Vitória da resiliência (por Thiago Constantino)

brasil bola murcha

Talvez um dia fosse difícil jogar contra o Paraguai. Mas nunca achei que fosse tanto.

Até o fim dos anos 70, nunca havíamos perdido para eles lá. Porém dos anos 2000 para cá, nunca mais tivemos o sabor da vitória em solo guarani.

Desde 2009, não ganhamos deles onde quer que seja o local de jogo. Também não perdemos. Se você vê alguma vantagem nisso, precisa rever seus conceitos.

A Seleção Brasileira, margeada pelo futebol nativo, está claramente em uma péssima safra. E não é de hoje. Desde o apito final da Copa de 2002, uma era se encerrou. Se você não consegue ver isso, insisto, precisa rever seus conceitos.

De lá para cá, quem vê futebol todos os dias sabe que a desordem total ficou evidente.

Craques em final de carreira se arrastando em campo, recordes pessoais acima dos anseios da nação e muito mais. E o que essa bagunça gerou?

Vamos aos fatos.

Planejamento

O futebol brasileiro e consequentemente a Seleção não se entendem. Não há planos sérios para o futuro e os dirigentes contam com os jargões de sempre como “Ah, na hora H os craques resolvem”.

Craques? Caem eles do céu? Oba! Hoje fui na maternidade lá em Três Corações e tive uma grande notícia: -“Nasceu outro Pelé!”

Não, não nasceu outro Pelé. Edson só foi Pelé porque Gerson foi Gerson, Garrincha foi Garrincha e tantos outros foram… coletivo.

E o que temos para hoje? Vou citar aqui os nomes convocados e mais dois possíveis substitutos. Quero provar que, por mais divergências sadias que tenhamos, vamos acabar no lugar comum. Quer apostar?

Preste bem atenção na convocação para os dois últimos jogos e, em negrito, o complemento de possíveis substitutos:

GOLEIROS

Alisson (Internacional)
Marcelo Grohe (Grêmio)
Diego Alves (Valencia)

Jeferson (Botafogo), Victor (Atlético-MG), Fábio (Cruzeiro), Cassio (Corinthians), Cavalieri( Fluminense)

ZAGUEIROS

David Luiz (PSG)
Miranda (Inter de Milão)
Marquinhos (PSG)
Gil (Shandong Luneng)

Thiago Silva (PSG), Felipe (Corinthians), Alex (Milan), Luisão (Benfica)

LATERAIS

Danilo (Real Madrid)
Daniel Alves (Barcelona)
Filipe Luis (Atlético de Madrid)
Alex Sandro (Juventus)

Marcelo (Real Madrid), Marcos Rocha (Atlético MG)

VOLANTES

Luiz Gustavo (Wolfsburg)
Fernandinho (Manchester City)
Renato Augusto (Beijing Guoan)

Elias (Corinthians), Hernanes (Juventus), Ramires(Jiangsu)

MEIA-ATACANTES

Philippe Coutinho (Liverpool)
Oscar (Chelsea)
Lucas Lima (Santos)
Willian (Chelsea)
Kaká (Orlando City)
Douglas Costa (Bayern de Munique)

Nenê (Vasco), Lucas (PSG), Ganso (São Paulo)

ATACANTES

Neymar (Barcelona)
Hulk (Zenit)
Ricardo Oliveira (Santos)

Jonas (Benfica), Pato (Chelsea), Fred (Fluminense)

E aí? Discorda de algum desses nomes?

Desafio você leitor a tirar um nome mágico da cartola que vá revolucionar as quatro linhas.

Qualquer dos nomes citados, mais uns três ou quatro que possam surgir, refletem e reforçam a unanimidade seguinte : o único craque que temos chama-se Neymar.

Mas esses que estão aí, são tão ruins assim? Não mesmo.

São todos de bons para ótimos jogadores. Quase a totalidade joga nos grandes clubes do mundo e são titulares de suas equipes. Mas o que acontece?

Em suas equipes eles são parte da engrenagem, estruturada de modo a também funcionar sem eles.

Uma vez, antes da copa de 2014, Carlos Alberto Torres cravou: “-Essa seleção terá amadurecido e provavelmente estará pronta para 2018 e 2022”. O  Capita não terá errado.

E estar pronta não significa apenas se classificar para a Copa. Para tal feito é necessário mais do que isso.

Se a técnica não nos permite alcançar algo mais, não é no grito e na base da cara feia que iremos separar os homens dos meninos.

Temos que planejar, organizar e vislumbrar algo mais moderno para que possamos extrair o melhor dos que aí estão.

Ao menos temos que tentar. Mas para que isso aconteça, é necessariamente urgente que se reconheça abertamente, a safra é ruim.

As seleções que se destacam hoje no mundo tem um coletivo muito acima da média, com um individual que colocam no bolso qualquer suposto “craque”brasileiro. E esse, definitivamente não é o caso de Uruguai e principalmente do Paraguai.

Voltando ao Paraguai de hoje, talvez se houvesse um Gamarra na zaga, ou um Chilavert no gol e o time vermelho, branco e azul poderia ter tido melhor sorte. Já que não havia, sorte nossa….ou….sorte de Dunga, que deverá sobreviver mais algum tempo sem nada de bom agregar. Tempo e vai se esvaindo pelas mãos ao passo que o “país do futebol” continua a merecer esse tão singela homenagem, mais pelo seu povo aguerrido e sempre com um fio de esperança do que pela prática do esporte Bretão.

E aí? Você precisa rever seus conceitos? Volte no tempo e reveja o futebol de 2002 até os dias de hoje.

Se não precisa rever, é porque já tomou uma boa dose de resiliência, e para o período atual, melhor remédio não há.


Resiliência é a capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças.

Imagem: letrascronicas.blogspot.com.br

O contraexemplo da formula 1 (por Zeh Augusto Catalano)

Agência O Globo

Domingo à tarde, Vasco e Botafogo, os dois líderes e melhores times do Campeonato Carioca, disputavam, em São Januário,  um jogo que tinha tudo para ser bem interessante – como foi. Mas não para o torcedor. Oito mil testemunhas presenciaram o cotejo. As sociais vazias são mais um alerta de que as coisas vão mal, obrigado, no mundo do futebol. E este não é um fenômeno brasileiro. Há exceções – Inglaterra e Alemanha – mas é muito comum ver campos às moscas mundo afora em praças importantes como Itália e Espanha.

Mais que campos vazios, há um desinteresse crescente pelo esporte na TV também. Domingo, assisti sozinho o jogo no bar de um clube. Durante o segundo tempo, apenas dois cidadãos vieram ver o que passava na televisão. O clube estava cheio. Ninguém deu bola pro jogo.

Até 1994, a Formula 1 era uma das paxões do brasileiro. As pessoas não saíam de casa. Tinham de ver a corrida do Senna. Naquele fatídico primeiro de maio, essa paixão virou tristeza. Mas se engana quem pensa que foi a morte do ídolo que transformou a F1 nesse espetáculo insuportável de hoje. A derrocada começou com um super-carro da Ferrari, que pulverizou os demais, ganhando todas as corridas do ano. Somou-se a isso uma escolha catastrófica de regulamento dos carros, transformando as corridas numa enfadonha procissão. Lembro-me de Galvão Bueno vibrando com trocas de pneus. As únicas ultrapassagens se davam nos boxes.

Em suma, o que a Formula 1 tinha de melhor –  equilíbrio, cracaços no volante -, desapareceu. Em vez de três ou quatro carros brigando por vitória, sete ou oito pilotos, um alemão Dick Vigarista desfilando sua arrogância e passeando sem ameaças.

O equilíbrio e a emoção desapareceram. Com isso, claro, o público despencou. Patrocínios também.

O exemplo está ai. O futebol segue a passos largos o mesmo caminho de desequilíbrio. É a famosa espanholização. Tomara que não seja tarde demais.

Um vai, outro fica (por Mauro Jácome)

16-06-2006, DUITSLAND.  JOHAN CRUIJFF. FOTO BAS CZERWINSKI 16-06-2006, DUITSLAND. JOHAN CRUIJFF.
FOTO BAS CZERWINSKI[/caption]

Johan Cruyff e Rinus Michels, um dentro e outro fora de campo, formaram uma dupla que ajudou a revolucionar o futebol a partir dos anos 70. As ideias e a forma de jogar refletiram no que aconteceu a partir da união dos dois no Ajax, no Barcelona e, principalmente, na Laranja Mecânica da Copa de 1974.

Para muitos, a influência foi positiva, principalmente para os países vizinhos. Até então, percebia-se um forte investimento europeu no futebol-força para concorrer com a técnica latina, com destaque para os sul-americanos. O surgimento do futebol-total de Michels, que era a convergência das diversas características do futebol praticado na Europa, com a técnica de Cruyff, despertou o mundo para algo que parecia impossível: futebol com ciência e técnica, ou seja, preparo físico e tático com qualidade técnica. Hoje, podemos perceber equipes, seleções e jogadores que assimilaram e desfilam esses conceitos.

Disse anteriormente que muitos adquiriram essas influências e cresceram, no entanto, teve quem não compreendeu o que estava presenciando e fez da Copa de 1974 o divisor de águas. A derrota para a Holanda e, posteriormente, para a Polônia, que não tinha a qualidade da Holanda, mas jogava em alta velocidade, levou o Brasil a um entendimento equivocado. Sob a justificativa de que precisávamos de mais competitividade para não sermos engolidos novamente, era necessário desenvolver um jogador mais bem preparado fisicamente, mais educado taticamente e com mais preocupações defensivas. A partir daí, foi dada a largada para a nossa decadência técnica. Em nome de um “futebol consistente” descambamos para menos craques e mais volantes, menos dribles e mais bola aérea, menos toques e mais chutões, menos gols e mais faltas. E os novos paradigmas inundaram as categorias de base. Tudo ficou contaminado.

Ao contrário dos outros centros do futebol, a técnica passou a ser vista por aqui, digo, pelos treinadores, até como sinal de irresponsabilidade. Garrincha não ficaria cinco minutos numa peneira qualquer. Talvez, o auge desse declínio técnico, pelo menos para fins didáticos e midiáticos, tenha sido a Seleção de Lazaroni. Tanto é que, após a Copa de 90, decretou-se o estágio do nosso futebol de Era Dunga. O volante, que não era um craque, mas também não era nenhum cabeça-de-bagre, pagou o pato, afinal, na nossa sociedade maniqueísta, alguém tem que assumir a responsabilidade pelas tragédias.

Desde então, tivemos suspiros, por exemplo, a Seleção de Telê Santana. Os 7×1 representam bem o contraste que o Carrossel Holandês ajudou a criar: de um lado, um time com diversas características do legado que Michels e Cruyff deixaram e, do outro, o exemplo acabado do erro de interpretação desse mesmo legado.

Para onde vamos? Infelizmente, Dunga está mais preocupado em vencer suas quedas de braço com a lógica do que, efetivamente, iniciar uma nova era no futebol brasileiro.

@MauroJacome

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Dois Dungas (por Paulo-Roberto Andel)

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Para os mais jovens, é importante dizer que a trajetória insossa de Dunga como treinador de futebol é distinta, ao menos em boa parte, de sua vida como jogador.

Volante de bons recursos técnicos, capaz de acertar passes longos, dotado de um chute forte e uma garra infinita em campo, não foi campeão do mundo à toa.

Contra si, teve o injusto linchamento midiático (para variar…) na Copa de 1990. A precoce eliminação diante da Argentina do genial Maradona levou a grande imprensa a culpar Dunga por tudo de ruim que aconteceu numa Seleção conturbadíssima. Um ano antes, depois de uma crise, o Brasil tinha ganho a Copa América depois de quatro décadas de espera. A expressão “Era Dunga” foi puro e cruel reducionismo, o que talvez ajude a explicar certa rispidez do treinador em entrevistas, alimentada por rancores do passado.

Já o profissional à beira das quatro linhas deixa a desejar. Sempre desejou. Remake da experiência realizada com Falcão depois daquela mesma Copa da Itália, Dunga chegou à condição de treinador da Seleção Brasileira sem qualquer experiência em clubes. Os dois casos foram inspirados em Franz Beckembauer, o cracaço vitorioso à frente da Alemanha campeã mundial em 1990. Um detalhe: o Kaiser levou anos a fio em cursos de preparação para o ofício de treinador, o que naturalmente não aconteceu com a dupla brasileira. Depois de muitos anos como comentarista, Falcão trabalhou no Bahia e tem feito uma boa jornada no Sport.

As empolgantes estatísticas que se firmaram com a inesperada conquista da Copa América de 2007, mais as vitórias nos amistosos que vão do nada a lugar nenhum deram-lhe um enganoso estofo triunfante. Na hora H, na África do Sul, o que se viu foi uma Seleção destrambelhada, convocada à base de caprichos pessoais e teimosias, que encerrou seu caminho diante de uma pavorosa partida contra a Holanda, na derrota de virada por 2 a 1. A imagem de Dunga com olhar atônito para seu banco de reservas durante aquele jogo é uma página eterna dos maus momentos do futebol brasileiro. Mas justiça seja feita: a arrogância sem limites do medíocre treinador foi também inflada pela eterna opressão da Rede Globo, contrariada em seus interesses comerciais – e qualquer semelhança com os tempos atuais será mera coincidência.

Daquele fracasso até 2014, foram quatro anos de limbo com uma apagada passagem pelo comando do Internacional e só. O que não deu certo em 2010 virou a promessa de dias melhores depois dos 7 a 1, numa CBF cheia de cartolas em cana ou à beira dela. Nada mudou. Dunga não evoluiu. Pouco trabalhou na função. Ao menos, reapareceu mais “humilde” em entrevistas coletivas. De resto, o que se vê é o contestável neymarbol e a insistência permanente na exclusão/rejeição de nomes como Thiago Silva e Marcelo, por exemplo, para a teimosia atroz na escalação de nomes como o de David Luiz – co-responsável por pelo menos 4 daqueles malditos 7 da Alemanha, no desastre do Mineirão.

A Seleção vive um momento complicado, reflexo de tudo que cerca o futebol brasileiro atual, muito visível ontem depois de ser completamente dominada pelo mediano escrete uruguaio. Sua grande história pode até empurrá-la a mais uma classificação em Mundiais, até mesmo numa desagradável repescagem. Mas hoje, pontualmente hoje, estamos em risco para 2018. E mesmo que ele seja superado, para o que todos torcemos muito, será difícil imaginar um Brasil hexacampeão, ainda mais demonstrando aquilo que foi sua maior marca do passado: um grande futebol.

O Dunga das quatro linhas é infinitamente superior ao da beira delas. Se o caso era trazer um treinador de força, líder incontestável, que tivesse a personalidade parecida com a do atual comandante, Leão teria sido um nome com mais estofo, currículo e resultados, mesmo tendo sido rifado da Seleção em 2001. Se a questão priorizasse o talento, Muricy e Tite seriam opções muito mais consistentes e relevantes.

O que não tem remédio, remediado está. Terça-feira tem mais.

@pauloandel

Imagem: globoesporte

Sobre Cruyff (por Paulo-Roberto Andel)

cruyff

A única certeza da vida é a morte.

E por mais que ela seja esperada, sempre assusta.

Ontem à noite, eu estava com meus amigos Fagner Torres, Paulo Tibúrcio, Nelson Borges e Leo Prazeres na Casa Vieira Souto, coração do centro do Rio. Vimos os jogos do Fluminense e do Flamengo pela Primeira Liga. Teve de tudo: grandes risos, acepipes, a bela Gabrielle nos atendendo, tudo de bom. E muita conversa sobre política, arte e futebol.

Em dado momento, falamos das listas que os grandes jogadores costumam fazer com seus craques preferidos. Claro, discordamos muito. Num dado momento, vociferei pela defesa de Pelé, considerando inaceitável qualquer rol de craques da bola que não inclua seu nome no topo.

Em algum momento, lembramos da devastadora Holanda de 1974. O Carrossel Holandês. A Laranja Mecânica. Um monte de craques loucos (dentro e fora de campo) que atacavam, defendiam e trocavam de posição, a ponto de consagrarem a tática do impedimento – só eles fizeram isso com perfeição absoluta, o que requer talento, destreza e principalmente inteligência. Naqueles tempos, as camisas indicavam quem jogava onde: o 2 era lateral direito, o 11 era ponta esquerda, o 9 era centroavante. Na Holanda, não.

E no meio daquelas feras, o grande lider era Johan Cruyff. Uma das feras da minha infância.

Eu e Fagner vibrando com jogadores fantásticos que, um dia, deram um nó na nossa seleção tricampeã mundial. Os opacos diriam que a Holanda não ganhou nada. E precisava?

Poucas horas depois de uma grande mesa de bar da nossa turma, acabei de saber que Cruyff faleceu. É o caminho inevitável para a morte, percorrido diariamente nessa estranha Terra em que vivemos.

A Holanda dos anos 1970 era reflexo direto do time do Ajax, da genialidade de Rinus Michels, de gigantes como o goleiro Jongbloed (que jogava sem luvas), o zagueiro Rudi Krol, o fantástico Neeskens. Tome Rensenbrink, os irmãos Van Der Kherkof, Suurbier, Rep e mais uma tonelada de gente que abriu caminho para as novas gerações – Gullit, Van Basten, Rijkaard, Bergkamp e tantos outros.

Os garotos de hoje precisam ver a Holanda de Cruyff no YouTube. É o único jeito de entender como nasceu o Barcelona de hoje – onde o craque jogou e posteriormente foi treinador -, e o que foi um pouco do Brasil de 1958, 1962 e 1970. Ou ainda a espetacular Hungria de 1954 – também não campeã, também maravilhosa. Todos estes caminhos deságuam naqueles loucos geniais de um timaço que disputou duas finais de Copa do Mundo, não foi campeão e nem precisou para ser eternamente vencedor.

Cruyff em português significa craque, monstro, fabuloso, genial.

Vale o escrito.

@pauloandel

Pompéia, o “Constellation” do America (da Redação)

pompeia américa

Pompéia foi um dos grandes goleiros do futebol brasileiro. Tinha o apelido de “Constellation”, um grande e elegante avião dos tempos em que encantou a milhares de torcedores num Maracanã que já não existe.

Marcou presença no time do America entre os anos de 1954 e 1965, levando a equipe rubra ao seu último título carioca conquistado no ano de 1960.

Repetindo a história de muitos dos ídolos do nosso futebol, ao término da carreira mergulhou numa vida de drama e miséria, morrendo em 1996.

america 1960

A seguir, texto de autoria de Antonio Edmilson Rodrigues, torcedor do America, livre docente em História, professor da UERJ e da PUC-RJ, pesquisador de História do Rio de Janeiro, escritor de temas vinculados à história urbana, coordenador do projeto Conversa de Botequim e autor de “João do Rio, a cidade e o poeta”, originalmente publicado na revista Carta Capital em 2013. 

“Sou torcedor do America F.C. do Rio de Janeiro desde pequeno e isso quer dizer muita coisa para quem começa 2013 com 64 anos. Posso dizer que sou americano de coração, embora isso pareça anacronismo para as gerações de hoje, que olham para os times do Rio e só veem Flamengo, Fluminense, Botafogo e Vasco. Mesmos alguns antigos torcedores do mequinha deixaram de lado as tradições do pavilhão rubro, abdicaram de sua história e bandearam-se para um dos grandes do Rio.

Minha atenção para o America veio de meu pai. Nos domingos, lá em Vila Isabel, meu pai e meu tio disputavam, quase a tapa, eu e meu irmão. Eu recebi, de meu pai, o uniforme do América, comprado na Superball e meu irmão, de meu tio, o do Vasco. No quintal brincávamos de América e Vasco, o clássico da paz, assim denominado por ter selado a pacificação no futebol carioca em 1937.

Mais tarde, já com oito anos, levado por meu pai, via os jogos do America no estádio da Rua Campos Sales. Sentia-me importante sentado na arquibancada junto com aquele mar de camisas vermelhas. Olhava com aflição e atenção os jogos. Notava a elegância de Amaro, a velocidade de Nilo, a classe de João Carlos. E o que falar da emoção dos gols de cabeça de Quarentinha, da calma de Djalma Dias ao desfazer, dentro da área, as jogadas dos adversários?

Mas quem mais me impressionava era o goleiro. Diferente do restante do time, que usava a camisa vermelha e o calção branco, Pompéia se vestia de negro ou de cinza e trazia no peito o escudo do mequinha. Era esguio, alto, de uma flexibilidade ímpar. Sua elasticidade chamava a atenção. Eu não tirava os olhos dele, entusiasmado com os seus voos, as suas defesas mirabolantes que levaram o narrador esportivo Waldir Amaral a apelidá-lo de Constellation. Outros apelidos se seguiram: Ponte Aérea, Caravelle, Fortaleza Voadora. Todos cabiam como uma luva naquele homem simples, nascido em Itajubá, Minas Gerais.

Esse extraordinário goleiro iniciou carreira no circo, onde desenvolveu sua capacidade de impulsão, experiência que deu a ele a condição de ser um goleiro acrobático. Suas defesas mexiam com a plateia e mereceram de Nelson Rodrigues uma crônica em um America e Bangu:

“Foi, então, que surgiu Pompéia, como uma bastilha inexpugnável. Pompéia! Eis o que o América tem e os outros clubes, não: − um Pompéia. Que bela e emocionante figura! É o goleiro mais plástico, mais elástico, mais acrobático do mundo. Nada tem de simples: − ele complica tudo. Em primeiro lugar, não sabe defender sem um salto ou, mais do que isso, sem um vôo. Pompéia voa, amigos. Pompéia voa! E enfeita, dramatiza, dinamiza tanto suas intervenções que o público tem a sensação de que todas as suas defesas foram geniais. (…) Ele é o espetáculo.”

O apelido Pompéia vem da sua infância. Desatento aos estudos, gostava mesmo era de desenhar e o fazia bem, colocando no papel os personagens Popeye e Olívia Palito. Os colegas que viam os desenhos passaram a chamá-lo de Pompéia, pela dificuldade de pronunciar o nome do marinheiro. Pompéia nasceu José Valentim da Silva, em 27 de setembro de 1934, dia de São Cosme e Damião.

Iniciou sua carreira esportiva como centroavante no clube Itajubá, time composto de funcionários de uma fábrica de material bélico que participava do campeonato da Segunda Divisão mineira. Mais tarde, se transferiu para outro clube da cidade, o São Paulo, ainda como centroavante. Em um jogo em Três Pontas, o goleiro do São Paulo adoeceu e Pompéia foi escalado no gol. Saiu-se tão bem que chamou a atenção de todos, foi a grande sensação do jogo. Mais tarde, numa partida contra o Bonsucesso do Rio, o goleiro titular do São Paulo entusiasmou a todos, inclusive ao juiz da partida, também olheiro dos times do Rio, que convidou-o para treinar no Bonsucesso e jogar na Cidade Maravilhosa.

Atraído pelo convite, o goleiro não pestanejou e decidiu ir para o Rio. Apresentou-se em Teixeira de Castro e assinou seu primeiro contrato profissional em abril de 1953. No ano seguinte, transferiu-se para o América, onde permaneceu por 11 anos. Seu aprendizado da profissão foi feito com a ajuda do seu primeiro técnico. Alfinete, técnico do Bonsucesso, levava-o para assistir aos jogos do Vasco e do Fluminense, para ver Barbosa e Castilho atuarem. Mas não copiou o estilo de nenhum deles. Construiu um perfil próprio, no qual a estética das defesas se sobrepunha às dificuldades dos chutes. Em qualquer bola desenhava uma cena entre o belo e o rocambolesco, lançando-se sobre a bola de maneira espetacular. Para uns, era presepeiro, para outros, excelente goleiro.

Quando estava no seu dia, tomava conta do espetáculo e não tinha para ninguém, fazia das tardes de domingo o seu momento de fama e os comentários das resenhas do dia seguinte eram elogiosos. Com a estética do goleiro criada por ele, deixou como herança uma jogada, a ponte aérea. O nome vinha da novidade da época que era a ponte aérea entre Rio e São Paulo. Inventada por ele, hoje se tornou em jogada comum dos goleiros. Essa é apenas uma das contribuições de Pompéia. Porém, mais importante do que isso é a construção de uma nova forma de agarrar no futebol, trazendo para as partidas momentos de comédia de arte ou de tragédia cômica, subvertendo a forma tradicional de comportamento dos goleiros e alegrando a plateia, que ria e sofria com seus voos.

Essa marca particular de Pompéia levou-o à consagração como goleiro titular do America Futebol Clube (campeão carioca de 1960), atuando também como titular, em 1957, pela seleção carioca.

Pompéia chegou à seleção brasileira, quando a CBD montou um combinado para defender o Brasil em jogos contra seleções sul-americanas.

Diversas vezes ficava patente o racismo, quando associava-se sua elasticidade a dos macacos.

Em seu primeiro jogo pelo America já despertou entusiasmo. O América jogava um torneio quadrangular em Lima, no Peru, do qual também participa o Santos de São Paulo e, no jogo final entre os dois clubes, Pompéia defendeu um pênalti batido por ninguém menos que Pepe, que assustava com a potência de seu chute todos os goleiros. Com essa apresentação de gala passou a dividir o gol do mequinha com Ari em diversas jornadas, mas sendo o titular em 16 das 22 partidas disputadas pelo America no campeonato de 1960.

Seu nome era dito, cantado, anunciado nas bancas da cidade nas segundas e sua estética de goleiro ganhou fama. Vários Pompéias surgiram no Brasil e seus voos levaram-no longe. Jogou no Porto de Portugal e em vários clubes da Venezuela.E foi na Venezuela que terminou sua carreira de goleiro esteta.

Em 1969, num jogo entre o seu clube, o Desportivo Português, e o Real Madrid, depois de agarrar um chute difícil, que no rebote a bola foi novamente chutada contra a sua cabeça, perdeu uma de suas vistas, deixando a outra também prejudicada. O chute foi dado por ninguém menos que Di Stefano. Com isso, teve que abandonar o futebol.

Com a impossibilidade de continuar a atuar, Pompéia perdeu a alegria. Seu colega Amaro ainda tentou levá-lo para o Bonsucesso como preparador de goleiros, mas nada mais deu certo na vida do grande Constellation. Na rua da amargura, sozinho e perdido, voltou-se para a bebida e morreu em maio de 1996, em um quarto de um manicômio, olhando para uma bola.

Amargou na vida e na morte a sina dos goleiros, ditada na célebre máxima de autoria desconhecida: “o goleiro é tão maldito que onde ele joga não nasce nem grama”.

Para saber mais sobre Pompéia, visite o blog TARDES DE PACAEMBU

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O time de Neném Prancha (por João Saldanha)

JOÃO SALDANHA NO MARACANA

Já faz muito tempo, acho que durante a guerra, os jogadores do Posto 4 FC, campeoníssimo da praia, dirigido pelo “Trenier” mais famoso da Costa do Atlântico, Neném Pé de Prancha, tinham resolvido dar uma festa de fim de ano, na garagem da casa de um tio do Renato Estelita. O Lá Vai Bola FC aderiu ao baile e compraram três barris de chope.

Eu não topei e disse na esquina do Café do Baltazar: “Não vou. Na festa do ano passado, na garagem do Pé de Chumbo, quebraram tudo e até hoje o clube não pagou a cristaleira da avó dele que estava guardada lá. Não vou mesmo. Chega de encrenca.”

Meu irmão Aristides, o Hélio Caveira-de-Burro e o Orlando Cuíca me acompanharam na idéia de não ir ao baile e fomos tomar um chope, sossegados, num bar vazio, na esquina da Avenida Atlântica com Rua Cons­tante Ramos. A noite estava boa e o papo também. Mais tarde, passou por ali o Jaime Botina e disse: “Caí fora do baile. Tem gente demais e muito nego bêbado. Vai dar galho.” E eu emendei: “Não disse?”

Lá pelas duas horas da manhã, parou um táxi daqueles grandes e sal­tou o doutor A. Coruja, esfregando os óculos, nervoso. O doutor Coruja era um impetuoso lateral direito. Só dava bico na bola de borracha e Ne­ném Prancha decretou: “Só joga se cortar as unhas. Uma bola está custando cinco pratas.” Seu controle de bola não era dos melhores, mas quebrava o galho na lateral direita. O galho ou o ponta-esquerda adversário.

Mas chegou e foi falando incisivo: “Se vocês são machos e meus ami­gos, têm de ir lá comigo. Fui desacatado mas eram muitos.” E foi logo dando ordens: “Entrem aqui no táxi e vamos lá.”

Lá aonde?” disse o Hélio. Coruja explicou: “E na Rua Joaquim Silva. A mulher me desacatou, ofendeu minha mãe e não pude reagir porque ela estava com três caras na mesa. Vocês têm de ir comigo ou não são meus amigos.” Repetiu isto umas cinco vezes e completou: “Como é, poetas? Vamos ou não vamos? Vocês agora deram para medrar?”

Eu cochichei para o Cuíca: “O Coruja está de porre. Não vou me meter nisto.” O Cuíca respondeu: “Ele vai chatear a gente o ano inteiro por causa disso. O Coruja quando bebe é assim. Fica remoendo os troços. Olha, ele veio de lá até aqui e gastou meia hora. Para voltar, outra meia hora. Os caras já não estão mais lá, a pensão já deve estar fechada e a mulher dormindo com alguém.” E virando-se para o doutor Coruja: “Tá bem, nós vamos, mas vem tomar um chopinho com a gente.” Coruja topou e mandou o português do táxi esperar.

Tomamos o chope bem devagarinho e fomos, ainda devagar, para a Rua Joaquim Silva. O táxi “disse” que não esperava mais e foi embora. Subimos a escada de madeira, comprida e estreitinha, e demos numa sala de uns três metros por quatro, se tanto. Quatro mesinhas, só duas ocupadas por fregueses, e, nas outras, umas três mulheres com cara de sono. O diabo é que numa das mesas estava a tal mulher papeando com os três caras. Doutor Coruja partiu direto e foi dizendo: “Repete agora, sua vaca.”

Os homens levantaram, o que estava mais perto levou um soco do doutor e o pau comeu solto. O lugar era apertado e eu me lembrei da cristaleira da avó do Renato. Um dos caras era uma parada, brigava bem. O garçom não parecia homem mas era e as mulheres fizeram uma gritaria dos diabos. As mesas e as cadeiras foram para o vinagre, um dos caras se man­dou escada abaixo, quando alguém apagou a luz. Escutei a voz de Hélio Caveira-de-Burro, que era muito experiente: “Vamos dar o fora.”

Saímos rápido e ainda levei com uns detritos atirados pelas mulheres da janela. Um guarda apitou e saímos pelas ruas da Lapa. Uns se mandaram pela Conde Laje e outros pela Glória. Eu fui parar no Passeio Público, arrumei um táxi e voltei para o ponto de saída. Quando cheguei, Orlando Cuíca já estava e disse: “O guarda começou a dar tiro e quase me pega. Tive sorte.”

Depois chegaram Hélio e meu irmão, que vieram noutro táxi. Hélio falou: “O grande era uma parada. Mas peguei ele bem com a perna da cadeira. Senão a gente não ganhava.” Meu irmão estava com a camisa ras­gada e disse que foi a mulher que se atracou nele. “Não bati mas tive de dar uma ‘banda’ nela. Juntou pé com cabeça. Depois que Hélio dominou o grandalhão, foi barbada. Dei uma no de terno marrom que ele se mandou pela escada.” E eu disse: “Ficou tudo quebrado e a mulher que o Coruja bateu não levantou, mas eu não vi sangue.”

E ficamos relaxando um pouco quando chegou um táxi e o doutor Coruja saltou esfregando os óculos com um lanho no rosto. Hélio pergun­tou: “Como é doutor, se machucou?” “Nada, um arranhãozinho à toa.” E prosseguiu: “Puxa, agora estou satisfeito. Há mais de três meses que eu estava para ir a esta forra.”

“O quê?” — berramos em coro — “O negócio foi há três meses!?” E Coruja explicou, calmamente: “Foi sim e eu não bati nela porque estava acompanhada.” Então meu irmão perguntou: “Quer dizer que os caras que apanharam não eram os mesmos?” Coruja respondeu: “Claro que não, meus poetas, mas o que tem isto demais?”

Nesta altura, o sol já estava aparecendo lá na Ponta do Boi, iluminan­do o primeiro dia do ano e desejando boas entradas para a excelentíssima senhora mãe do doutor A. Coruja.

JOÃO SALDANHA era gaúcho e nasceu em 1917 na cidade de Alegrete. Jornalista combativo, treinador, apaixonado pelo futebol, conseguiu unir o Brasil — então politicamente dividido — em 1969, por ocasião das eliminatórias para aquela que seria a Copa do tricampeonato no México. De temperamento difícil, extremamente corajoso, fez muitos inimigos na vida. Mas todos admiravam aquele homem (ainda que muitas vezes não o perdoando pelas aventuras que dizia — e acreditava — ter vivido) que assistiu a todas as Copas do Mundo de futebol; que, como jornalista, cobriu a guerra da Coréia; que desembarcou na Normandia com Montgomery e que fez a grande marcha com Mao Tse-Tung. Faleceu no dia 12 de julho de 1990, durante a Copa do Mundo. O texto acima consta do livro “Nelson Rodrigues e João Saldanha – a crônica e o futebol”, compilado por Ivan Candido Proença, – Rio de Janeiro – Educom – 1976, págln96-98, e extraído do livro “As cem melhores crônicas brasileiras”, Editora Objetiva – Rio de Janeiro – 2007 – pág. 206, organização e introdução de Joaquim Ferreira dos Santos.

SOBRE NENÉM PRANCHA

Antonio Franco de Oliveira (Resende-RJ, 16 de junho de 1906 — Rio de Janeiro-RJ, 17 de janeiro de 1976), mais conhecido como Neném Prancha, foi um roupeiro, massagista, olheiro e técnico de futebol brasileiro. Ganhou a alcunha de “O Filósofo do Futebol” de Armando Nogueira, por suas frases engraçadas.

Neném iniciou sua carreira no futebol como jogador, no pequeno time Carioca. Não obtendo sucesso, abriu uma escolinha de futebol para crianças nas areias de Copacabana. Ao mesmo tempo, trabalhava como roupeiro, massagista e olheiro do time do coração, o Botafogo. Entre os jogadores que descobriu, estão Heleno de Freitas, e o ex-jogador e hoje comentarista Junior.

Por ser especialista no trato com os jogadores, principalmente os mais jovens, foi técnico das divisões de base do Botafogo.

neném prancha

2014 – O espírito da Copa (por Zeh Augusto Catalano)

Um dos principais objetivos deste PANORAMA DO FUTEBOL é ser uma memória não seletiva do mundo do futebol. Em nossas pesquisas para os livros que estamos escrevendo – projetos a serem lançados em 2016 – ficou claro para nós que alguns eventos fundamentais do nosso futebol, dos anos 1970, 80 e 90, foram simplesmente esquecidos das matérias televisivas ou dos sites na internet. Com isso, é quase certo que pessoas na casa dos seus 20, 25 anos, simplesmente desconheçam por completo tais fatos. Isso ajuda, e muito, na criação de mitos e na assimilação de inverdades.

Tempos atrás, numa discussão sobre o meu Vasco da Gama, lembrei um “ilustre” vascaíno do seu esquecimento do título brasileiro da segunda divisão de 2009, quando este listava os feitos do Vasco de 2000 pra cá. A resposta foi surpreendente: Isso é pra ser esquecido – Como a visita e vitória na 2a divisão fossem algo vergonhoso, a ser omitido da história do clube.

Esse raciocínio se estende às derrotas e fracassos, principalmente na literatura. Os livros se concentram nos grandes craques, grandes títulos, grandes vitórias. Com isso, personagens fantásticos são esquecidos. Grandes histórias são perdidas no tempo, exatamente porque elas não têm como pano de fundo uma grande vitória, um título. E se as editoras operam com a teoria de que “Livro sobre futebol não vende”, que dirá um livro que traga em sua alma uma derrota épica.

Imaginem a quantidade de livros ufanistas teríamos se Neymar Jr e companhia tivessem ganho a Copa? Talvez até alguns mais corajosos se aventurassem a lançar algum se o Brasil tivesse sido derrotado nos pênaltis ou se, por exemplo, a bola do último minuto de Pinilla, do Chile, ao invés de beijar a trave, fosse pra estopa.

Mas não foi isso que aconteceu. Ocorreu a hecatombe que todos viram, o apocalipse do Mineirão, os minutos mais vergonhosos da história do futebol brasileiro. Ali, naqueles minutos, certamente vários projetos foram postos de lado, apagados, esquecidos, pois ninguém daria mais um centavo por aquilo. Neymar não iria mais erguer a taça e os brasileiros só queriam apagar da memória aquela vergonha.

Quantos livros você viu lançados sobre a Copa de 2014? Pois é…

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Só que a gente não pensa assim. “2014, o Espírito da Copa” foi escrito por Paulo Roberto Andel, João Garcez, por mim e por mais dezessete pessoas que, no calor dos acontecimentos, relataram aquilo que viveram na mais espetacular das Copas. Os textos, de até três páginas, são publicados na ordem cronológica dos fatos, e acompanham desde as manifestações anteriores à Copa até a coroação da grande campeã. Todos, sem exceção, foram escritos durante o evento, e são datados. São textos com resenhas de jogos, comportamento das torcidas e dos “gringos” dentro e fora dos estádios, crônicas sobre personagens, por autores no Rio, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Salvador. Várias visões e textos completamente distintos daqueles dias sensacionais.

Muitas páginas são dedicadas aos famosos 7 x 1. Principalmente a capa do livro. A foto que a ilustra foi feita minutos depois da “tragédia”, pelo Paulo Andel. Ao sair de casa, no Centro do Rio, eternizou a cena. Dois meninos, vestindo a camisa dez amarelinha, jogavam uma animada pelada, acompanhados pelo olhar vago do cidadão das ruas que, sentado ao fundo, assistia a tudo inerte. Apesar da maior derrota da história do futebol brasileiro, a vida continuava. O amor à bola seguia incólume.

Na contracapa, o projeto original previa o número 14 da camisa da seleção, representando o ano do certame. Depois daquele dia, decidimos trocar pelo 7, o número que vai assombrar o futebol brasileiro por longa data.

Nosso objetivo foi imprimir um retrato vivo do que foi a Copa. Acredito que tenhamos conseguido.

Caso tenha interesse em adquirir um exemplar, ele custa R$ 40,00 e pode ser comprado diretamente com um dos autores. Por favor, contacte Paulo-Roberto Andel – pauloandel@gmail.com

 

A decadência dos campeonatos estaduais no plano esportivo (por Diogo Barreto)

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Que os campeonatos estaduais estão rumo à extinção, já sabemos.

Mas nem sempre foi assim.

Até os anos 1980, os estaduais eram competições valorizadas pelos grandes clubes e seus torcedores. Não eram tratadas com o menosprezo que só aumenta ano após ano.

Os motivos para esta perda de espaço e interesse dos estaduais são muitos, abordados diariamente em inúmeros espaços da imprensa esportiva brasileira. Contudo, há um enfoque pouco abordado, que é o valor desportivo; ou seja, com o passar dos anos, os estaduais foram perdendo o seu valor frente às outras competições que surgiram ao longo dos últimos 25 ou 30 anos. Os defensores das competições locais podem dizer que, nesse período, dentre as disputas que surgiram, quase nenhuma resistiu, enquanto os estaduais continuam aí.

Para que se tenha ideia do que estou falando, vou exemplificar. Em 1987, o Campeonato Carioca foi disputado por 14 clubes entre os meses de fevereiro e julho. Vasco, Flamengo e Bangu, que chegaram à fase final da competição fizeram 31 jogos ao todo. Enquanto isso, o Campeonato Brasileiro (Copa União) foi disputado por 16 clubes no período de setembro a dezembro, e o Flamengo, por ter chegado à final, fez 19 jogos. Quer dizer, naquele ano, o time rubro-negro fez 50 jogos nas duas competições oficiais disputadas.

Em 2015, dentro de um cenário hipotético, já que nenhum clube do Rio de Janeiro esteve na Copa Libertadores do mesmo anos, um clube carioca poderia disputar até 83 jogos, um aumento de 66% em relação a 1987 – e, nesse contexto, o estadual seria a competição menos importante, uma vez que esta agremiação disputaria também a Copa do Brasil, o Campeonato Brasileiro, a Copa Libertadores e o Mundial de Clubes da FIFA.

Nesse contexto, com o calendário dos clubes mais apertado, o Estadual acaba ficando em segundo plano e, por ser a competição menos importante da temporada, os grandes clubes deixam de escalar seus jogadores  para que eles possam render o máximo nos jogos das outras frentes paralelas.

E onde está o valor desportivo nisso tudo?

Atualmente, os estaduais não possuem nenhum valor desportivo para os grandes clubes, pois não dependem do seu resultado para se classificar para outra competição, o que não acontece nas outras competições, que são classificatórias para outras, até chegar ao topo, que é o Mundial de Clubes da FIFA.

Para que os estaduais recuperem uma parte de seu valor, seja para clubes, torcedores e mídia esportiva, eles deveriam ser classificatórios para a Copa do Brasil. Mas, para isso, esta competição precisaria sofrer um enxugamento e ter, no máximo, 46 clubes, todos classificados com base no resultado do campeonato estadual do ano anterior. Cada estado teria um ou dois representantes e a CBF arbitraria o critério para apontar os estados que classificariam uma ou duas equipes para a Copa do Brasil.

É evidente que apenas uma medida isolada não resolve o problema dos estaduais, mas pode ajudar a reerguer essas competições que muito ajudaram na formação do outrora melhor futebol do mundo.

Imagem: Sandro Vox/America

O clássico carioca no Pacaembu (por Paulo-Roberto Andel)

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O Fla-Flu de ontem no Pacaembu não foi nenhum jogão e, de certa forma, revela certo clima insosso na temporada 2016 do nosso futebol. Chegamos ao fim de março e conta-se nos dedos o rol de partidas empolgantes que foram vistas pelos gramados Brasil afora.

No entanto, alguns fatores positivos chamaram atenção.

Primeiro, o interesse do público. Talvez, apenas talvez, se esta partida tivesse sido disputada no Maracanã, talvez não conseguisse atrair 30 mil torcedores ao estádio – uma lástima quando falamos de um clássico, mas a triste realidade local: TV, desinteresse por parte do público, preços caros et cetera. Há quem aponte a televisão como a principal causa do afastamento dos torcedores do estádio e é justo refletir sobre isso, mas não creio que se trate do único motivo. Antes, 100 mil presentes era uma estatística até simplória; hoje, no máximo 95 mil e em Camp Nou. As modernas arenas brasileiras foram encolhidas em seus tamanhos originais, tendo o grosso de seu público – as classes populares – “devidamente” apartado para biroscas e afins. Mas o que não tem remédio, remediado está.

Segundo, o charme inquestionável do Pacaembu. Pensando nas arenas gourmetizadas, assépticas, frias até, o velho estádio tem realmente cara de estádio. Reparem que nem de longe sou contra modernidades; o que quero dizer é que, se precisavam trazer os campos de futebol para o futuro, não precisavam alijar o passado nem os principais focos de atração para uma partida. O Pacaembu tem história, tradição, imponência e ao lado de outras casas como São Januário e o Mundão do Arruda, ainda mantém certa aragem do que foram as nossas melhores épocas no futebol brasileiro.

Jogar em São Paulo passou a ser uma boa oportunidade para Flamengo e Fluminense. Mas não custa lembrar que isso só veio a acontecer porque ambos não se prepararam devidamente para o fechamento dos estádios no Rio de Janeiro, primeiro por ocasião da Copa de 2014 e, agora, com os Jogos Olímpicos. O que pode ser vendido como estratégia foi, na verdade, improvisação. Boa, mas improvisação.

Reitero: o Pacaembu é lindo demais, mas um Fla-Flu merecia público de Morumbi lotado. De toda forma, isso já é outra história.

@pauloandel

Imagem: Ricardo Nogueira/Folhapress

Imagens de Thomaz Farkas (da Redação)

Thomas Jorge Farkas, nascido Farkas Tamás György (Budapeste, 17 de outubro de 1924  — São Paulo, 25 de março de 2011), foi um dos pioneiros da moderna fotografia do Brasil.

Húngaro de nascimento, Farkas veio para o Brasil quando criança, em 1930. Seu pai, Desidério Farkas (Farkas Dezső), foi sócio-fundador da Fotoptica, empresa que também viria a dirigir. Iniciou sua carreira de fotógrafo na década de 1940 e foi um dos mais expressivos membros do Foto Cine Clube Bandeirante. Em sua obra destaca-se o registro da construção e inauguração de Brasília. Criou em 1979 a Galeria Fotoptica em São Paulo, destinada exclusivamente à exposição de fotografias.

Engenheiro de formação, foi professor de Fotografia, Fotojornalismo e Jornalismo Cinematográfico da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Foi também produtor de documentários, dentre os quais “Brasil Verdade”, “Jânio a 24 Quadros” e “Coronel Delmiro Gouveia”.

Morreu em São Paulo, aos 86 anos de idade.

Do lado de fora do Estádio do Pacaembu. São Paulo, SP. 1941. Foto: Thomaz Farkas/Acervo IMS Do lado de fora do Estádio do Pacaembu. São Paulo, SP. 1941. Foto: Thomaz Farkas/Acervo IMS[/caption]

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O que acontece por ora em nosso futebol (por Paulo-Roberto Andel)

 

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Os movimentos que cercam a questão da televisão no futebol brasileiro causam preocupação nos atores econômicos envolvidos.

Outrora deitada em berço esplêndido da estabilidade contratual, a Rede Globo em poucos meses se viu num ambiente de concorrência, contestação e repulsa como jamais se viu antes. Tendo o grupo Warner nas costas por meio do Esporte Interativo, a chamada Vênus Platinada já perdeu times expressivos como Santos, Coritiba, Atlético-PR e Bahia para o Brasileiro de 2019.

Cansados dos desmandos que envolvem horários esdrúxulos, da gourmetização do futebol, das coberturas tendenciosas e desproporcionais, afora outros problemas, torcedores organizados têm manifestado suas críticas à detentora dos direitos de transmissão, a ponto de um árbitro precisar paralisar uma partida para que faixas críticas fossem retiradas das arquibancadas.

Outro ponto de desconfiança está nos imbróglios envolvendo a cúpula de CBF, o grupo Traffic e as ligações na FIFA, já com a suspensão de figuras importantes e o julgamento de alguns chairmen do mundo da bola, casos do ex-presidente da Confederação José Maria Marín e do empresário Jota Ávila. Del Nero segue autoexilado no Brasil, temendo a Interpol caso pise em terras estrangeiras.

Diante de tantos elementos negativos, às vezes enrustidos por alguns poucos jogos de grande apelo e grande celebração midiática, vendendo um produto de aparência duvidosa e conteúdo contestável, é possível entender o esvaziamento atual do futebol brasileiro, enquanto o mercado econômico do esporte preferido dos brasileiros caminha para a inviabilidade econômica – mais de 80% dos jogadores no Brasil ganham até dois salários mínimos mensais, conforme estatísticas de 2015. Clubes pequenos esmagados e em processo de fechamento, os grandes administrando dívidas multimilionárias, empresários fazendo a festa financeira e os melhores jogadores bem distantes dos gramados brasileiros. Jogos sem público enquanto a TV não se preocupa: ela lucra com os torcedores em casa à frente do PPV ou nos bares em geral. Torcida para quê?

Em contrapartida, as federações são dirigidas por grupos feudais, sem remuneração mas administradores de ótimos lucros. Da Confederação, é desnecessário dizer. Os meios de comunicação de massa aplaudem o modelo atual, interessados que estão na manutenção do status quo.

Quando o futebol deixou de ser um grande lazer em firma de espetáculo para se tornar um mero negócio econômico, as suas raízes foram enfraquecidas. Trocou-se o público dos estádios pela massa dos espectadores em frente à uma novela monótona às quartas-feiras e domingos – terças, quintas, sextas e sábados também.

Qualquer análise que relacione o avançar deste sistema nos últimos anos com o fracasso contemporâneo do futebol brasileiro, seja nas competições continentais interclubes ou nas de seleções, não o faz por mera coincidência.

@pauloandel

Cinema: “Os boias-frias do futebol” (da Redação)

os boias frias do futebol foto 3

Atrasos de salários; jogadores que não recebem, outros que pagam para jogar; promessas não cumpridas; jornadas duplas ou triplas para complementar a renda familiar; falta de estrutura; contratos curtos de trabalho; ausência de calendário anual.

Essas são algumas das dificuldades e obstáculos da dura realidade do mercado de trabalho dos atletas da base da pirâmide do futebol brasileiro.

“Os boias-frias do futebol” revela os sonhos e as incertezas de dois jogadores da Série C do Campeonato estadual do Rio, a divisão mais operária do futebol fluminense.

Direção: Luciano Pérez Fernández

Produção: ArtLink Produções

Nossa proposta com o PANORAMA DO FUTEBOL (da Redação)

panorama do futebol logo

Caros amigos, o PANORAMA DO FUTEBOL pretende ser um espaço de resgate das discussões sobre o que cerca boa parte do futebol que não se vê na televisão.

Para isso, utilizaremos texto, imagem vídeo e som, na tentativa de agregar torcedores em geral que estejam dispostos a uma reflexão mais profunda sobre este esporte que encanta e inebria, mas também caminha com frustrações, falhas e anonimato.

Esteja em casa, feito um estádio de antigamente. Ou outro desses que a TV nem sempre se lembra de mostrar.

A equipe.