos. Que assim continue, onde quer que esteja.

@pauloandel

Qualquer Fla x Flu

Claro que não é só um jogo de futebol e uma decisão de campeonato. Há muito mais na disputa, muito além de passes, gols, títulos e matérias jornalísticas.

Para a multidão – muito mais gente do que qualquer um de nós imagina -, um jogo de futebol pode ser a única alegria de uma semana, a única chance de trabalho, a única esperança num leito hospitalar. A única esmola numa vida de sofrimentos.

Desde muito cedo o jogo se espalhou pelo país, virou paixão e encanta até hoje.

Em todo o mundo, há grandes jogos e rivalidades que superam décadas e até um século. O que difere o Fla x Flu de todos os outros grandes jogos do mundo é que, pela forma como o clássico surgiu, os dois times já eram rivais rilhando os dentes desde o primeiro minuto do primeiro jogo, vencido em vert, blanc, rouge pelo placar emblemático de 3 a 2 há cem anos. E, desde aquela vez, o confronto entre Fluminense e Flamengo se tornou o jogo que nunca termina.

Logo mais as emoções vão se espalhar pelo Rio e Brasil afora. Cada um puxa a brasa para seu lado. Cercado pelo silêncio, eu penso em coisas demais, não necessariamente as mais lembradas, mas sim as que quase ninguém se lembra ao certo. Jogadores, amigos, família, gente que disse adeus. Nomes esquecidos pelo tempo que escorre e nos atordoa.

O meu Fla x Flu também é jogado fora de campo. Ele está nas caixinhas de Mentos que os trabalhadores lutam para vender numa cidade vazia, enquanto ostentam as camisas de seus times, pouco importando se são simples, baratas e não originais. Tem Fla x Flu nos adesivos das velhas bancas de jornal que sobreviveram na cidade. Quem sabe um garoto chutando uma bola de borracha esgarçada perto de uma viela? O tricolor e o vermelho e preto disputam em muitos lugares.

O Fla x Flu está espalhado em portarias, bancas de camelôs, barracas de feira, cozinhas de botequim e pequenos artigos. Ele está em páginas de um exemplar de jornal amarrotado, tudo isso muito além da obviedade de narrativas táticas e disputas. Ele enche vagões de trem, muitos ônibus, kombis, vans, barcas. Não que não esteja também em bares modernos e luxuosos, mas sua vocação é o pé-sujo, a birosca, o logradouro popular.

Ainda me lembro dos botões Gulliver de cristal em cima do campo que eu mesmo fiz com cartolina verde. Eu tinha dez anos de idade, Doval e Rivellino indo embora, Deley subindo, Zezé driblando. Wendell e Renato, Cláudio Adão e Zico. Carlos Roberto e Toinzinho, Carpeggiani. O Raul já tinha idade. Quarenta e quatro anos depois, tudo parece vivo demais. Tempos depois, minha mãe lutou e me deu um Estrelão.

Vai, Flu!

Futebol Cards, uma onda irresistível

Entre 1978 e 1981, a garotada que curtia futebol foi tomada por uma verdadeira febre que até hoje repercute no mundo adulto: a coleção de cartões Futebol Cards.

O lançamento veio na esteira da Copa da Argentina e logo mobilizou uma multidão. Pela primeira vez, o futebol não era lançado em figurinhas para um álbum, mas em cartões de papelão de ótima qualidade – mais de 40 anos depois, colecionadores ostentam peças impecáveis.

Cada cartão vinha com a foto do jogador vestido com a camisa do clube e, em seu verso, uma pequena ficha de apresentação com dados pessoais, gostos e trajetória na carreira. A venda era em pacotinhos com três cartões e o chiclete Ping Pong, também chamado de Magrão pelo seu formato retangular finíssimo. Bem, o chiclete não era grande coisa (…), mas o fato é que a garotada invadia as bancas de jornal – que, acredite, vendiam jornais naquele tempo – com suas moedas para a arrebatar os pacotes. Num mundo sem internet, o Futebol Cards era uma das raras oportunidades de se conhecer um pouco mais os ídolos.

Como em toda coleção, Futebol Cards tinha os cartões mais populares, que acumulavam repetições e eram usados em trocas, enquanto os mais raros eram disputados a tapa. Todo mundo tinha um Fred do Botafogo, zagueiro e irmão de Paulo Cezar Caju. Abel, o Abelão, hoje treinador consagrado, era um símbolo permanente do Vasco nos pacotinhos. Pelo Fluminense, o cartão popular era do multitarefa Rubens Galaxe. Do Flamengo, Rondinelli. E das equipes de outros estados? Quem não teve vários Iúra do Grêmio, Victor do Santos, Odirlei da Ponte Preta e o cracaço Zé Carlos do Guarani?

Num primeiro momento, a coleção se limitava aos grandes clubes, mas rapidamente abrigou equipes expressivas de outros estados e, numa segunda etapa, algumas equipes de menor investimento. Um caso típico foi a simpática Caldense de Minas Gerais, que ganhou projeção nacional com a coleção. Já incensado pela bela campanha em 1977 e o grandioso Estádio Santa Cruz, o Botafogo de Ribeirão Preto também teve grande visibilidade graças à coleção, que incluía nomes como os de João Carlos Motoca, o do goleiro Aguilera e do veteraníssimo Zito.

Alguns cartões ficaram muito valorizados por erros de edição. Por exemplo, no Guarani, os cartões dos pontas Capitão e Bozó, campeões brasileiros de 1978, saíram trocados. Em outras situações, os jogadores que mudaram de clube possuem cartões diferentes. É o caso de Nunes, que tem dois cartões quando jogava pelo Fluminense (um de camisa branca e o outro com uma camisa tricolor estranhíssima) e depois um pelo Flamengo, com a camisa rubro-negra. Também é o caso do xerife Moisés, com cartões pelos dois clubes. No Grêmio, o goleiro Remi não tirou a foto com a camisa da posição, mas sim a do time.

A Futebol Cards também lançou a série Grandes Jogos, registrando partidas importantes dos anos 1970, com fotos maravilhosas. Clássicos como Atlético e Cruzeiro, Fla x Flu e o incrível Fluminense x Corinthians de 1976 estão na lista.

Mais de quarenta anos depois, a coleção mexe com os torcedores cinquentões. Negociações na internet alimentam o sonho de se conseguir um cartão que faltou à época. Lá estão muitos e muitos nomes que ajudaram a escrever a história cotidiana do futebol brasileiro. Que tal o Helinho do Vasco? Ou o trio Vanderlei, Marco Aurélio e Dicá da Ponte Preta? Juari e Nilton Batata no Santos. Zé Carlos, Renato e Zenon no Guarani. Marinho, Jair Gonçalves e Pires no Palmeiras. Você sabia que Ancheta, zagueiro símbolo do Grêmio, depois virou cantor na noite de Porto Alegre?

Ah, o meu time com Wendell e Renato, Gilson Gênio e Zezé, Pintinho e Cleber, que saudade!

@pauloandel

Ainda sobre a Taça de Prata

Eu estava no berço. Tinha dois anos de vida.

A decisão foi o acontecimento do fim do ano na Guanabara. Um dia de festa tricolor num país que vivia tempos trágicos.

Meu pai foi ao jogo. Eu torci de casa, mesmo sem saber. Já tinha uma camisa do Fluminense, uma camiseta de algodão com o escudo bem grandão, que cobria todo o peito, e os simples dizeres “Sou Fluzão”.

Dez anos depois, em 1980, o futebol já era uma rotina diária em minha vida. Num domingo quente como o de hoje, eu ia à padaria, depois passava pela banca de jornal, trazia tudo que meu pai pedia e depois ficava na fila para ler os cadernos de esportes. Isso certamente me ajudou como cronista. O Dia, O Globo, Jornal do Brasil, Jornal dos Sports, tudo. Mas como era em 1970?

Provavelmente meu pai é que foi à padaria, porque minha mãe não saía de perto de mim. Ele tinha 29 anos e deve ter ficado que nem um louco, sonhando em chegar logo ao Maracanã. Um jovem ainda, pai de família, com o irmão recém-exilado, com uma criança de colo, administrando duas lojas, lutando para vencer. E muito perto de ter uma alegria incomensurável, que era a de ver seu time campeão do Brasil.

Fico imaginando aquele Maracanã abarrotado. Longe de desrespeitar a garotada de agora, mas quem viu aquela praça com mais de 130 mil pessoas sabe o que estou falando.

O Fluminense venceu o campeonato com um empate com o Atlético Mineiro. Foi um sonoro campeão. Superou o Palmeiras de Ademir da Guia, o Santos de Pelé, o Cruzeiro de Tostão, o Botafogo de Paulo Cezar Caju, o São Paulo de Gerson e muito mais. Ganhou um dos títulos mais difíceis de sua história e o campeonato brasileiro mais difícil de todos os tempos.

Meu pai era calado. Não sei se foi sozinho ao jogo ou com algum amigo. Não sei se chorou, o que vi pouquíssimas vezes. Não sei se cantou. Eu só imagino as cenas que não vivi, mas tudo aquilo resultou em coisas que repercutem até hoje.

O primeiro jogador que vi na vida foi o Félix, num álbum de figurinhas da Copa de 1970. Eu devia ter perto de cinco anos. Meu pai adorava álbuns e fez vários. A gente os perdeu nas mudanças, é duro ser pobre. Mas a cena eu não esqueço: estava deitado na minha cama quando ele veio, me chamou e mostrou. Félix, Félix, nunca mais esqueci – isso tem mais de 47 anos e eu me lembro como se fosse agora.

Samarone, Galhardo, Marco Antônio, Oliveira. Didi. Denílson, o Rei Zulu. Flávio, Mickey, Lula. São todos nomes familiares para mim. Não precisei vê-los para adorá-los, saber como foram e são tão importantes para o Fluminense. Sei como eles deixaram meu pai feliz, e felicidade é algo tão raro que a gente precisa sempre valorizar. É um grãozinho de areia com o qual sonhamos sempre.

A volta do jogo? Ele deve ter abraçado minha mãe, ligado o rádio para ouvir a repercussão do título e planejar o próximo álbum de figurinhas.

Já comprei o pão hoje. A banca de jornais está fechada. O rádio está desligado. Há um enorme silêncio, exceto pelo ventilador que lembra uma turbina de avião. Então é ficar deitado, olhar para cima e se sentir em pleno voo.

Hoje não tem jogo. O Fluminense de agora é incerteza no campo e devastação fora dele, mas há cinquenta anos, meus amigos, o mundo era pequeno para as três cores da vitória, cores de um título supremo que sempre estará representado pelo V da vitória de Mickey, o artilheiro inesperado que supriu a ausência do esplêndido Flávio e levou o Flu a um de seus títulos mais arrebatadores.

Um dia, depois de tanto ouvir as histórias tricolores de meu pai, comecei a escrever as minhas, mas nunca deixei de lado o que aprendi e vivi. Tudo passou rápido demais. Quem me dera estar no berço outra vez com minha camiseta do Fluzão! Na impossibilidade, deixo um grande abraço a todos os tricolores vivos ou mortos que, naquele dia, no campo, na arquibancada, na geral e nos radinhos Brasil afora, ajudaram o Fluminense a se mostrar em seu real tamanho: gigantesco, gigantesco.

Viva os campeões brasileiros de 1970!

@pauloandel

Nascido em 1968, Paulo-Roberto Andel é autor de 30 livros, sendo 16 deles sobre o Fluminense. Formado em Estatística pela UERJ, é editor e cronista do Panorama Tricolor, cronista colaborador do Museu da Pelada e do Correio da Manhã. No Panorama, assinou mais de 1.000 colunas desde 2012. Por conta de seus esforços literários, foi declarado torcedor ilustre do clube em sessão solene do Conselho Deliberativo do Fluminense em 21/07/2014.

A magia do Futebol Cards

Na segunda metade dos anos 1970 era uma febre entre a garotada. A venda de um chiclete de qualidade discutível vinha acompanhada de um pacotinho com cartões de papelão contendo fichas e fotos de jogadores, posteriormente também o mesmo com jogos marcantes do futebol brasileiro.

Hoje o Futebol Cards é valorizadíssimo entre colecionadores pelo Brasil afora.

O vazio do futebol

Enfim, o futebol voltou. Não havia outro jeito, os contratos exigem e, segundo dizem, o show tem que continuar.

Mas há um vazio absoluto, provocado pela trágica pandemia que continua matando muito no Brasil. Sim, afinal é impossível que se tenha público nas partidas. Paciência.

De toda forma, é impossível não se sensibilizar com a desgraça que é uma arquibancada no completamente vazia numa partida de futebol. Sem a torcida, a televisão oferece um sentimento de solidão, de ausência, de lacuna evidente.

O cenário já é triste para os times da elite do futebol brasileiro. Imagine quem não está nela? Campeonatos que não vão se realizar, times que podem desaparecer, tristeza, desemprego, miséria. Quatro quintos ou mais dos jogadores brasileiros ganham pouco mais do que um salário mínimo, isso para quem recebe. E como vai ser daqui por diante?

É certo que prever a catástrofe provocada pela Covid19 era impossível mas, se pensarmos bem, o cotidiano dos jogos sem público na arquibancada já se desenhava de alguma forma, ora pela gentrificação dos estádios transformados em arenas, ora pelo desprezo às equipes que não figuram nas principais competições nacionais, ora pela própria espanholização do futebol através das cotas de TV, ora pelo combate hipócrita aos verdadeiros agentes da violência entre torcidas. Numa reflexão sincera, a TV sempre pretendeu fazer do futebol uma atração como um jornal diário ou uma novela, pouco se importando sobre a necessidade vital de formar público presente aos jogos.

Copiamos a péssima fórmula de Havelange: arenas gourmetizadas, com ingressos caros, privilegiando carros em vez dos velhos trens enchendo os estádios com seus tipos populares.

A pandemia foi apenas (mais) uma pá de cal nos degraus de concreto que antes ofereciam emoção, mas que passaram a exalar “experiências”. Por enquanto temos a justificativa para o deserto de espectadores. Mas o que será do futuro? A torcida vai sobreviver depois que a tragédia do novo Coronavírus for debelada?

Futebol, futebol!

FUTEBOL (por Paulo-Roberto Andel)

Quando meu pai entrou no quarto com o álbum de figurinhas da Copa de 1970, no ano de 1973, eu tinha quatro anos de idade mas já gostava de futebol, mesmo sem nunca ter visto um jogo. E no ano seguinte, 1974, eu me lembro de estar sentado num degrau de concreto da arquibancada num jogo do Fluminense, quando meu pai me deu a mão e me puxou para ir embora. No corredor do Maracanã eu via vários torcedores grandes, todos muito maiores do que eu, caminhando para o mesmo lado, a caminho da rampa do lado da UERJ é de um obelisco que já não existe lá. E lembro do cheiro de cachorro quente das barracas, contrastando com o das laranjas, que eram vendidas em grandes plásticos no chão.

Em 1975, eu estava na casa de Dona Nininha e Seu Arlindo, que ficava na Estrada de Botafogo, quando meu pai chegou com uma caixa de lindos botões da marca Cracks da Pelota. Colar os escudinhos do Fluminense nos botões de plástico transparente, sem cor, foi uma responsabilidade: eu sabia que aquilo era muito sério.

Em poucos anos, eu ouvia um rádio Telefunken bem grandão para ouvir as narrações dos jogos. Meu pai me levou ao Maracanã lotado várias vezes, com 120 ou 130 mil pessoas, uma experiência pela qual ninguém passa imune. Eu lia O Dia, O Globo, Jornal do Brasil e Jornal dos Sports, até o Pasquim falava de futebol, a Revista Placar era maravilhosa. Jogava bola na rua, na vila ao lado do prédio onde morava, e também na praia de Copacabana, alternando as traves do Juventus e do Bairro Peixoto. Disputava campeonatos de botão com Augusto Arromba, Marcelo Batista, Luis Fernando Gomes Minas e o saudoso Fredão. Joguei também com meu amigo Leonardo Tigre Maia, que era meu colega de escola e, anos depois, de faculdade. Na casa do Fred, Luis e Floriano Romano eram figuras presentes, e também jogávamos nas casas deles.

Com 13 anos, eu já ia para o Maracanã sozinho toda semana, jogava botão sozinho, criava finais imaginárias em casa, disputava duplas e praia sempre que possível à noite, peladas na quadra da Lagoa e no Corpo de Bombeiros da Xavier da Silveira. Edinho era meu herói dos gramados. Eu respeitava adversários terríveis como Roberto Dinamite, Tita e Mendonça. Tentei fundar uma torcida organizada com Toninho e Ricardo, filho de Silério, que era amigo de meus pais e trabalhava num prédio da Rua Santa Clara – eles declinaram e deixei de ser o mais jovem presidente de torcida do país. Colecionava muitos botões que minha mãe me dava de presente, com todo o sacrifício financeiro – eu os tenho até hoje.

Quando fiz 15 anos, o Fluminense estava prestes a viver anos incríveis e inesquecíveis. Eu estava lá em todas. Deste então, se passaram quatro décadas. Respirei futebol o tempo todo, e continuo sendo o garoto que se encantava com os botões de plástico, as figurinhas da Copa de 1970, o grande anel do céu a ser observado por quem se deitava num degrau da geral do Maracanã. Por isso escrevi até aqui muitos livros sobre o assunto, afora os inéditos e inacabados: é que eu continuo procurando por todos os lados o cheiro do cachorro quente, das laranjas, os vendedores de Coca-Cola que mais pareciam astronautas da arquibancada – todos de branco, com capacete e o refrigerante às costas num tanque que mais parecia de oxigênio. Eu procuro a nuvem espessa de pó de arroz, o mar de bandeiras e também a oposição do outro lado. Eu procuro o velho obelisco, as caminhadas da Praça da Bandeira até o Maracanã, os sinais das estações de rádio que ecoavam por toda a arquibancada nos minutos finais de jogo, o pacotinho de batata frita Guri no bar fuleiro, a voz de Victorio Gutemberg saindo por altofalantes abafados e dando os resultados da loteria, os garotos pobres e descalços na bilheteria que choravam ao ganhar um ingresso do meu pai – ele também chorava, o lindo placar de lâmpadas que inunda meus sonhos, os passageiros do ônibus na volta de um clássico qualquer – risos, piadas, incorreções e abraços.

O Maracanã por muito tempo foi o lugar onde eu vi os ricos e os pobres se abraçando de verdade, como se fosse amizade e parceria, o único lugar. E que choravam juntos num insucesso.

Ainda procuro os garotos jogando botão debaixo da escada rolante do shopping dos antiquários, ou chutando bola na trave do Juventus com a praia deserta, ou ainda fazendo a de fora na Vila Tenreiro Aranha para se sentirem heróis entre traves imaginárias feitas com chinelos ou pedras.

Invariavelmente os vejo. Eu também estou lá.

@pauloandel

Jogos raros (da Redação)

Partidas com times que já disputaram o Campeonato Brasileiro, mas que estão sumidos por diversos motivos.

Flamengo 4 x 0 São Bento – Brasileiro 1979

Vasco 0 x 2 Londrina – Brasileiro 1977

Uberlândia 1 x 1 Coritiba – Brasileiro 1984

Fluminense 0 x 1 Bragantino – Brasileiro 1991

Corinthians 10 x 1 Tiradentes-PI – Brasileiro 1983

Ipatinga 1 x 2 Palmeiras – Brasileiro 2008

Botafogo 3 x 0 Brasília – Brasileiro 1983

Vasco 9 x 0 Tuna Luso – Brasileiro 1984

Em cima do laço, há 40 anos (da Redação)

Vasco e Botafogo duelaram pelo Campeonato Carioca de 1978, no dia 29 de outubro. O Machão da Gama levou a melhor: aos 45 minutos, Paulinho marcou o gol da vitória por 2 a 1.

Local: Maracanã
Juiz: Arnaldo César Coelho;
Renda: Cr$ 1.603.340.00;
Público. 41.978;
Gols: Roberto 16 e Dé 43 do 1.º: Paulinho 45 do 2.º:
Cartão amarelo: Gaúcho

Vasco: Leão, Orlando, Abel, Gaúcho, Marco Antônio, Helinho, Guina, Wilsinho, Paulo Roberto (Washington Oliveira), Roberto e Ramón (Paulinho); Técnico: Orlando Fantoni

Botafogo: Zé Carlos, Perivaldo, Osmar, René. Rodrigues Neto, Wescley (Ademir Vicente), Mendonça, Gil, Dé, Luisinho e Ademir Lobo; Técnico: Danilo Alves

No meio do caminho havia um Luxemburgo (por Zeh Augusto Catalano)

 

Fim de semana de eliminatórias. Vários jogos interessantes para serem vistos e outras peladas inaceitáveis sendo transmitidas. O Sportv teve a pachorra de transmitir Bélgica x Gibraltar, na quinta-feira. Um nove a zero muito equilibrado.

Hoje à tarde, me preparei para assistir a uma partida decisiva. A Hungria, em casa, precisava desesperadamente vencer Portugal para seguir com chances mínimas de ir à Copa da Russia. Durante um primeiro tempo pavoroso, a coisa mais interessante que aconteceu foi uma cotovelada desclassificante de um atacante húngaro no Pepe, o sanguinário beque português nascido no Brasil. Foi devidamente premiado com um vermelho da cor de sua camisa e liquidou ali as parcas chances de sua seleção.

Zapeei. Parei em França x Luxemburgo, só esperando para ver de quanto a França já goleava. Aparece o placar. Seis do segundo tempo, zero a zero. Resolvi assistir até onde ia aquilo.

Ia entrar para história.

Luxemburgo se fechou com duas linhas de cinco jogadores  na cabeça de sua área e na sua intermediária. A França, lotada de craques e certa da vitória contra um indigente do futebol, foi rodando bolinhas para os lados e fazendo cruzamentos inócuos. E o tempo passando. Deschamps, técnico dos Bleus, piorou a situação substituindo errado. Sacou a nova estrela do Barcelona, Mbappé, talvez o único que se salvasse do sapato alto. O jogo acontecia em Toulouse, longe de ser um grande centro do futebol. Ao perceber o que se passava, a torcida local, de muda, passou a cantar a Marselhesa, tentando chamar os brios do time pelo patriotismo. Não adiantou.

Luxemburgo fez uma partida impecável. Segurou a França na bola. Cometeu pouquíssimas faltas e não fez cera. Surpreendentemente, ao retomar a bola, contra-atacava consistentemente. No meio do segundo tempo, num lance em que seu melhor jogador, o número sete Rodrigues, entrava sozinho para marcar o gol, o bandeira assinalou um impedimento de ruborizar flamenguistas. Rodrigues, que fez um partidaço, nascido em Portugal, joga num clube de Luxemburgo e certamente vai aparecer rapidamente em algum clube maior, tal o nível de sua atuação. No final do jogo, passou em velocidade por dois marcadores e chutou uma bola na trave de Lloris.

Resumo da atuação de uma França surpreendida pela dificuldade que encontrou, durante os três minutos de descontos a França não conseguiu sequer cruzar uma bola na área ou chutar a gol. Final melancólico para a seleção da casa e início de uma grande e merecida festa da equipe visitante.

O futebol segue sendo o único esporte a dar chance a um adversário tão inferior. A bola pune o sapato alto. Não foi a primeira e nem será a última vez em que isso acontece. E a França, pode chorar lágrimas de sangue por estes dois pontos jogados no lixo. No Luxo.

Senna, Senna! (por Paulo-Roberto Andel)

Em 01 de maio de 1994, o Brasil estava em choque: pela manhã, acontecera o acidente que resultou na morte de Ayrton Senna, um dos maiores ídolos do esporte mundial.

Por ser uma rodada de jogos no futebol brasileiro naquele dia com imenso apelo, e tendo sido confirmado o óbito pouco antes do tradicional horário das partidas, as mesmas foram mantidas.

No Maracanã abarrotado, aconteceu uma das mais lindas homenagens a Senna: as torcidas de Vasco e Flamengo cantaram juntas o nome do ídolo. Uma página eterna de civilidade e respeito a um gigante do esporte, morto muito antes do justo e razoável.

O clássico terminou empatado em 1 a 1.

Matéria do Globoesporte:

O dia 1º de maio de 1994 foi de luto em todo Brasil e em grande parte do mundo, pelo menos para os fãs de Ayrton Senna, que perdeu a vida após um acidente fatal em sua Willians na curva Tamburello, em Ímola, durante a manhã no Grande Prêmio da Itália de Fórmula 1. Nessa mesma data, algumas horas depois, Flamengo e Vasco se preparavam para se enfrentar pelo terceiro turno do Campeonato Carioca. Maracanã lotado, com mais de 120 mil pessoas. Mas, durante a homenagem oficial da Federação de Futebol do Estado do Rio (Ferj), o minuto de silêncio se transformou em algo inimaginável: as duas torcidas cantaram a mesma música, juntas.

Uma multidão dividida pela metade nas cores, mas unida pela dor e pelo lamento de ter perdido um ídolo, tricampeão do mundo. Para algumas pessoas que estiveram no Maracanã naquele dia, talvez o placar de 1 a 1 após o apito final tenha sido esquecido, mas o canto “Olê, olê, olê, olá, Senna, Senna!”, com as duas torcidas batendo palmas ao mesmo tempo, foi inesquecível.

Antes mesmo de entrar no estádio, torcedores e jogadores se mostravam consternados e lembravam de momentos da carreira de Senna. Faixas, até uma bandeira homenageavam o piloto.

Naquela mesma tarde, São Paulo e Palmeiras se enfrentaram no Morumbi pelo Campeonato Paulista. A homenagem a Ayrton Senna foi também comovente.

Olê, olê, olê, Olá! (da Redação)

No começo da temporada carioca de 2005, o time da rua Bariri aprontou em pleno Maracanã.

23/01/2005 – 17h58

Flamengo dá vexame na estréia do Estadual
Do Pelé.Net
No Rio de Janeiro

A política do “não investimento” do Flamengo sofreu um duro golpe na tarde deste domingo. Depois de dispensar mais de uma dúzia de jogadores e contratar apenas quatro para compor o elenco, o Rubro-Negro apanhou por 3 a 0 para o Olaria, no Maracanã, na estréia do Campeonato Estadual. Os gols, todos marcados no primeiro tempo, foram de Edvaldo e William (2).

O catastrófico resultado deve provocar mudanças na Gávea. Inconformada, a torcida protestou contra a diretoria e clamou pela contratação de atletas de renome. Uma das primeiras mudanças pode ser a troca de treinador. Júlio César Leal seria convidado a assumir o cargo de diretor técnico e um novo profissional assumiria o comando da equipe.

Curiosamente, o Olaria tem sido o algoz recente do Flamengo. Nas três últimas partidas entre os clubes, o time do subúrbio saiu vencedor (2 a 0 em 2003 e 1 a 0 em 2004). Essa foi a primeira vez na história que a agremiação da Rua Bariri marcou três gols no adversário em um mesmo jogo.

A vitória garantiu aos comandados de Arthurzinho a liderança do Grupo B, com três pontos. Já o atual campeão do estadual fica na lanterna e acumula a segunda derrota consecutiva do ano (quinta-feira havia perdido por 1 a 0 para o Volta Redonda).

Na segunda rodada da Taça Guanabara, o Flamengo enfrenta o Madureira, às 16h, em Conselheiro Galvão. Por sua vez, no mesmo dia, o Olaria enfrenta a Cabofriense, às 20h30, no estádio Alair Corrêa.

O jogo

Atuando com sete jogadores formados em suas divisões de base, o Rubro-Negro começou a partida errando diversos passes e proporcionando contra-ataques ao Olaria. Em um deles, aos 6min, William recebeu na ponta direita, mas finalizou sem perigo ao gol de Diego.

Passada a ansiedade inicial, o time da Gávea dominou a intermediária adversária, mas só arrematou aos 14min. Marcos Denner lutou e a bola sobrou para Dimba. Contudo, o camisa 9 teve dificuldade para dominar e, pressionado pelos zagueiros, chutou fraco à direita da baliza.

A morosidade da partida só foi interrompida aos 24min, com o gol do Olaria. França cruzou da esquerda, Edvaldo subiu mais que Fabiano e cabeceou no canto esquerdo.

Inconformada com a apatia da equipe, a torcida rubro-negra começou a apupar os jogadores aos 30min. Aos 34min, Da Silva arrancou pelo meio e achou Dimba na ponta direita. Ele cruzou e Jarró conseguiu jogar pela linha de fundo. Na cobrança de escanteio, Júnior pegou de peixinho, mas Marcos Leandro conseguiu fazer a defesa.

Em erro clamoroso de marcação do Flamengo, aos 39min, William recebeu livre na entrada da área, mas demorou e o arremate acabou bloqueado por Fábio. Porém, na continuidade da jogada, a bola foi alçada na área, aos 41min, e o mesmo William, de novo em cima de Fabiano, subiu mais que a zaga e marcou o segundo.

Sem qualquer arrumação, o clube da Gávea deu continuidade ao seu primeiro tempo dos horrores e sofreu o terceiro gol dois minutos depois. William aproveitou cruzamento de Léo da esquerda e, de primeira, não deu chances de defesa ao goleiro.

Ante o resultado catastrófico, a torcida do Flamengo voltou suas baterias para o presidente Márcio Braga e exigiu a contratação de jogadores.

Acreditando numa virada quase utópica, os jogadores rubro-negros voltaram do vestiário mais dispostos. A 1min, Júnior cruzou, mas Marcos Denner desperdiçou a chance. Temerário com a reação dos aficionados, Márcio Braga deixou o Maracanã ainda antes dos cinco minutos.

Aos 5min, Fabiano falhou grotescamente e Edvaldo chutou com força. Atento, Diego saltou e defendeu sem dar rebote. A equipe rubro-negra quase diminuiu aos 9min. Da Silva arriscou da entrada da área e Marcos Leandro espalmou.

Dois minutos depois, André Santos cruzou e Dimba cabeceou rente à trave. A chuva de gols perdidos pelo camisa 9 continuou aos 14min. André Santos, que entrou bem no lugar de Júlio Moraes, assistiu Zinho. O meia chutou, o goleiro rebateu e o atacante, dentro da pequena área, arrematou por cima do travessão.

Com um a mais depois da expulsão de Léo, o Flamengo pressionou. Aos 22min, Dimba cobrou falta e o goleiro do Olaria espalmou. Um minuto depois, Ibson recebeu na área, mas chutou fraco e facilitou a intervenção de Marcos Leandro. Já quase sem tempo hábil para a reação, Júnior, aos 30min, chutou da entrada da área e o camisa 1 rival conseguiu impedir o primeiro gol flamenguista.

Esperando a estréia do Fluminense, que aconteceria às 18h, a torcida tricolor aproveitou-se da humilhação do rival para entoar o tradicional “olé”. Aos 38min, Dimba acertou a trave. Na última chance de o vexame ser diminuído, Adrianinho chutou forte e Marcos Leandro defendeu.

FLAMENGO: Diego; Fábio (Adrianinho), Thiago, Fabiano e Júlio Moraes (André Santos); Da Silva, Júnior, Ibson e Zinho; Marcos Denner (Bruno) e Dimba; Técnico: Júlio César Leal

OLARIA: Marcos Leandro; Domício, Betinho (Fabão), Berg e Jarró; Marcelo Souza (Valtinho), Júlio César, França (Dedeco) e Léo; William e Edvaldo; Técnico: Arthurzinho

Local: Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro (RJ)
Árbitro: Wagner Tardelli
Assistentes: Dibert Pedrosa e Elson Passos Sena Filho
Cartões amarelos: França (O), Da Silva (F), Léo (O), William (O), Júnior (F)
Cartão vermelho: Léo (O)
Gols: Edvaldo, aos 24min; William, aos 41min e aos 43min do primeiro tempo

Carioca de 1971: a visão de Oldemário Touguinhó (da Redação)

Há 46 anos, uma discussão se mantém no ar: o gol da final do Campeonato Carioca de 1971, vencida pelo Fluminense por 1 a 0 com um gol do ponta-esquerda Lula.

À época, com enorme manchetes e a crônica firme de alguns dos melhores textos da imprensa brasileira, casos de Armando Nogueira e João Saldanha por exemplo, estampou-se a versão de falta do lateral Marco Antônio sobre o goleiro Ubirajara Mota, sendo o Tricolor beneficiado por um erro crasso de José Marçal Filho. No entanto, além da discussão sobre aquela mesma falta, no mesmo lance Lula finalizou caindo porque supostamente sofrera pênalti de Mura.

A decisão de 1971 já provocou debates acalorados, análises profundas, livros e matérias.

Um dos maiores jornalistas da história do futebol brasileiro – e botafoguense de corpo e alma -, Oldemário Touguinhó assim escreveu na capa do Caderno B do Jornal do Brasil em 29 de junho de 1971, dois dias após a decisão:

America 6 x 1 Mixto: uma noite rara no Maracanã (por Paulo-Roberto Andel)

Em 22 de novembro de 1979, numa quinta-feira à noite, o America recebia o time do Mixto de Mato Grosso para uma partida pelo Campeonato Brasileiro daquele ano. Embora o tradicional time rubro ainda tivesse uma boa torcida presente à maioria de suas apresentações, esta contou com apenas 1.236 pagantes, num Maracanã deserto.

Depois de um primeiro tempo ruim, o Mecão acabou goleando o adversário (este com um uniforme muito parecido com o do Vasco da Gama) pelo placar de 6 a 1. O grande destaque da partida no segundo tempo foi o ponta-esquerda Silvinho. Era ainda o America de Uchoa, o eterno zagueiro Alex, o volante Merica, o meia Nelson Borges e o centroavante César.

Pela equipe de Mato Grosso, o destaque era o centroavante Bife, o maior artilheiro da história do futebol do Estado, com passagem pelos times do Porto e Belenenses de Portugal, tendo falecido em 2007 aos 57 anos. E também o veloz jogador Gonçalves.

Foi a maior goleada do America na história do Maracanã e também em jogos do time pelo Campeonato Brasileiro. Alijado da disputa nacional em 1987 por conta de sua bárbara exclusão da primeira divisão, não se recuperou até hoje. O Mixto ainda disputaria outros campeonatos brasileiros da primeira divisão até 1985.

Qual a razão do apelido de Bife, que se chamava José Silva Oliveira?

Segundo o historiador Reinaldo Queirós, o apelido do craque deu-se quando ele tinha 12 para 13 anos, já era um bom jogador entre a molecada e sua mãe era vendedora de marmitas para os soldados de um quartel. A entrega era em três viagens numa velha caminhonete de um tio. Bife viajava atrás segurando as marmitas para que a comida não derramasse. Em certo dia, as marmitas estavam muito cheirosas, ele então abriu uma e comeu o bife que ficava em cima do arroz e do feijão. Estava tão bom que comeu 15 bifes. Entrega feita, os soldados, famintos, “sorteados” pela ausência da preciosa mistura, chiaram com o sargento. Na entrega seguinte, o moleque foi detida e confessou. A mãe dele não foi destituída do fornecimento, o garoto continuou fazendo as entregas e nunca mais aprontou, mas ficou com o apelido de Bife.

Os clássicos cariocas precisam ser valorizados (por Paulo-Roberto Andel)

Hoje, quase às dez da noite, teremos o Fluminense enfrentando o Botafogo pela Taça Rio.

Descontadas as hipérboles, a luta do Tricolor neste momento é somar pontos para garantir a vantagem do empate no jogo semifinal. Já o Alvinegro está com a cabeça noutra competição. O primeiro resultado de tudo já sabemos: um público muito aquém do razoável para o mais antigo clássico do futebol brasileiro, por diversas razões.

Neste 2017, tivemos a estreia do Fluzão diante do Vasco para 11.043 torcedores pagantes. O time da Colina jogou para 8.088 pagantes diante do Botafogo. E o Fla x Flu onde ganhamos a Taça Guanabara teve 22.042 idem. Flamengo e Vasco, 5.484. Estes quatro clássicos tiveram 46.657 torcedores somados. Um número francamente ridículo se pensarmos no tamanho das torcidas dos grandes clubes cariocas, descontadas as hipérboles e piadas.

Ao se questionar sobre a franca decadência nos números presenciais, certa esfera modernista há de ressaltar a era da televisão (que salva os clubes, mas também lhes oferece uma adaga no pescoço), da arquibancada espalhada pelos bares e das torcidas organizadas do eu sozinho, em casa, diante da esmartevê. Sem dúvida os tempos mudaram e muito, mas isso não deve ou deveria significar o retrocesso quantitativo do público para os anos 1920 e 1930, quando Laranjeiras e São Januário eram os templos do futebol carioca e brasileiro.

Ok, não tem Maracanã. Ou tem, dependendo da cara do cliente. O fato é que nosso futebol foi francamente esvaziado com o passar dos tempos e, a cada dia que passa, não somente aumenta o número de pessoas que não se interessam por futebol como os estádios daqui ficam cada vez mais desinteressantes. No mínimo, deveria ser uma preocupação dos clubes de futebol, deixando de lado a monocultura das cotas da TV que, em muitos casos, vira limite do cheque especial para cobrir arroubos e barbeiragens administrativas.

Dos jogos que elenquei acima, o Fla x Flu teve o maior público. Era a decisão da Taça Guanabara, ainda com charme e nostalgia mesmo sem valer quase nada para a fase final da competição. É certo que poderia ter dado mais gente se não tivesse havido tanta confissão com liminares, proibições et cetera. Mas não deixo de pensar numa outra edição do clássico imortal, realizada há quase 30 anos, da devida maneira: num domingo às cinco da tarde no outrora maior estádio do mundo. O Rio de Janeiro foi tomado por uma tempestade monumental, a ponto de se duvidar que fosse possível a realização da partida. Só foram os gatos pingados feito eu; os degraus da arquibancada do Maracanã que ficavam além da velha cobertura de concreto pareciam riachos, com o pessoal espremido onde dava. Um jogo ruim, para 24.512 pagantes.

Não se pode vulgarizar os clássicos: eles precisam ser especiais, contando com grandes torcidas. O contrário faz com que todos percamos antes da bola rolar. É preciso resgatar ao menos parte da torcida que se perdeu nas telas e monitores da vida. Um espetáculo não existe sem plateia, um grande jogo não resiste sem torcidas.

O mundo mudou, já não é o mesmo, vivemos a bela Idade Média com smartphone, Uber e Tinder, mas não custa nada refletir nas palavras do primeiro parágrafo da crônica de João Saldanha, abaixo publicada.

Mais uma morte no futebol (por Paulo-Roberto Andel)

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Tiros à queima-roupa, gritos, dor, morte. Oito baleados na torcida do Botafogo, um morto, outro em estado gravíssimo até o fechamento desta edição.

Em condições normais de razoabilidade, o clássico entre Botafogo e Flamengo jamais teria sido realizado neste domingo no Engenhão. Mas, pensando bem, condições normais de razoabilidade são algo bastante raro no Brasil de hoje, em qualquer temática.

A banalização da violência acabou endurecendo os corações. As pessoas olham com indiferença, passam e a vida segue. Quarta-feira tem outro jogo, eu não tenho nada com isso, não fui eu quem inventou a violência. E assim, um clássico para colocar 40 mil pessoas põe a metade disso.

Uma parte dos torcedores simplesmente desistiu. O cardápio de sandices que cercam a ida a um jogo de futebol não é para qualquer estômago. Alguns ficam nos bares, outros vendo o jogo na TV em casa e outros passaram a ignorar o esporte – as pesquisas apontam a gravidade deste último fato, aumentando a cada nova medição.

Em dois finais de semana seguidos, o Rio testemunhou dois atos de selvageria contra pessoas que cometiam o crime de acompanhar seus times de futebol. Não é coisa propriamente de hoje: nos anos 1970, era comum alguém ser morto na geral do Maracanã por “assalto” (sempre repercutiu a desconfiança de que alguns mortos eram militantes de esquerda, acompanhando o jogo no setor mais popular do estádio). Tal como hoje, ninguém ligava. E aqui se fala do Rio, mas podia ser em São Paulo, Belo Horizonte, Goiânia ou outra cidade qualquer.

A TV foi a primeira a bancar a realização da partida. Seu compromisso é com os números da audiência e do caixa. Não vai ter ninguém na rua protestando contra a violência no futebol, nem com boneco gigante de presidiário, nem com camisa da CBF – e aqui, usar a palavra que designa um apenado pode parecer até deselegância.

A Federação? Depois ela publica uma nota de repúdio.

Morreu mais um.

E daí? O carnaval está chegando.

Uhu!

@pauloandel

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A Hungria de Puskas (por Zeh Augusto Catalano)

Um dos maiores times da história.  Campeã olímpica em 1952, a Hungria era a favorita absoluta para a Copa do Mundo em 1954, na Suíça. Perdeu a final contra a Alemanha, a quem havia massacrado na fase preliminar da mesma competição por 8 a 3. Abriu 2 a 0 em poucos minutos, mas sucumbiu de forma inesperada levando a virada, 3 a 2, no final. Um gol mal anulado poderia ter mudado a história do jogo e do futebol, premiando a melhor Hungria de todos os tempos. Mas os deuses do futebol não quiseram que isso acontecesse. Igual a Holanda de 1974 e o Brasil de 1982, os húngaros ficaram com as lágrimas.

O time assombrou o mundo com seus resultados e seu estilo de jogo revolucionário, completamente distinto dos outros times da época. Puskas, Hidegkuti, Boszik, Kocsis, Czibor . Craques. O ponto de desequilíbrio, ao contrário do que se pensa, não era Puskas, mas Nandor Hidegkuti. Numa época de posições bem definidas, e de um futebol mais estático, ele era um verdadeiro ponta de lança, voltando até a intermediária para armar jogo e levando junto a zaga adversária, que pensava estar perseguindo o centroavante da Hungria. No buraco aberto às suas costas, os outros craques faziam a festa.

Por mais incrível que pareça, há pelo menos um jogo inteiro desse time disponível no youtube. É um jogo histórico, de sessenta e quatro anos atrás, novembro de 1953, gravado em preto e branco e narrado em húngaro. Em Wembley!

A Inglaterra se achava o supra-sumo do futebol e, até essa partida, jamais havia perdido para não britânicos (Escócia, Irlanda, Gales) em seu território. Era comum chamarem os melhores times do mundo para um amistoso em suas dependências, para que ganhassem e esnobassem a plebe futebolística que queria rivalizar com os inventores do futebol. Convidaram então os campeões olímpicos para tirarem uma onda com os caras. Levaram uma sova histórica de meia-dúzia a três, com direito a um gol que é tido como um dos mais bonitos da história, de Puskas (aos 23’50” do vídeo).

Uma aula de futebol.

Seis meses depois deste jogo,uma revanche foi marcada para o Nepstadion, de Budapeste. Foi ainda pior. 7 a 1.

O jogo de um bilhão (da Redação)

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Havia uma grande expectativa em junho de 1985: novamente a Seleção Brasileira faria um jogo decisivo contra o Paraguai para garantir sua vaga na Copa do Mundo do ano seguinte. Em tempos de inflação galopante, a previsão era de uma bilheteria de um bilhão de cruzeiros, moeda da época (equivalente a cerca de 162.400 dólares) para 150 mil pagantes no Maracanã lotado.

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A renda ultrapassou 1,4 bilhão de cruzeiros, mas o Maracanã não lotou: compareceram “apenas” 139.923 torcedores.

Com o empate em 1 a 1, a Seleção garantiu vaga para o Mundial do México. O grande destaque da partida foi o paraguaio Romerito, autor de um golaço que silenciou o estádio.

Quando a Copinha economizava (da Redação)

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Em 1992, o time do Vasco da Gama estava prestes a estrear na Copa São Paulo de juniores, a popular Copinha, diante da Portuguesa de Desportos.

A grande curiosidade, se pensarmos nos tempos atuais, tem a ver com o número de participantes. Naquela ocasião, por medida de economia, a Copinha teve 24 clubes disputando a competição, em vez dos 40 do ano anterior.

O mesmo Vasco acabaria campeão na decisão diante do São Paulo, vencendo nos pênaltis por 5 a 3, depois de empatar no tempo normal por 1 a 1. O artilheiro da Copinha seria Valdir, jovem atacante que depois marcaria seu nome no rol de artilheiros vascaínos.

A parte triste estava, para variar, na violência. Três dias antes da final, foi disputada a partida das semifinais entre São Paulo e Corinthians, no Estádio Nicolau Alayon.

Como o Estádio do Pacaembu estava indisponível, devido ao material usado em um show no fim de semana anterior, o clássico estava marcado para a Rua Javari, mas optou-se por transferi-lo para o Nicolau, para permitir uma presença maior de público.

O clima de guerra entre as torcidas provocou ataques com bombas e rojões, proibidos dentro do estádio. Os torcedores infiltravam-se por trás das arquibancadas, para jogar bombas sobre os adversários, por cima do muro. Uma delas, provavelmente atirada por torcedores do São Paulo, atingiu Rodrigo de Gásperi, um torcedor corintiano de treze anos.

Houve pânico entre boa parte dos doze mil torcedores e o jogo ficou interrompido por 25 minutos, mas acabaria retomado até o fim da prorrogação.

Rodrigo morreria quatro dias depois, no hospital, vítima de lesões cerebrais

Nesta edição recém-iniciada, a Copinha conta com 120 equipes na disputa.

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Flamengo x Palmeiras: dois jogaços em 1979 e 1980 (da Redação)

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Dois jogos, duas goleadas, dois grandes momentos no Maracanã.

Em 1979, pelas quartas de final do Campeonato Brasileiro, o Palmeiras bateu o Flamengo por 4 a 1 no então maior estádio do mundo, lotadíssimo.

No ano seguinte, 1980, o troco rubro-negro: 6 a 2 sobre o Verdão. Vários jogadores atuaram nos dois jogos e viveram céus e infernos do futebol.

Em 1979, o Palmeiras chegaria até as semifinais da competição, sendo eliminado pelo Internacional de Porto Alegre. Já em 1980, o Flamengo conquistaria seu primeiro título brasileiro.

Sampa Fla (da Redação)

Na vitória do Flamengo por 2 a 0 sobre o Figueirense neste domingo pela manhã, o grande destaque foi mais uma vez a presença da torcida rubro-negra.

Jogando a 450 km de sua cidade natal, o Fla colocou mais de 28 mil torcedores pagantes no velho e charmoso estádio do Pacaembu.

Imagens gentilmente cedidas por Eduardo Alonso.

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Joãozinho, um craque celeste (por Paulo-Roberto Andel)

Joãozinho, do Cruzeiro, disputando lance com jogador do River Plate, durante o último jogo da final da Taça Libertadores da América de Futebol, no Estádio Nacional.

Ele foi um dos maiores jogadores da história do Cruzeiro, e marcou época no futebol brasileiro ao lado de outros craques da ponta esquerda entre a segunda metade dos anos 1970 e a primeira dos 1980 – uma posição que incrivelmente não existe mais – como Zé Sérgio, Zezé, João Paulo, Julio César “Uri Geller”, Ziza e Éder, entre outros.

João Soares de Almeida Filho, o Joãozinho, nascido em Belo Horizonte, 15 de fevereiro de 1954)

Disputou 482 jogos com a camisa celeste entre 1973 e 1982, sendo o oitavo jogador que mais a vestiu na história. Marcou 116 gols e é o décimo primeiro maior artilheiro da história do clube. Foi dele o gol que levou o Cruzeiro ao título da Copa Libertadores da América em 1976.

Colaborou Bruno Steinberg – FTT

A Seleção nas Olimpíadas

ROMA, 1960

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Elenco:

1 Roberto Branco • 2 Carlos Alberto • 3 China • 4 Chiquinho • 5 Dary • 6 Décio • 7 Edmar • 8 Gérson • 9 Gil • 10 Jonas • 11 Macarrão • 12 Alvaro Jurandis • 13 Maranhão • 14 Nonô • 15 Paulinho Ferreira • 16 Roberto Dias • 17 Rubens • 18 Valdir • 19 Wanderley • Treinador: Vicente Feola

MUNIQUE, 1972

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Alguns jogadores que fizeram parte do elenco da Seleção Brasileira que disputou os Jogos de 1972: Nielsen, Terezo, Abel Braga, Osmar, Celso, Bolívar, Falcão, Rubens Galaxe, Pedrinho, Washington, Zé Carlos, Manoel, Roberto Dinamite e Dirceu

LOS ANGELES, 1984

SELEÇÃO BRASILEIRA FUTEBOL OLIMPIADAS 1984

seleção brasileira 1984 olimpiadas ELENCO

Cadê Jesus? (por Zeh Augusto Catalano)

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Fim de jogo ontem, Fluminense 2 x 0 Cruzeiro em Edson Passos, na Baixada Fluminense.

A repórter aborda o goleiro Fábio, do Cruzeiro, que acabava de completar 700 jogos pelo time mineiro justamente na derrota para o Flu.

A pergunta foi um pedido de explicações sobre a péssima atuação de seu time.

Fábio não soube explicar. Falou por dois minutos sem dizer nada de muito coerente.

Nem uma única letra sobre deus (assim mesmo, com letra minúscula).

Quando das vitórias, Fabio é um desses jogadores que dizem que foi tudo para glória de Jesus. “Jesus nos abençoou e ganhamos a partida”. Curiosamente, na hora das derrotas, Jesus é esquecido. Será que o time do Cruzeiro anda pecando? Será que não é “em nome de Jesus” que o time adversário tenha jogado infinitamente melhor que seu time e vencido, sem senões, a partida? Deus só vence?

O que acontece, então, quando dois times “ungidos pela fé” se encontram? Só o que vence glorifica de joelhos? E se empatar?

Aqui, no Panorama, temos representantes de todas as religiões. E da falta delas também. Umbandistas, evangélicos, ateus. Eu sou católico. E digo, com orgulho, que não faço orações pedindo vitórias, gols ou sucesso em uma disputa de pênaltis. Tenho vergonha de pedir pra Deus que uma bola entre quando tem gente passando fome pertinho de onde vejo confortavelmente um jogo de futebol. E mesmo que eu rezasse, do outro lado do campo, teríamos um bando de gente rezando pro outro lado. Isso não significa que eu desmereça quem reze. De forma alguma. Me irrita é ver jogador de futebol ganhar milhares de reais na realidade em que vivemos e só lembrar d’Ele nas horas boas.

Imaginem o pobre Deus, no conforto do seu céu, olimpo ou seja lá como a sua religião chame a Sua casa, num dia de Fla-Flu. Milhões de cidadãos acendendo velas, fazendo despachos, orações, oferendas, pagando dízimo, fazendo promessas.

Aí um dos lados vence e os vencedores louvam a Deus – como se Ele fosse o autor dos gols ou das pixotadas que conduziram os números do placar – e os perdedores… O ignoram!

Fábio, por que você não glorificou a Deus na derrota? Será que, no futebol, só a vitória é de Jesus?

Parece piada, mas não é. Quando só menciona a religião nas vitórias, o goleiro (que é o exemplo da vez, mas poderia ser qualquer jogador, inclusive algum do Fluminense ou de qualquer time do futebol brasileiro) deprecia a própria profissão e o esforço de todos os profissionais que o cercam e que trabalham para que o time ganhe. Deus pode influência nos resultados e mover montanhas, mas sem treino, dedicação, vontade firme e – suponho seja o caso – confiança e obediência ao técnico e líder, a bola não vai entrar e o time não vai ganhar.

Deus ajuda quem cedo madruga. E treina, e se dedica, e luta. O time pode até perder, mas, se for dedicado, o torcedor dará apoio.

Parece que o Fluminense rezou muito neste domingo. Daí graças!

Imagem: globoesporte

Sobre o clássico na Ilha do Governador (por Thiago Constantino)

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Enfim, o grande e esperado retorno do futebol aos palcos da Cidade Maravilhosa.

Sofrimento 1 – O eterno desrespeito

Mas peraí? Sábado à tarde? Bom, meu primeiro sofrimento já começa por aí. A insensibilidade de dirigentes, CBF e TV de organizar um clássico dessa magnitude no sábado. Nada mais tradicional do que uma cidade inteira acordando em clima de clássico naquele domingão, e a bola rolando após aquele belo almoço em família. Bom, deixa isso pra lá, pois é um papo que dá para a gente continuar a eternidade discutindo…Futebol, CBF, Clubes, TV, horários, blá, blá, blá.

Vamos ao segundo sofrimento? Desde que anunciaram a Arena Botafogo na Portuguesa, eu fiquei bem animado. Me considero sócio-morador (risos): minha casa fica a 20 passos do clube/estádio, fui criado lá dentro e tudo o que sei na prática sobre futebol desenvolvi na Lusa. Minha habilidade razoável me rendeu algumas medalhas como peladeiro-criança.

Só que o destino está sempre nos pregando peças. Desde o ido ano de 2005, com a finada Arena Petrobrás, os grandes clubes não jogavam aqui. Mas era hora de retomar o protagonismo do futebol carioca. E lá vem a inauguração da nova Arena e o primeiro jogo vai ser… Botafogo x Flamengo. Putz, euforia e tristeza ao mesmo tempo. Como flamenguista, sabia que seria impossível comprar os 1.500 ingressos disponibilizados. E minha teoria foi confirmada quando a diretoria do clube colocou-os à venda apenas a sócios. Ué, mas não vai ter torcida mista? É com muita tristeza que digo que nós, brasileiros, ainda não chegamos a esse nível de educação. E a polícia, ciente disso, corrobora o atestado de incompetência do povo brasileiro.

 

Sofrimento 2 – O Infiltrado

Bom. E agora, o que fazer?

Em um mix de saudades do Flamengo e euforia pelo jogo na porta de casa. E, apesar de minha sogra quase arrancar os cabelos de medo, respirei fundo e decidi: vou comprar ingresso na torcida do Botafogo! Para minimizar o risco, me infiltrei no covil do “inimigo” pela parte social do clube. Mas vou te dizer, R$ 100,00 pelo ingresso nesse momento de crise do país e para um esporte considerado popular…êta mundo cão!

Ao entrar no clube, uma emoção única: meu estádio de infância todo bonitinho e arrumadinho. Passada a primeira emoção, a missão era, óbvio, encontrar algum amigo flamenguista também infiltrado. E não tardou muito para isso. Mas como “copiar” o comportamento da torcida adversária sem deixar a emoção pelo Flamengo transparecer? Missão difícil, mas não impossível. Nada que uma dose de sangue frio e muita tremedeira interna não resolvesse. O fato é que, se eu e meu amigo conseguimos passar pelos 90 minutos ileso, mesmo levantando os braços timidamente nos gols do Botafogo, alguns outros flamenguistas não tiveram tanto êxito. Antes de rolar a bola, um foi descoberto e conduzido pela segurança não sei para onde, ao coro hostil de Via… Filho da P… e uma sonora vaia. No primeiro gol do Fla, outro foi visto comemorando. Emoção e diversão garantidas.

PS: Um elogio sincero à diretoria do Botafogo. A organização foi quase impecável, apesar do “migué” em dizer um dia antes do jogo que os ingressos estavam esgotados. A Arena tem o espaço de 17 mil lugares e 15 mil foram liberados para o clássico, sendo que a torcida do Flamengo ficou com 10%. Com 11.600 presentes, foi fácil perceber vários clarões na torcida do Botafogo.

Torcedor botafoguense, pode chegar e veja se lota a Arena, pô! O futebol carioca merece e seu time precisa do seu apoio.

Aí vai um vídeo interessante sobre o Estádio, apesar do louco dizendo que a Ilha do Governador é distante, mais afastado do Rio de Janeiro. De onde esse cara saiu? De Marte? Só podia ser botafoguense mesmo. Brincadeira.

CLIQUE AQUI

 

Sofrimento 3 – O nível técnico

Vamos falar do jogo? Na hora da bola rolar, vi o técnico da seleção Tite e seu auxiliar Edu Gaspar nas cabines e a pergunta foi “O que esse louco fazia aqui?”. Ele mesmo disse em entrevista, que não veio necessariamente assistir ao jogo e que também tem conversado com os técnicos dos clubes, fazendo uma espécie de troca de experiências. Bom, se foi para isso, ok. Porque em campo, lamentavelmente é nítida a carência de nível técnico no Brasil de hoje. O gramado ainda está ralo e, por isso, duro e fazendo a bola quicar de forma irregular – dos seis gols do jogo, pelo menos quatro foram em falhas individuais bisonhas. O nível técnico foi sofrível, com destaque apenas para o Camilo pela técnica e os estrangeiros Salgueiro e Canales mais, do lado do Fla, William Arão pela movimentação e Mancuello pela visão de jogo (parece uma tartaruga esse menino!). E foi só.

O primeiro tempo foi horroroso e a segunda parte da pelada só foi mais agradável pelos gols e pela alegria da torcida botafoguense com o empate. Teve até gente chorando de emoção, bem ao meu lado.

O Flamengo batia o Botafogo facilmente, por conta dos erros individuais em excesso da equipe alvinegra. Mas o tio Zé “Ricardiola” quando faz um gol bota os onze atrás. Imagine quando está com dois gols à frente no placar. Colocou quatro cabeças de área e o aguerrido time do Botafogo conseguiu o empate. E tem gente que ainda chamava papai Joel Santana de retranqueiro. Sabe de nada, inocente…

É isso aí, pessoal. Ricardo Gomes tentando fazer milagre e tirar o Botafogo do sufoco, acho que os estrangeiros podem ajudar bastante e o Flamengo continuando a namorar o G4, mas olhando com frieza, este amor está mais para Platônico ou Crush, como chama a galera da nova geração. (Vejam esse vídeo, achei muito engraçado!)

Ah, esqueci. A saída foi muito tranquila e com mais 20 passos estava de volta ao espírito rubro-negro, dentro do meu sacrossanto lar.

Imagem: globoesporte

Brasil 1966, há exatos 50 anos

Em 13 de julho de 1966, o Jornal do Brasil noticiava a preocupação dos húngaros com a possível evolução da Seleção Brasileira na Copa do Mundo da Inglaterra, depois de estrear na véspera com uma vitória sobre a Bulgária por 2 a 0, com gols de Pelé e Garrincha.

Tudo seria diferente das preocupações húngaras dois dias depois: Hungria 3 x 1 Brasil e o encaminhamento para aquela que, desde então, foi a pior participação do escrete canarinho numa Copa, com a eliminação na primeira fase da competição. Eram claros os reflexos de tudo o que acontecia no país em termos políticos, com claros reflexos em nosso futebol.

Em tempos em que o jornalismo anda rareando, era um verdadeiro luxo a escalação dos correspondentes internacionais do JB na Inglaterra: José Inácio Werneck, João Máximo, Oldemário Touguinhó e grande elenco. Outras palavras.

BRASIL 1966 HUNGRIA

Uma breve história da Eurocopa (da Redação)

cr7 e pepe michel dalder reuters

Neste domingo, ao derrotar a França, Portugal se tornou o décimo país a conquistar o título da Eurocopa.

A primeira edição do torneio foi disputada em 1960, com o triunfo da União Soviética.

Os países com maior número de títulos são Alemanha (1972, 1980 e 1996) e Espanha (1964, 2008 e 2012).

A França ostenta dois títulos (1984 e 2000).

Portugal já havia disputado a final da Eurocopa em 2004,  perdendo o título por 1 a 0 para a Grécia.

A lista de todos os campeões é a seguinte:

1960 – União Soviética
1964 – Espanha
1968 – Itália
1972 – Alemanha
1976 – Tchecoslováquia
1980 – Alemanha
1984 – França
1988 – Holanda
1992 – Dinamarca
1996 – Alemanha
2000 – França
2004 – Grécia
2008 – Espanha
2012 – Espanha
2016 – Portugal

A lista traz algumas curiosidades. Por exemplo, a recente supremacia ibérica na competição. Os brilhos efêmeros da Dinarmarca em 1992 (que entrou como convidada no lugar da Iugoslávia, envolvida em terrível guerra) e da Grécia em 2004.

De todas as seleções campeãs, as que se destacaram nas Copas do Mundo disputadas imediatamente a seguir foram a Itália vice-campeã em 1970, a Alemanha campeã em 1974 e vice-campeã em 1982, mais a Espanha campeã em 2010.

Tivesse começado dez anos antes, talvez a Eurocopa testemunhasse o vigor da belíssima Hungria dos anos 1950. Não deu. Uma pena.

Imagem: Michel Dalder/Reuters

 

Os sete a um, dois anos depois

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O futebol produz momentos inesquecíveis. Qualquer apaixonado por futebol guarda em sua memória e coração partidas épicas, atuações brilhantes. A virada da Mercosul em 2000 para os vascaínos, por exemplo. Um segundo tempo perfeito.

Ou lances únicos. Aquele instante eterno.

Gol do Cocada em 1988.

Para quem não se lembra, foi uma partida modorrenta, cujo empate persistente daria o título carioca ao Vasco. O chute do Cocada a pôs na história. A comemoração, a expulsão, a posterior pancadaria entre Romário e Renato. O jogo se resume àquele lance e tudo mais decorreu daquele fato.

Os eternos sete a um destoam das duas descrições anteriores. São talvez os oito minutos (cinco minutos entre a marcação dos quatro gols) mais inexplicáveis da história do futebol. Um time recheado de estrelas (Júlio César; Maicon, David Luiz, Dante e Marcelo; Luiz Gustavo, Fernandinho, Bernard, Hulk e Oscar; Fred.) comandado por Felipão, o último técnico brasileiro a levantar o mundial, que desmoronou como um castelo de cartas.

Não houve uma única tentativa de esfriar os alemães, mudar o ritmo do jogo, nada. Por três inacreditáveis vezes a bola la foi posta no centro do campo e o Brasil deu a saída para levar outro gol. Fosse boxe, o técnico teria jogado a toalha e interrompido ali o vexame.

Dia 19 de junho passado, o México levou de 7 a 0 do Chile, na semifinal da Copa América, jogando “em casa”. A partida foi disputada nos Estados Unidos, num estádio apinhado de mexicanos que acreditavam piamente numa final contra os favoritos argentinos – os únicos a não passar vexame, como Brasil e Uruguai, eliminados na primeira fase por respectivamente Peru e Venezuela. O México tomou cinco gols no segundo tempo, mas eles não foram frutos de uma hecatombe instantânea e coletiva.

Costumo assistir os jogos na sala de casa. Quando o Brasil tomou o segundo gol, fui até a copa pegar água. Enchi o copo, parei na frente da TV. Gol. Sentei-me e fiquei ali, pasmo, vendo aquilo.

Lembro mais dos rostos dos jogadores e técnico do que dos lances em si. Fred, David Luiz, Dante. Julio Cesar. Tão pasmos quanto eu. Homens com vasta experiência internacional. Alguns campeões do mundo por clubes e por seus países.

Não se pode dizer que a seleção era mal-treinada. Ela não era treinada. Numa época de poucos talentos, o comando de Felipão era uma mistura de Família Scolari com um “pra frente Brasil” que já havia dado sinais claros de instabilidade na trave de Pinilla, no último minuto de uma prorrogação contra o Chile. A sorte mais uma vez havia sorrido para nós. Os dois primeiros jogos eliminatórios foram contra Chile e Colômbia, fregueses contumazes. Ainda assim, o Chile só ficou pra trás nos pênaltis. Então, na base da “fé”, chegamos à semifinal, a dois jogos do sonho de manter a Copa do Mundo por aqui.

Muitos anos ainda passarão até a redenção do futebol brasileiro. Até lá, convém lembrar bem daqueles minutos inacreditáveis.

Sobre Alberto Léo (por Paulo-Roberto Andel)

alberto leo fluzão

Decano do jornalismo esportivo do Rio de Janeiro, Alberto Léo saiu de cena nesta quinta-feira fria e triste. Esperou até o último momento pelo seu Fluminense, mas as coisas não deram certo diante do Santos.

Há 16 anos, pertencia ao time da antiga TVE e, posteriormente, EBC – TV Brasil.

Pioneiro dos esportes da Rede Bandeirantes, começou em 1980, onde esteve ao lado de outras feras como Márcio Guedes, Paulo Stein e José Roberto Tedesco. Mais tarde, boa parte dessa equipe foi para a antiga TV Manchete, reforçada simplesmente por João Saldanha.

Na TVE, trabalhou como comentarista do programa Ataque, mesa-redonda exibida no domingo à noite. Depois, foi editor-chefe do programa, que hoje se chama No Mundo da Bola. Há três anos, havia assumido a Gerência de Esportes da EBC no Rio de Janeiro, sendo responsável pela programação esportiva da TV Brasil e da Rádio Nacional.

Não bastasse a carreira admirável de Alberto Léo, era uma pessoa extremamente afável, educada, elegante. Acompanhei-o como torcedor por décadas e nunca vi uma rusga sua com quem quer que fosse. Não apenas um profissional da antiga, qualificado, pausado, mas também um ser humano admirável. Gente que a gente precisa ver mais nas ruas, nos transportes públicos, nas repartições, nas mesas e rodas, no Fluminense também.

Em 2007, tive a oportunidade de entrevistá-lo na TVE para um livro, pronto, inédito, que um dia será publicado. Foram horas muito agradáveis e de simpatia, com muitas histórias legais. Alberto Léo era um tricolor 100% fidalgo na acepção da palavra, desses que andam faltando por aí.

Gostaria de falar muito mais, mas desculpem-me por favor a brevidade.

O tempo vai passado e as pessoas da minha geração vão perdendo as peças dos seus quebra-cabeças da infância. Alberto Léo era uma referência fundamental.

Penso no título “O Fluminense que eu vivi” e a tristeza é inevitável.

Em certas horas, o silêncio fala mais alto do que tudo.

Imagem: PRA

Colaborou Fernando Borges

Fla, Flu e Bangu: as cores de cada paixão (da Redação)

capa livro paulo rocha

O cronista Paulo Rocha, decano de várias redações e ex-editor do Jornal dos Sports, atualmente titular dos sábados no site Panorama Tricolor, lança em julho o livro “Fla, Flu e Bangu: as cores de cada paixão”, de sua coautoria ao lado dos também jornalistas Carlos Molinari e Sergio Du Bocage, onde cada um dos escritores aborda seu time de coração.

O livro já se encontra em pré-venda no SITE DA EDITORA NOVA TERRA.

O Jornalismo Esportivo tem uma característica que o diferencia de todos os demais. Ele fala de paixão, principalmente quando trata de futebol. Mais que isso: quem o pratica é um apaixonado pelo que faz. E como falar de futebol, sem ter um clube de preferência para torcer? Misture tudo isso e veja o quanto é difícil, para um jornalista esportivo, ser imparcial e transmitir esse sentimento para leitores, ouvintes e telespectadores. Mas eles conseguem.

“Fla, Flu e Bangu – as cores de uma paixão” é uma chance que a Editora Novaterra oferece aos jornalistas Sergio du Bocage, Paulo Rocha e Carlos Molinari de colocarem para fora essa paixão. E o que vemos são crônicas informativas, curiosas, pessoais e que certamente vão mexer com o coração dos milhões de torcedores desses três clubes.

Você está convidado a participar desse autêntico triangular. Temos certeza de que cada capítulo será um jogo inesquecível para você. Boa leitura.

Formato: 14 x 21 cm – Brochura
Número de páginas: a definir
ISBN 978-85-61893-50-7

livro paulo rocha

Galos de briga (da Redação)

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A badalada classificação do time do Audax à final do Paulistão 2016 causa entusiasmo aos fãs de futebol, devido ao bom desempenho técnico do time. Em outras ocasiões, outros times de menor investimento já chegaram a momentos decisivos de campeonatos regionais e até nacionais, com pleno êxito. Relembre aqui alguns momentos.

Operário-MS x São Paulo – Semifinal do Campeonato Brasileiro de 1977 (1º jogo)

Palmeiras x Internacional de Limeira – Final do Campeonato Paulista de 1986 (2º jogo)

Bragantino x Novorizontino – Final do Campeonato Paulista de 1990 (2º jogo)

Grêmio x Criciúma – Final da Copa do Brasil de 1991 (1º jogo)

Botafogo x Juventude – Final da Copa do Brasil de 1999 (2º jogo)

Flamengo x Santo André – Final da Copa do Brasil de 2004 (2º jogo)

São Caetano x Santos – Final do Campeonato Paulista de 2004 (2º jogo)

Fluminense x Paulista – Final da Copa do Brasil de 2005 (2º jogo)

Botafogo x Madureira – Final do Campeonato Carioca de 2006 (2º jogo)

Santos x Ituano – Final do Campeonato Paulista de 2014 (2º jogo)

Futebol de Praia: Carioca 2016 em Copacabana (por Paulo-Roberto Andel)

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No sábado passado, 16/04, o PANORAMA DO FUTEBOL registrou cenas de mais uma rodada do Campeonato Carioca de Futebol de Praia, na modalidade 11.

Imagens dos jogos Bairro Peixoto x São Clemente (aspirantes) e Juventus x Copaleme (aspirantes e amadores) – este, com destaque para a homenagem aos 60 anos do clássico, realizada antes da partida de fundo. E mais um trecho de “Craques da areia”, com o depoimento de Marcelo Bueno, tricampeão mundial pela Seleção Brasileira de Beach Soccer.

O PANORAMA apoia e defende a ampla estruturação do futebol de praia em investimentos e divulgação; um dos esportes mais tradicionais do Rio de Janeiro, posteriormente espalhado pelo Brasil e pelo mundo, merece mais atenção dos cariocas.


Uma produção Silvio Almeida Filmes

Direção: Paulo-Roberto Andel

Trilha sonora: “Jazz Carnival”, Azymuth

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O destino do America (por Paulo-Roberto Andel)

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Rebaixado ontem pela terceira vez à série B do Campeonato Carioca em menos de dez anos, o America infelizmente deixa dúvidas quanto ao seu futuro.

Segundo time de considerável parcela dos torcedores cariocas, com uma bela história, aos poucos, o importante clube foi dando passos rumo ao ostracismo a partir dos anos 1980. Bem verdade que o alijamento à caneta do campeonato brasileiro de 1987 contou muito neste sentido, mas não foi o único fator. As sucessivas diásporas com a mudança dos campos, a falta de verba, as dívidas e o descaso ajudam a explicar o processo.

A decomposição foi avançando, a torcida fanática foi encolhendo de tamenho e um dos orgulhos da cidade foi ficando de lado.

Que o America pode voltar ao cenário local da primeira divisão estadual, é fato.

Resta saber se, um dia, ele poderá retomar sua posição de grande clube do futebol brasileiro e símbolo do Rio de Janeiro.

Num domingo tão deprimente para o país, a terceira queda do simpático Diabo parece infelizmente fazer sentido.

Fica a torcida para que a recuperação aconteça, por mais difícil que seja.

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@pauloandel

Futebol de praia na enseada de Botafogo (por Paulo-Roberto Andel)

No sábado passado, 09/04, o PANORAMA DO FUTEBOL registrou imagens dos jogos entre o Força e Saúde e o São Clemente, nas categorias Aspirante e Amador, válidos pela segunda rodada do Campeonato Carioca de Futebol de Praia 2016.

Num cenário belíssimo, dos maiores cartões postais do mundo – a praia de Botafogo tendo o Pão de Açúcar e a Urca ao fundo.

Nos Aspirantes, empate em 1 a 1. Nos Amadores, o Força venceu por 2 a 0.

O futebol de praia é uma das grandes expressões do esporte litorâneo no Brasil, sendo praticado há décadas (desde os anos 1950) e tendo como berço a praia de Copacabana, tendo fornecido vários craques para os gramados, como o goleiro Renato (Atlético Mineiro, Seleção Brasileira de 1974, Flamengo, Fluminense e Bahia), o zagueiro Edinho (Fluminense e Seleção Brasileira 1978-1982-1986), o lateral Júnior (Flamengo e Seleção Brasileira 1982-1986), o meia Paulo Cézar Caju (Campeão mundial em 1970, Copa de 1974 e diversos grandes clubes), dentre muitos outros.

Precisa ser valorizado à altura tanto em termos midiáticos quanto de estrutura.

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Um OVNI sobre o Vasco, 1982 (da Redação)

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Seis de março de 1982.

Operário, de Campo Grande, e Vasco, disputam uma partida importante no Estádio Pedro Pedrossian, vulgo Morenão, na capital do Mato Grosso do Sul. Estádio lotado. Só mais uma de milhares partidas dos intermináveis campeonatos nacionais dos anos 70 e 80.

Mas um fato marcou o jogo. O estádio teria sido sobrevoado por um OVNI, fato testemunhado por milhares de pessoas, dentro e fora do estádio. Entre os presentes, vários jogadores de seleção brasileira. No time do Operário, começando a carreira, um certo Cocada, que conta nos vídeos abaixo o que viu. No Vasco, as declarações são dadas incrivelmente por… Rondinelli, que pouca gente lembra, mas atuou pelo Vasco em 1982.

Eu me lembrava desse fato e fui fazer a pesquisa, que me levou a estes vídeos abaixo. Descobri o documentário “O que era aquilo” que parece ser sobre o jogo em questão e a aparição do OVNI. Na verdade, aparentemente, o jogo foi só um gancho. O documentário acaba sendo sobre a destruição do futebol do Comercial e do Operário, este último time de muito sucesso nos anos 70, chegando a disputar a semifinal do campeonato brasileiro de 1977, perdendo para o depois campeão São Paulo. No gol, Manga. A derrota por 3 a 0 na 1a perna da semifinal, em São Paulo, é até hoje contestada pelos torcedores do Operário. Uma mariola pra quem adivinhar o juiz…

O documentário tem uma hora de duração e pode ser visto pelo link abaixo. Recomendo. Sugiro especial atenção para a senhora torcedora apaixonada do Operário e para as desatrosas intervenções do Editor do Globo Esporte, em trechos mais para o final do filme.

Links:

Ovni sobrevoa estadio do Morenão no MS, no jogo Operário-MS × Vasco da Gama.

http://www.magnettico.com.br/o-que-era-aquilo/

A tristeza do Bugre (por Paulo-Roberto Andel)

guarani 0 2 barretos 03 04 2016 - rodrigo villalba

Domingo de manhã, comecei a zapear os canais e então bati os olhos no futebol. O velho Guarani de guerra na briga da Segundona em São Paulo, numa decisão contra o Barretos – este, com seu uniforme de cores bolivianas que me remeteu ao Sampaio Correa.

Qualquer garoto em 1978 sabia a seguinte escalação: Neneca, Mauro, Gomes, Édson e Miranda; Zé Carlos, Renato e Zenon; Capitão, Careca e Bozó. Um timaço que bateu o Palmeiras naquele ano e se tornou o único campeão brasileiro do interior ao lado do Santos.

No ano de 1979, veio a Libertadores e os dois times alviverdes fizeram seus jogos da primeira fase contra os peruanos Alianza e Universitario de Lima. Partidas nas manhãs de domingo. Para mim, uma boa lembrança da juventude: volta e meia meu pai me dava dinheiro para comprar lasanha pronta num restaurante de Copacabana, a trattoria Torna, que ficava na rua Anita Garibaldi. Depois dos jogos, a deliciosa refeição tinha um sabor ainda mais acentuado, principalmente se depois a boa pedida fosse um jogo no Maracanã. O Bugre passou fácil pela primeira fase, com goleadas sobre o Palmeiras e o Universitario, vindo a cair nas semifinais (dois triangulares, onde os primeiros decidiam o título) e terminando em quarto lugar na maior competição de futebol da América.

O querido Guarani que depois seria semifinalista do Brasileiro em 1982 e vice-campeão em 1986. Pensem em nomes como Neto, Evair, Amoroso, Luizão e Edílson Capelinha: todos foram revelados no Brinco de Ouro da Princesa.

O tempo passou, o dinheiro acabou, as dívidas se acumularam, o estádio foi a leilão. Na Segundona também estavam – ou estão – a Portuguesa, o Marília, o Bragantino, o Juventus, próceres da gênese do futebol paulista.

O Barretos foi melhor e fez seus gols no segundo tempo. O resultado tirou o Guarani da fase final, onde serão decididas as vagas de acesso. Mais um ano de agonia, mais um domingo de tristeza, agravado por ser o dia seguinte ao aniversário de 105 anos do clube campineiro.

Penso naquela saborosa lasanha de 37 anos atrás. A mesada do meu pai. Zé Carlos, Renato e Zenon.

Outro dia mesmo, o Guarani era dos maiores; agora, suas chagas são carne viva.

O Brinco de Ouro da Princesa continua bonito, apesar de tudo. Mas tudo isso me remete aos sinais claros da decadência do nosso futebol.

O lugar do Bugre é em cima – ou, ao menos, deveria ser.

Imagem: Rodrigo Villalba

Flamengo x Vasco: o clássico em Brasília (por Thiago Constantino e Diogo Barreto)

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É esse o legado da Copa?

Como pode um estádio de Copa do Mundo, um dos três mais importantes do país, estar há 20 dias sem manutenção do gramado, sabendo que abrigaria o maior clássico do Rio de Janeiro?

Como pode um clássico da grandeza de Flamengo x Vasco ser realizado em uma quarta-feira à noite?

Como pode os dois melhores jogadores em campo serem estrangeiros?

Como pode Guerrero ser a estrela maior de uma nação?

Como pode Martin Silva ser reserva na seleção do Uruguai?

Como pode num jogo de tamanha tradição no cenário nacional faltar tanta inspiração e sobrar transpiração?

Ao menos na quarta, de volta à medíocre realidade do futebol brasileiro, sobrou transpiração. Porque, ainda sob os efeitos do clássico, continuamos a ver camisas solitárias, chuteiras sedentárias e cabeças milionárias. O único a enxergar diferente disso foi o nosso comandante. Mas se todos nós não estamos certos, ao menos nos resta entender o célebre Nelson Rodrigues com sua unanimidade burra.

Do Flamengo, ressalto novamente a transpiração. Pode ser que o ano tenha começado, pode ser pelo fim do cansaço, medo da torcida ou porque o adversário era o Vasco.

Ainda diria que o Rubro-Negro esteve mais de perto de vencer e pôr fim à incômoda série de insucessos diante do rival, mas esbarrou na ótima atuação do goleiro Martín Silva, que salvou o Cruz-Maltino algumas vezes na partida. Também para pôr fim à crise instalada e conseguir se manter na briga pela classificação, só resta ao Flamengo vencer o Botafogo no sábado. O gol já voltou, mas as vitórias… aguardem as cenas dos próximos capítulos…

O Vasco não jogou bem, tentou controlar o jogo e explorar os contra-ataques; foi punido pela sua postura em campo mas logo se redimiu, manteve a liderança e a invencibilidade no campeonato.

@diogobarreto1

Imagem: Agência Estado

O contraexemplo da formula 1 (por Zeh Augusto Catalano)

Agência O Globo

Domingo à tarde, Vasco e Botafogo, os dois líderes e melhores times do Campeonato Carioca, disputavam, em São Januário,  um jogo que tinha tudo para ser bem interessante – como foi. Mas não para o torcedor. Oito mil testemunhas presenciaram o cotejo. As sociais vazias são mais um alerta de que as coisas vão mal, obrigado, no mundo do futebol. E este não é um fenômeno brasileiro. Há exceções – Inglaterra e Alemanha – mas é muito comum ver campos às moscas mundo afora em praças importantes como Itália e Espanha.

Mais que campos vazios, há um desinteresse crescente pelo esporte na TV também. Domingo, assisti sozinho o jogo no bar de um clube. Durante o segundo tempo, apenas dois cidadãos vieram ver o que passava na televisão. O clube estava cheio. Ninguém deu bola pro jogo.

Até 1994, a Formula 1 era uma das paxões do brasileiro. As pessoas não saíam de casa. Tinham de ver a corrida do Senna. Naquele fatídico primeiro de maio, essa paixão virou tristeza. Mas se engana quem pensa que foi a morte do ídolo que transformou a F1 nesse espetáculo insuportável de hoje. A derrocada começou com um super-carro da Ferrari, que pulverizou os demais, ganhando todas as corridas do ano. Somou-se a isso uma escolha catastrófica de regulamento dos carros, transformando as corridas numa enfadonha procissão. Lembro-me de Galvão Bueno vibrando com trocas de pneus. As únicas ultrapassagens se davam nos boxes.

Em suma, o que a Formula 1 tinha de melhor –  equilíbrio, cracaços no volante -, desapareceu. Em vez de três ou quatro carros brigando por vitória, sete ou oito pilotos, um alemão Dick Vigarista desfilando sua arrogância e passeando sem ameaças.

O equilíbrio e a emoção desapareceram. Com isso, claro, o público despencou. Patrocínios também.

O exemplo está ai. O futebol segue a passos largos o mesmo caminho de desequilíbrio. É a famosa espanholização. Tomara que não seja tarde demais.