A voz do Gilsão (por Paulo-Roberto Andel)

Houve um tempo em que o futebol era a vivência no estádio e a voz do rádio. Sim: imagens eram raras na televisão, raramente as partidas eram transmitidas, as fotos só ficavam disponíveis nos jornais do dia seguinte e, num domingo, você só via os gols no Fantástico, lá pelas dez da noite, ou o VT da partida na TVE à meia noite. Assim sendo, gerações e gerações de futebol foram criadas pela narração, locução e reportagem esportiva.

Lá atrás, marcaram época no Rio de Janeiro nomes como Ary Barroso e Oduvaldo Cozzi. Depois, Orlando Baptista, Waldyr Amaral, Jorge Curi, Antônio Porto, Loureiro Neto, Danilo Bahia, Doalcey Bueno de Camargo, Ruy Porto, João Saldanha, Mário Vianna (com dois ênes), Alberto Rodrigues, Luiz Mendes e muitos outros. Neste domingo, sentou praça na eternidade Gilson Ricardo, que apesar de baixinho era chamado de Gilsão. Explica-se: a baixa estatura não era páreo para o enorme vozeirão que, por muitos anos, marcou as jornadas esportivas da Rádio Globo e, posteriormente, da Super Rádio Tupi.

Nas últimas décadas, Gilson Ricardo formou um trio de ferro ao lado de outros dois gigantes que dispensam apresentação: o Garotinho José Carlos Araújo e Gerson Canhotinha de Ouro. Tão poderosos que, com o tempo, ampliaram seus domínios, chegando também à televisão.

Gilsão criou dezenas de bordões, mas dois deles se tornaram inesquecíveis: “Que zoeeeeeiiiiraaaa!”, celebrando a comemoração da torcida na hora do gol, e “Para com isso”, geralmente criticando uma jogada errada – este ficou tão popular que os ouvintes ligavam para a Rádio Globo e pediam o bordão personalizado. Dos anos 1980 até ontem, foram muitos e muitos gols comentados por seu talento e voz inigualáveis. Passam por nomes como Assis, Zico, Roberto, Romário, Edmundo, Bebeto, Fred, Renato Gaúcho, Felipe, Roger Flores, Túlio Maravilha, Obina, Gabigol, Pedro, Seedorf, Washington e muitos outros. São muitos nomes.

A Gilson Ricardo, devo uma grande chance, cavada pela amiga Lau Milesi: em seu programa da Rádio Globo, tive minha primeira oportunidade de divulgação na grande mídia, falando de meu primeiro livro “Do inferno ao céu – a história de um time de guerreiros” em 2010. Anos mais tarde, com o apoio da querida jornalista e produtora Nathália Pereira, participei diversas vezes do programa esportivo de Garotinho no SBT, sempre com Gilsão e Gerson, inclusive lançando outros dois livros lá. Eu achava impressionante como aqueles caras, todos craques, se encontravam a um minuto do início da transmissão e, de repente, explodiam como se ali estivessem por horas. Coisa de feras entrosadas.

Agora, o que devo a Gilson Ricardo e também a Garotinho, Gerson, Edson Mauro, Ricardo Mazella e tantos outros gigantes do rádio esportivo é, sem dúvida, a melhor coleção que tenho: a de memórias de jogos imortais, de lances divertidos e inusitados, de paixão e drama, de romance, de futebol com Maracanã de geral e orelhão atrás do gol, de craques e figuraças. As memórias que comecei a juntar ainda garoto e continuo colecionando por aqui. É o rádio, a voz, a voz que dita cenas inesquecíveis que posso sequer ter visto, mas as sonhei.

Hoje não tem zoeira, mas sim uma saudade gigantesca.

@pauloandel

Waldir Amaral, um craque do rádio (da Redação)

Nascido em 17/10/1926, o locutor goiano Waldir Amaral foi um dos pioneiros na transformação das jornadas esportivas radiofônicas, fazendo da narração de futebol um verdadeiro espetáculo auditivo.
Waldir iniciou sua carreira na rádio Clube de Goiânia. No Rio de Janeiro, passou pelas rádios Tupi, Mauá, Continental, Mayrink Veiga, Nacional e Globo. Nesta última, por sinal, permaneceu de 1961 a 1983.

Ao lado de Mário Luiz, um dos diretores da Rádio Globo, Waldir foi o mentor intelectual da famosa vinheta “Brasil-sil-sil!”, gravada pelo radialista Edmo Zarife durante as Eliminatórias da Copa do Mundo para 1970, para levar a seleção à frente, e que está no ar até hoje.

Alguns de seus bordões fizeram história no rádio brasileiro:

“Tem peixe na rede do…” (Ele dizia se referindo ao time que levava gol do adversário)

“Choveu na horta do…” (Ele dizia se referindo ao time que fazia gol no adversário)

“É fumaça de gol” (Ele dizia quando surgia uma oportunidade de gol)

“Caldeirão do Diabo” (A grande área)

“Indivíduo competente” (O autor do gol)

“O visual é bom, Roberto tem bala na agulha” (Quando o jogador ia bater uma falta)

“Estão desfraldadas as bandeiras do Botafogo” (Logo após um gol)

“Deixa comigo” (Dizia logo após a vinheta do sue nome)

“O relógio marca” (Ele dizia quando dava o tempo de jogo)

Waldir faleceu em 1997, a dez dias de completar 71 anos de idade. Em sua homenagem póstuma, a rua Turf Club, situada no bairro do Maracanã em frente à lateral da UERJ, passou a se chamar Radialista Waldir Amaral. Nela, fica a sede a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FERJ)

Craques do rádio: Jorge Curi e Waldir Amaral na sala do Maracanã